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Artigo

De frutas, hortaliças e grãos, artigo de Jocelem Mastrodi Salgado

alimentação saudável

De frutas, hortaliças e grãos – Em comemoração ao Dia Mundial da Alimentação – celebrado em 16 de outubro –, enfatizamos a importância do consumo de frutas, hortaliças e grãos de cereais e leguminosas para a saúde do homem, bem como as recomendações e pesquisas recentes sobre os componentes ativos existentes nesses alimentos, capazes de prevenir e controlar certos tipos de doenças. Apesar de vivermos em um país tropical, com grande diversidade de frutas, legumes e verduras, a realidade é outra: os brasileiros não consomem esses alimentos como deveriam.

Atualmente o Brasil ocupa o terceiro lugar entre os maiores produtores de frutas do mundo, estando atrás apenas da China e da Índia. Em 2008, a produção nacional ultrapassou os 43 milhões de toneladas, representando cerca de 5% da produção mundial. Por sua extensa área territorial, posição geográfica, solo e condições climáticas, o Brasil tem a capacidade de produzir frutas tropicais, subtropicais e temperadas. São cultivadas aproximadamente 500 variedades de plantas produtoras de frutas comestíveis e 220 espécies de frutíferas nativas somente na Amazônia. Nossas exportações ultrapassam as 809,5 mil toneladas, sendo que a uva ocupa o primeiro lugar, com 172 mil toneladas, seguida do melão, com 153 mil toneladas, mangas, com 119 mil toneladas, e a maçã, alcançando 80 mil toneladas.

Apesar desses altos valores, o Brasil apresenta um grande paradoxo envolvendo a produção e o consumo de frutas. Enquanto o crescimento da primeira tende a aumentar a cada ano, o consumo apresenta-se cada vez menor, sendo substituído por outros alimentos menos saudáveis, na maioria das vezes industrializados, pobres em fibras e ricos em gorduras, predominantemente saturadas. Toda essa mudança no padrão alimentar do brasileiro gerou um processo denominado de transição epidemiológica, ou seja, houve uma significativa redução nas doenças infecciosas e um grande aumento nas chamadas enfermidades crônico-degenerativas (doenças cardiovasculares, diabetes e câncer, entre outras).

Pesquisa encomendada pelo Ministério da Saúde – realizada pelo Sistema de Vigilância de Fatores de Risco e Proteção para Doenças Crônicas por Inquérito Telefônico (Vigitel), em parceria com o Núcleo de Pesquisas Epidemiológicas em Nutrição e Saúde da USP, nas capitais dos 26 Estados do País e no Distrito Federal, divulgada em abril de 2008 – mostra que apenas 17,7% da população brasileira atende às recomendações da Organização Mundial da Saúde (OMS), ou seja, a de comer cinco porções diárias desses alimentos.

Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), essas doenças são responsáveis por 70% a 80% da mortalidade nos países desenvolvidos, sendo que no Brasil as doenças cardiovasculares ocupam o primeiro lugar como causa mortis e outras enfermidades como o câncer e o diabetes encontram-se entre as dez primeiras causas de mortalidade, em geral.

Até há pouco tempo, quando um pesquisador, médico ou nutricionista indicava o consumo de um determinado grão, fruta ou vegetal, visava a suas qualidades nutricionais, importantes na prevenção de muitas doenças e carências. Assim, por exemplo, quando a deficiência era de vitamina A, frutas e vegetais amarelo-alaranjados eram indicados devido à alta concentração de b-caroteno, um precursor da vitamina A no organismo humano. Para deficiência de vitamina C, o uso de frutas cítricas. Para deficiência de ferro (anemia), o uso de vegetais verde-escuros, e assim por diante.

Entretanto, atualmente, não são somente as qualidades nutricionais dos grãos, frutas e vegetais que interessam aos pesquisadores. Tais alimentos apresentam muito mais do que nutrientes: eles contêm substâncias que ajudam na prevenção e controle de doenças. Essas substâncias, também denominadas componentes ativos, somadas aos compostos nutricionais dos grãos, frutas e vegetais, trazem inúmeros benefícios à saúde das pessoas. Os benefícios vão desde a prevenção de uma simples constipação intestinal (intestino preso) até, por exemplo, a prevenção de certos tipos de cânceres, doenças cardiovasculares, diabetes, diverticulite e catarata, entre outras doenças.

Diversas pesquisas comprovaram a existência de uma forte relação entre o consumo de grãos, frutas e vegetais com reduzido risco de câncer. No caso específico do câncer de próstata, recomenda-se o consumo de dez porções de molho de tomate durante a semana. Uma porção equivale a ½ xícara de chá do molho, que pode ser enriquecido com grão-de-bico, lentilha, ervilha etc. Como preventivo de câncer de mama, a utilização da soja em substituição do feijão (cerca de 100g do grão cozido) e o emprego de 350g de repolho ou outras crucíferas por dia é o recomendado.

Além da redução de riscos de cânceres, estudo recente, publicado em setembro de 2009, feito por pesquisadores da Universidade Heinrich-Heine, na Alemanha, traz mais evidências de que o consumo de frutas, verduras e legumes pode melhorar também a aprendizagem, a memória e o raciocínio de pessoas saudáveis.

