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MPF/MG pede a paralisação da construção do Mineroduto Minas-Rio que ameaça Mata Atlântica e 600 cursos d’agua

Mineroduto Minas-Rio, com 500 km de extensão, ameaça Mata Atlântica e 600 cursos d´agua.

O Ministério Público Federal (MPF) ajuizou ação civil pública perante a Justiça Federal em Belo Horizonte para impedir a continuidade das obras de instalação do Mineroduto Minas-Rio. São réus na ação o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente (Ibama), o estado de Minas Gerais, a MMX Minas-Rio Mineração e Logística Ltda, a Anglo Ferrous Minas-Rio Mineração, a LLX Açu Operações Portuárias S/A, a LLX Minas-Rio Logística Comercial Exportadora S/A e o Instituto Estadual do Ambiente (INEA), do Rio de Janeiro.

O Mineroduto Minas-Rio é um empreendimento minerário composto por três elementos: a mina, de onde será extraído o minério; o mineroduto propriamente dito, com cerca de 500 km de extensão; e o porto de Açu, construído especialmente para viabilizar a exportação do produto. A mina está localizada em Minas Gerais; o porto, no Rio de Janeiro. Ligando os dois extremos, o mineroduto, que começa em território mineiro, no município de Conceição do Mato Dentro, e termina em território fluminense, justamente no Porto de Açu, em São João da Barra (RJ).

Para o MPF, é óbvio que essas estruturas não existem de forma independente; elas são indissociáveis, uma não funciona sem a outra. “No entanto, o procedimento de licenciamento foi fragmentado. Apesar de ser um empreendimento único, a mina vem sendo objeto de licenciamento pelo Estado de Minas Gerais; o mineroduto foi licenciado pelo Ibama, como se tal duto pudesse funcionar sem o minério que provém da mina, e, finalmente, o Porto de Açu vem sendo licenciado pelo Estado do Rio, através do Inea”, afirma a ação.

A fragmentação do empreendimento foi totalmente ilegal, sustenta o MPF. “Um empreendimento que irá gerar impactos em mais de uma unidade da federação, com significativa degradação ambiental, atingindo localidade reconhecida pela UNESCO como reserva da BIOSFERA, comunidades tradicionais, áreas de Mata Atlântica em estágio primário, áreas de preservação permanentes, além do próprio mar territorial brasileiro, deve, por força da legislação nacional, ter o processo de licenciamento conduzido pelo Ibama. Em inusitada decisão administrativa, o empreendimento foi fracionado, gerando graves consequências”, sustenta a procuradora da República Zani Cajueiro Tobias de Souza.

O MPF entende que o fracionamento ocorreu para driblar os diversos entraves ambientais que certamente teriam de ser enfrentados num procedimento de licenciamento único. No caso do Ibama, há ainda a agravante de que as licenças do mineroduto foram concedidas de forma açodada, inclusive com lacunas no EIA/Rima, o qual foi analisado por equipe técnica multidisciplinar sem a formação exigida.

Impactos – O mineroduto, licenciado pelo Ibama, será construído em plena Serra do Espinhaço, uma área de extrema relevância ambiental que foi inclusive declarada Reserva da Biosfera pela Unesco. Ele irá atravessar uma bacia hidrográfica de grande importância, impactando significativamente em cerca de 600 cursos d’água e, até, no próprio mar territorial brasileiro, já que a água que levará o minério será despejada no oceano através do Porto de Açu.

E o que é mais grave: há ausência de informação, mesmo após a concessão da licença de instalação, do traçado final do mineroduto. O parecer que fundamentou tal licença não é claro quanto à supressão de Mata Atlântica em estágio primário e secundário avançado de regeneração, o que é absolutamente proibido. A lei exige que a supressão de Mata Atlântica primária ou secundária somente ocorra por utilidade pública ou interesse social. Como o mineroduto – empreendimento de caráter exclusivamente privado – não se enquadra em qualquer dessas previsões legais, o Ibama, na tentativa de viabilizar o licenciamento, classificou-o como uma espécie de “acessório da mineração”, ainda que os estudos de impacto tenham sido realizados de forma dissociada dos estudos da mina.

Na verdade, o Ibama foi além: concedeu a licença prévia ante o compromisso do empreendedor de alterar posteriormente o traçado original do mineroduto de modo a não afetar a área de Mata Atlântica. “Ainda que se possam aceitar pequenas correções em virtude de ocorrências imprevistas, como ocorrem em qualquer obra, o traçado final é o básico para o licenciamento. Seria o mesmo que uma prefeitura conceder alvará para construção sem projeto. Ou seja, após a concessão da licença, restou ao alvedrio do empreendedor apresentar o traçado final do mineroduto, sem maior controle por parte da autarquia federal”, afirma a procuradora Zani Cajueiro.

Em audiência pública realizada no município de Alvorada de Minas, o empreendedor afirmara ainda que não haveria qualquer interferência do mineroduto em patrimônio cultural e arqueológico. Contudo, após essa data, protocolizou relatório complementar ao EIA informando que o traçado do mineroduto “atingirá diretamente vários sítios históricos e arqueológicos”, mas sem especificar o impacto exato do duto nessas áreas e se haveria demolição das construções históricas.

As irregularidades não param aí. A atuação do Ibama acabou por facilitar também a desconsideração da existência de comunidades tradicionais na área de abrangência do projeto. Essas comunidades, como se sabe, merecem proteção especial do Estado, e não podem simplesmente ser ignoradas durante um processo de licenciamento ambiental. Sua existência foi detectada, inclusive, pela própria equipe do licenciamento estadual da Mina Sapo-Ferrugem, que propôs, como condicionante da licença prévia, um programa especial de negociação fundiária com as famílias.

De acordo com o MPF, o Ibama teria chegado ao absurdo de afirmar que a autarquia não analisa impactos sociais se não for sob o enfoque dos recursos naturais, relegando tais análises a outras instituições. Na verdade, até a própria designação do responsável para realizar a análise dos impactos sociais desmascarou a formação de uma equipe multidisciplinar como exige a lei: um arquiteto, sem nenhuma formação em sociologia ou antropologia, foi o responsável pela elaboração da análise do EIA/Rima no que tange ao impacto social.

A ação elenca ainda diversas falhas graves existentes no licenciamento estadual para a mina, desde a inobservância do zoneamento econômico ecológico de Minas Gerais até a formação inadequada da barragem de rejeitos.

Pedidos – O MPF pede que a Justiça conceda liminar determinando a paralisação imediata de qualquer atividade de construção do Mineroduto Minas-Rio e suspendendo os efeitos da licença prévia da Mina Sapo-Ferrugem, das licenças prévia e de instalação do Mineroduto e das licenças prévia e de instalação do Porto de Açu.

Pede ainda que, ao final da ação, seja decretada a nulidade dos procedimentos de licenciamento e das licenças concedidas até o momento e que seja declarada a atribuição do Ibama para realizar o licenciamento do empreendimento, considerando-o como um todo único e indissolúvel formado pelo conjunto Mina-Mineroduto-Porto.

* Informe da Procuradoria da República em Minas Gerais, publicado pelo EcoDebate, 13/08/2009

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