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Artigo

O pós-jornalismo navega na rede, artigo de Giovanni Valentini

Por uma circunstância de todo privada, a saber, por ocasião de uma mudança que é sempre um evento traumático para qualquer um, eu experimentei em primeira pessoa a infeliz experiência do ‘discombugogglamento’, do estresse de quem se encontra sem Rede, não consegue se coligar com a Internet, de entrar num site e descarregar correio eletrônico ou dados da web. O termo, cunhado por um psicólogo inglês, é uma fusão de “scombussolamento” [transtorno, desarticulação (ndt)] e “Google”, o nome do motor de pesquisa por antonomásia [em português poderia talvez ser expresso por desconexão estressante do Google (ndt)]. E, como narrou, recentemente, Enrico Franceschini de Londres, uma recente sondagem revela que na Grã-Bretanha 44% dos cidadãos sofre desta doença da era digital, com mais de um quarto dos entrevistados que admitem estar decididamente mal quando encontram dificuldade em conectar-se ou executar as habituais operações na Internet: aumento da pressão arterial, taquicardia, redução da visão e até estado confusional.

Privado por alguns dias da “banda larga”, constrangido a utilizar um registro para uma precária conexão wireless [radiofônica] ou até mesmo reduzido a coligar-me através das espiras do fio telefônico, dei-me conta que atualmente sou vítima também eu de uma autêntica dependência. É uma frustrante sensação de impotência telemática a que se experimenta diante do computador, quando a tela permanece bloqueada e o correio não parte ou não chega. Dos recessos do cyber-espaço não há resposta, a mensagem em garrafa se perde entre as ondas da web, o internauta se precipita irremediavelmente numa condição psicológica de isolamento e de abandono, como um náufrago perdido no Oceano. Algo semelhante a uma crise de amnésia.

Por isso não é difícil acreditar que na Inglaterra, onde a grande maioria da população já está coligada em “broadband”, 76% dos cidadãos declara que não poderia viver sem Internet. A despeito de todas as promessas governamentais, na Itália, ao invés, os usuários da “banda larga” superaram há pouco os dez milhões, com uma quota de apenas 17,8%, enquanto na Europa a média é de 23,3% e nos países asiáticos (Japão, Coréia, Singapura e Taiwan) supera os 30%. E pensar que, como assinalou em seu relatório anual o presidente da Autorità sulle Comunicazioni, Corrado Calabrò, calcula-se que o desenvolvimento desta tecnologia no velho continente poderia funcionar como volante para a economia, estimulando um incremento do produto interno bruto superior a um por cento e, no nosso país, precisamente de 1,5 a 2%, uma enormidade, visto que as últimas estimativas da Ocse prevêem neste ano para nós um mirrado crescimento de 0,1%.

É através da “banda larga” que se desenvolvem a interatividade e a multimídia da comunicação digital: além dos textos escritos e do correio eletrônico, o povo da Rede também pode intercambiar desta forma imagens, fotografias, áudio e vídeo, como acontece na praça virtual de YouTube. E é precisamente nesta onda que se propaga aquele fenômeno do jornalismo difuso, participativo, de assembléia, que anda sob o nome de “citizen journalism” (jornalismo cidadão) ou de “user-generated journalism” (jornalismo gerado pelos usuários, a partir de baixo). Uma revolução no modo de fazer informação, sempre mais on demand (por demanda) e sempre mais móvel, mas ainda mais na relação entre quem a produz e quem a recebe, com a tendência a desmontar ou a redimensionar a mediação jornalística.

Aqui, nasce, por conseguinte, o pós-jornalismo. Ou seja, uma forma mais evoluída e completa de jornalismo, que vai além da escrita e da carta impressa, integrando os vários meios de comunicação tradicionais. Depois de já ter aprendido a trabalhar pela rádio ou pela televisão, o profissional da informação moderno deve aprender a desenvolver outras funções, como registrar uma entrevista ou filmar diretamente uma cena: montar um serviço de áudio-vídeo; gerir um sítio na Internet: construir um “pacote” de notícias, escritas, sonoras e visuais, na contaminação dos gêneros e dos instrumentos requerida pela hipertextualidade. É um código, uma nova linguagem aquela que se impõe: mais interativa, mais imediata e concreta, mais de serviço, sob certos aspectos também mais lúdica.

Mas, de qualquer modo é um pós-jornalista o mesmo cidadão que, por acaso ou por escolha, faz o repórter, fotografa um incidente com um telefoninho, registra um evento com uma videocâmara e depois publica o seu produto num fórum ou num blog, compartilhando com os outros usuários e participando assim de um intercâmbio coletivo de notícias. E não é dito que este jornalismo gerado a partir de baixo seja necessariamente menos útil ou menos importante. A diferença está antes no nível de profissionalismo: isto é, na qualidade da informação, em sua continuidade e regularidade: em sua tempestividade, completude e confiabilidade.

Eis porque o pós-jornalismo é um desafio para todos os jornalistas, da carta impressa, da rádio ou da televisão, jovens e menos jovens. Fora de uma anacrônica pretensão de exclusividade, eles têm hoje uma nova “chance” de crescimento e de enriquecimento profissional. Mas é um desafio também para os cidadãos: leitores, rádio-ouvintes, telespectadores, internautas. Mais informação quer dizer mais democracia. E melhor qualidade da informação é também melhor qualidade da democracia.

Giovanni Valentini é Jornalista. Artigo publicado no jornal La Repubblica e traduzido por Benno Dischinger.

EcoDebate, 02/12/2009

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