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A recuperação da vegetação poderia salvar as florestas tropicais?

Imagem aérea mostra trecho de floresta Amazônica desmatada no Matro Grosso (maio de 2008)* Jorge Araujo/Folha Imagem
Imagem aérea mostra trecho de floresta Amazônica desmatada no Matro Grosso (maio de 2008)* Jorge Araujo/Folha Imagem

As florestas tropicais estão se recuperando? Novos estudos sugerem que as consequências de longo prazo do desmatamento podem não ser tão ruins quanto se previa, já que a vegetação retorna nas terras agrícolas abandonadas.

A casa de Felipe Garcia tem ao fundo uma verdadeira muralha de árvores da floresta. “Os meus vizinhos abandonaram a sua fazenda sete anos atrás”, afirma Garcia, que é agricultor. “Agora a selva tomou novamente conta da propriedade deles”. Ele dá tapinhas na barriga proeminente e diz: “E se eu não cuidar das minhas terras, estarei na mesma situação daqui a alguns anos”. Reportagem de Jens Glüsing, no Der Spiegel.

Garcia é membro da tribo Ngöbe, o maior grupo indígena do Panamá. Ele é um dos poucos moradores da pequena cidade de Chilibre que ainda ganham a vida com a agricultura. A maioria dos agricultores locais abandonou as suas terras há muito tempo. “O trabalho agrícola é muito duro para os jovens”, reclama Garcia. “Eles preferem trabalhar na capital”.

Os prédios de escritórios da Cidade do Panamá ficam a cerca de uma hora de carro. Chilibre tornou-se uma cidade dormitório, já que os moradores preferem deslocar-se até a capital para trabalhar. Ela transformou-se também em um laboratório de campo para os botânicos e ecologistas fascinados pela densa vegetação que retornou às fazendas abandonadas na antiga Zona do Canal há apenas alguns anos.

Importância subestimada
No passado, os cientistas desprezavam as “florestas secundárias”, conforme é chamada a vegetação que volta a crescer na área em que a floresta original foi derrubada. É claro que essa vegetação está muito longe de ser tão espetacular quando as florestas primárias ricas em espécies, com as suas árvores gigantes que muitas vezes têm séculos de idade. Além do mais, as florestas secundárias abrigam muito menos espécies de animais e plantas. Mas agora um número crescente de biólogos está interessado nesta vegetação anteriormente ignorada. Segundo um estudo da Organização das Nações Unidas (ONU), a importância ecológica destas novas florestas, que estão “crescendo drasticamente” em todo o mundo, é subestimada.

As florestas tropicais estão de fato se recuperando da exploração excessiva? E será que as consequências do desmatamento poderiam não ser tão devastadoras quanto os ambientalistas têm advertido durante anos?

“Atualmente existem mais florestas secundárias do que primárias na maior parte dos países tropicais”, explica o biólogo norte-americano Joe Wright. “De forma geral, a quantidade de terra coberta por vegetação é estável”. Nos países tropicais, em particular, o êxodo rural e a urbanização fizeram com que um número cada vez maior de agricultores abandonasse os seus campos, permitindo que a nova vegetação crescesse vigorosamente na terra desmatada. “Os números falam por si próprios”, afirma Wright.

Wright é biólogo e pesquisador do Instituto Smithsoniano de Pesquisas Tropicais no Panamá. Ele trabalha em uma casa de madeira construída pelos norte-americanos na antiga Zona do Canal, a apenas alguns quilômetros da casa de Felipe Garcia. Ele passou os últimos 25 anos estudando as selvas da América Central, que há muito consistem principalmente de vegetação secundária. “Até mesmo os maias estão cortando as florestas”, diz Wright.

