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Fiocruz vai coordenar Observatório Nacional de Mudanças Climáticas

Leito seco de rio em Rondônia: situação cada vez mais comum no país (Foto: Gente de Opiniao)
Leito seco de rio em Rondônia: situação cada vez mais comum no país (Foto: Gente de Opiniao)

Iniciativa do Ministério da Saúde criará órgão que reunirá dados sobre clima, saúde, meio ambiente, socioeconômicos e demográficos, gerados por diversas instituições para estabelecer uma rede cooperativa a fim de discutir propostas e desenvolver estratégias

Preocupado com as mudanças climáticas e suas repercussões sobre a saúde no Brasil, o Ministério da Saúde solicitou que a Escola Nacional de Saúde Pública Sergio Arouca (Ensp) e o Instituto de Comunicação e Informação Científica e Tecnológica em Saúde (Icict), unidades da Fiocruz, criassem o Observatório Nacional de Mudanças Climáticas com o objetivo de reunir dados sobre clima, saúde, meio ambiente, socioeconômicos e demográficos, gerados por diversas instituições para estabelecer uma rede cooperativa a fim de discutir propostas e desenvolver estratégias para a área.

O Observatório, lançado no final de 2008, é coordenado pelos pesquisadores Christovam Barcellos (Icict) e Sandra Hacon (Ensp) e conta com a parceria de instituições como Datasus, IBGE, Ibama, Ministério do Meio Ambiente, secretarias estaduais e municipais de Saúde e instituições de ensino federais e estaduais. É parte integrante da Rede Brasileira de Pesquisas sobre Mudanças Climáticas Globais (Rede-Clima), do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe). A Rede-Clima propõe políticas e estratégias para lidar com as mudanças climáticas.

Barcellos explica que todas as instituições ligadas ao Observatório são responsáveis por gerar dados; entretanto, eles não se relacionam entre si. “São dados dispersos e fragmentados. Neste primeiro momento do Observatório, estamos reunindo algumas informações disponíveis no Brasil e como elas podem ser usadas para monitorar as mudanças de clima e saúde”, disse.

Uma das marcas do grupo, informa o pesquisador, é que ele não estuda só a relação clima e saúde. “Não é um grau de temperatura que vai matar as pessoas. Esse grau de temperatura provoca, às vezes, mudanças de hábitos, mudanças do uso do solo, secas, altera sazonalidades. Em alguns casos de seca prolongada, as árvores ficam com menos umidade, e isso pode aumentar a inflamabilidade causando queimadas. Essas queimadas geram fumaças, e as fumaças podem causar problemas de saúde. Existem populações mais vulneráveis e outras menos vulneráveis a esses problemas”, explicou. A ideia é analisar como esses fatores contribuem para potencializar a relação clima e saúde e entender como ocorrem essas mudanças.

Sandra afirma que as questões sociais estarão na linha de frente do Observatório. Para ela, a falta de saneamento básico em diversas regiões do país é uma das principais causas de epidemias. “Temos verdadeiras epidemias de doenças relacionadas à questão hídrica. Isso não é culpa do ambiente, e sim da falta de saneamento básico. Não é porque está chovendo mais. Está chovendo mais sim, isso é fato concreto, mas as pessoas estão adoecendo por conta da falta de saneamento, e temos que deixar isso bem claro. Caso contrário, as mudanças climáticas podem servir como desculpa para a inação de governos e da sociedade”, afirmou.

Outra questão levantada pelos pesquisadores é por conta dos grandes empreendimentos e seus impactos sobre as doenças transmitidas por vetores. Eles citam como exemplo a malária na região amazônica. “Por que não temos malária urbana em Rio Branco, mas temos em Manaus e Porto Velho? É por causa do clima? Não, e isso precisa ficar claro. O poder público não pode se eximir da sua responsabilidade e culpar o clima por tudo”, destacou Sandra.

O trabalho desenvolvido pelo Observatório não ficará restrito aos níveis de gestão estadual, municipal e federal. Os pesquisadores levarão informações, estudos, dados para a sociedade civil por meio de uma linguagem mais acessível. “Temos que monitorar o clima sem causar pânico e sem criar mais confusão do que já existe”, afirmou Barcellos ao explicar a função do Observatório. Todo o material estará disponível em um portal de livre consulta. Além da literatura cientifica, notícias, dados técnicos e links para as instituições parceiras, o portal trará um glossário para a população leiga entender melhor o que é aquecimento, alergia, pólen, queimadas, entre outras informações.

Com relação à obtenção de dados para as análises e abastecimento do portal, esse é um dos pontos considerados problemáticos pelos pesquisadores. Isso porque o Brasil não conta com grandes séries históricas sobre clima e temperatura. Para análises mais precisas e entender melhor os fenômenos ocorridos, explica a pesquisadora do Icict Renata Gracie, é necessário pesquisar informações de dez, 20 ou 30 anos, no mínimo. “O clima sofre mudanças ínfimas num período pequeno. É num período maior que podemos verificar, de fato, algum tipo de mudança ou algum evento diferente. Por isso, é fundamental envolvermos tantas instituições no projeto, para trabalhar cada vez mais com dados que são difíceis de serem obtidos”, explicou.

“Por isso, devemos ter uma preocupação com o global e com o local. O aumento da temperatura e do volume de chuvas no Rio de Janeiro é consequência do que está acontecendo no mundo ou um problema local? Na verdade, são as duas coisas ao mesmo tempo”, argumenta Barcellos. O pesquisador informa que o aumento de dois graus na temperatura nos últimos 50 anos no Rio de Janeiro pode ser decorrente de um maior consumo de energia elétrica ou de queima de combustíveis fósseis, por exemplo, mas também reflexo do que acontece no resto do planeta.

“Não adianta pensar em mudança global só pensando em uma cidade. A cidade tem uma dinâmica própria. Também não adianta só falar do mundo, porque o momento do mundo se concretiza em cada lugar. É preciso generalizar para entender os processos globais, mas também compreender coisas que são muito particulares e estão acontecendo em diversos locais”, afirmou.

Por isso, o grupo pretende ampliar ainda mais suas parcerias e buscar, principalmente dentro da Fiocruz, profissionais que executam trabalhos ligados às quatro grandes frentes do Observatório: doenças transmitidas por vetores; desastres ou eventos extremos; doenças respiratórias; e doenças relacionadas à água. “O momento agora é de debater clima e saúde, e o Observatório é um catalisador. Queremos abrir espaço para o debate, ampliar cada vez mais nossas investigações e trazer várias opiniões e conhecimentos”, disse Barcellos.

“Queremos criar vetores multiplicadores desse conhecimento que está sendo construído, e isso é um processo permanente. Eu diria que a publicação Mudanças climáticas e ambientais e seus efeitos na saúde: cenários e incertezas para o Brasil, da Opas, é o cartão de visita do Observatório”, concluiu Sandra.

A publicação a qual a pesquisadora se refere é um documento publicado em 2008, disponível para download aqui, e que marca o início do desenvolvimento do Observatório Nacional de Mudanças Climáticas. É parte integrante da série Saúde Ambiental 1 da Opas e foi preparada por técnicos e especialistas, trazendo uma orientação frente ao grande desafio das mudanças climáticas para o setor saúde e para países que pretendam proteger a saúde dos seus efeitos negativos.

Informe Ensp, publicado pelo EcoDebate, 08/09/2009

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