Avaliando 193 pessoas com idades entre 45 e 102 anos, os investigadores observaram que aqueles com a maior ingestão diária de vegetais (cerca de 400 gramas) tinham maior nível de antioxidantes, menores indicadores de danos oxidativos e melhor desempenho cognitivo do que aqueles que consumiam menos de 100g de frutas e verduras por dia.

É verdade que muitos alimentos de origem vegetal contêm vestígios de resíduos químicos, tais como fertilizantes, pesticidas, herbicidas e outras drogas usadas na lavoura, e as pessoas têm todo direito de se preocupar com isso. Mas, ao mesmo tempo, elas devem se conscientizar de que os reguladores governamentais monitoram vigorosamente o fornecimento de alimentos para mantê-los fora dos danosos níveis de produtos químicos.

Analisando muitos relatórios por todo o mundo, observamos que muitos estudos com humanos contêm evidências insuficientes de quaisquer relações entre os resíduos utilizados na agricultura e o risco de câncer. A única informação sugerindo que esses resíduos aumentam o risco de câncer de qualquer forma deriva de experimentos em animais, usando doses em grande excesso, fora de qualquer normalidade empregada nos cultivos.

Muitas pessoas pensam erroneamente que a contaminação química é a causa significativa do câncer. Os pesquisadores acreditam que de 60% a 70% de todos os tipos de câncer estão associados com o controle dos fatores de vida: dieta, fumo, atividade física e peso saudável. Por outro lado, expor-se a todos os produtos químicos lançados no ar, água, solo e alimentos pode ser a causa de menos de 1% dos casos de câncer. Além disso, frutas, hortaliças e grãos integrais contêm substâncias protetoras que, como já vimos, ajudam a neutralizar os efeitos de possíveis produtos químicos cancerígenos.

De qualquer forma, os pesquisadores sempre sugerem tomar precauções adicionais de segurança, não somente com relação aos agrotóxicos, mas também com relação a outros tipos de contaminações que podem ocorrer, como, por exemplo, de ordem microbiológica. Entre as recomendações, destacamos:
· escolha os produtos livres de furos ou picadas por onde os resíduos possam ter entrado;
· lavar e esfregar com uma bucha macia as frutas e hortaliças, removendo as folhas soltas dos vegetais folhosos;
· deixar de molho em água com vinagre (uma colher de sopa de vinagre para cada litro de água) por meia hora;
· coma uma variedade de alimentos; quanto mais variável for sua alimentação, menos riscos você terá de expor-se aos pesticidas;
· procure por alimentos orgânicos, ou seja, aqueles cultivados com poucos ou sem produtos químicos.

Podemos afirmar, portanto, que entre os benefícios de se alimentar com uma dieta rica em verduras, grãos e frutas está a diminuição da incidência do risco de câncer e outras doenças, excedendo de longe o risco mínimo causado pela ingestão de agrotóxicos.

Pesquisadores apontam alguns fatores responsáveis por dificultar o crescimento da indústria do consumo de frutas e legumes em geral. Esses fatores são a falta de investimento a longo prazo e de mão-de-obra qualificada, dificuldades em garantir tanto a qualidade da produção como a venda de todos os produtos etc. Em contrapartida, estudos evidenciam também os motivos para acreditar no crescimento do consumo desses alimentos, visto que se observa uma grande preferência por novos sabores e misturas de sucos naturais, além da diversidade de consumo (na forma integral, de sucos, néctares, drinques, blends de soja e água de coco, sobremesas, como misturas em iogurtes, alimentos infantis etc.). O mercado de produção de sucos cresceu de 333 mil litros para 477 mil litros por ano. Isso é um forte indicador de que, se cresce o consumo de bebidas prontas, a venda de frutas também aumenta automaticamente.

Concluindo esta reflexão sobre a importância do consumo de legumes, frutas e hortaliças, destacamos que, em termos culturais, o baixo consumo desse grupo de alimentos tem origens socioantropológicas e, por isso, a ampla difusão de informações claras, concisas e orientadoras para apoio dos indivíduos na seleção de alimentos torna-se fundamental.

Jocelem Mastrodi Salgado é professora de Nutrição da Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz (Esalq) da USP, em Piracicaba, e autora dos livros Guia dos funcionais – Quando a alimentação é o melhor remédio e Previna doenças – Faça do alimento o seu medicamento, entre outros.

Para prevenir doenças

Grãos de cereais e leguminosas (arroz, cevada, centeio, trigo, milho, aveia etc), de preferência na forma integral.
Sete ou mais porções ao dia. Uma porção de cereal cozido equivale a ½ xícara de chá de arroz integral cozido, macarrão, aveia etc. Uma porção de leguminosas como soja e feijões, entre outras, equivale a ½ xícara de chá da leguminosa cozida.

Frutas e vegetais
Cinco ou mais porções ao dia. Uma porção é igual a ½ xícara de vegetais frescos ou cozidos ou 1 xícara de chá de vegetais folhosos crus ou ½ de uma fruta fresca ou ainda ½ xícara de chá de frutas cozidas. Coma também mais de uma porção de raízes e tubérculos, como batata, cenoura, batata-doce, inhame, cará e beterraba, o que equivale a uma unidade média.

Artigo no Jornal da Usp, publicado pelo EcoDebate, 06/11/2009

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