Alegações ingênuas
Recentemente, Wright investigou áreas que foram desmatadas para a construção do Canal do Panamá, onde os norte-americanos removeram os colonos locais. Desde então, grande parte da região voltou a ser tomada pela floresta tropical. Para um leigo, é difícil perceber a diferença entre a floresta primária e a secundária. Na nova floresta da Zona do Canal, macacos guincham, borboletas coloridas voam pelas trilhas na selva e uma águia circula nas alturas. Segundo Wright, “muitos animais adaptam-se a esse meio-ambiente, e 80% da biodiversidade é preservada”.

Com os seus estudos de campo, Wright provocou uma disputa acadêmica entre cientistas de todo o mundo. “Joe é ingênuo”, afirma o seu adversário, Bill Laurance, que realiza pesquisas na região da Amazônia brasileira há vários anos, e que até trabalha para o mesmo instituto que Wright. Pessoalmente, os dois são amigos, mas profissionalmente são grandes rivais.

Laurance teme que Wright esteja minimizando a destruição da mata virgem. “A situação no Panamá, um pequeno país, não pode ser generalizada. Na Amazônia, os pecuaristas e a indústria agrícola estão destruindo a selva em grande escala. A vegetação que cresce nas áreas desmatadas é uma caricatura de uma floresta real”.

Até mesmo Wright reconhece que o Brasil é uma “região-chave” para o futuro das florestas tropicais. Três quartos da Floresta Amazônica encontram-se em território brasileiro. Em nenhum outro local a selva está sendo destruída de forma tão descuidada. Apesar disso, existe ausência de informações confiáveis sobre as consequências de longo prazo da exploração excessiva da floresta.

Olhando sob a máscara
O Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE) do Brasil, que monitora a selva por satélites, informa que uma área de 17% da Floresta Amazônica brasileira foi desmatada. Mas o que ocorre nas áreas desmatadas quando elas são abandonadas após anos de uso agrícola continua sendo “um grande mistério”, diz o pesquisador do INPE Cláudio Almeida.

Em Belém, na região do delta amazônico, o cientista brasileiro atualmente monta um instituto do INPE voltado para o estudo das florestas tropicais. No seu escritório, repleto de caixas de mudança e de equipamentos eletrônicos, Almeida está sentado em frente a um computador, analisando imagens de satélite transmitidas pelo centro de monitoramento de satélites do INPE, em São Paulo. As atuais imagens do espaço só mostram áreas recentemente desmatadas. Até o momento os cientistas não analisaram como as áreas que foram desmatadas há algum tempo modificaram-se com o passar do tempo. “Atualmente estamos observando pela primeira vez o que há sob a máscara”, diz Almeida.

O agrônomo de São Paulo está estudando a vegetação secundária em toda a região da Amazônia brasileira. Usando imagens de satélite, ele selecionou 26 localidades que foram desmatadas anos atrás e que acabaram sendo tomadas por nova vegetação. A seguir ele passou dois meses dirigindo entre essas localidades. A sua conclusão: “Vinte por cento das áreas desmatadas estão se recuperando”.

Entretanto, Almeida não está afirmando que as perspectivas da floresta tropical sejam boas. “Em até cinco anos, a maior parte das florestas secundárias será novamente derrubada e queimada”, declara o pesquisador. Os pecuaristas utilizam as áreas desmatadas como pastagens, e os agricultores plantam soja e outros grãos.

Porém, a vegetação secundária proporciona ao Brasil um benefício significante. As novas florestas ajudam a capturar o dióxido de carbono, um gás causador do efeito estufa, reduzindo desta maneira o aquecimento global. “Nós temos mais biomassa do que acreditávamos anteriormente”, diz Almeida. As novas florestas serão uma questão central na Conferência de Mudança Climática da ONU, em Copenhague, no mês de dezembro, quando será discutido o sucessor do Protocolo de Kyoto.

Wright diz que gostaria de ver a floresta secundária ser colocada imediatamente sob proteção. “Em muitos países, não existe nenhuma vegetação antiga remanescente. Temos que proteger o que restou para ser protegido”.

Reportagem [Can New Growth Save the Amazon Rainforest?]do Der Spiegel, no UOL Notícias.

EcoDebate, 18/08/2009

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