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Artigo

As três serras ou o homem que não estava (nem) lá, artigo de Mayron Régis

[EcoDebate] Faz algum tempo, menos que se anseia. Um pouco antes da eleição presidencial de 1994, o então pré-candidato Luis Inácio Lula da Silva e o seu séquito faiscaram por pequenas cidades do nordeste e de parte do sudeste com um fim, em si mesmo, de autuarem em flagrante o estado de extrema pobreza em que vivia boa parte da sociedade brasileira sem que os governos atuassem no sentido de debelá-la. Com todo o cuidado, nominaram a trupe de Caravana da Cidadania que atendia um pressuposto que os anos de ditadura militar e os primeiros anos da nova república desfalcaram e desfalcavam de políticas públicas voltadas para a saúde, saneamento, educação e geração de renda comunidades inteiras da zona rural, seja do Semi-Árido ou do Cerrado. Acendia nas esquerdas uma chama de inconformismo e de contestação, coisa do tipo do “cavaleiro da esperança” nos anos 30. Antes das esquerdas exercerem a “cidadania” em 1993 e 1994, políticos visitaram e visitavam essas áreas, e iriam continuar visitando, para inaugurações fajutas de obras de combate a seca.

As imagens de interiores menos ou mais distantes dos centros urbanos e dos centros rurais à mercê dos maus-humores da natureza e à mercê de políticos corruptos e incompetentes que se esboçou e esboça-se por longevas décadas no inconsciente coletivo da população deforma inteiramente a realidade nesses e desses interiores, pois as políticas públicas definidas pelos governos, geralmente, pautam-se por preconceitos das mais variadas colorações seja de esquerda, de direita ou de centro.

Uma das políticas mais visadas para “resolver” os problemas de um determinado estado é a divisão deste em dois ou três. O Maranhão, um dos estados visitados pela Caravana da Cidadania, pode se transformar em dois como aconteceu com Goiás que viu se desprender a sua parte norte que alterou seu nome para Tocantins. Como se sabe, as criações de novos estados beneficiam famílias políticas e empresariais que esperam se apossar das estruturas montadas para que o estado funcione. Apossar e sugar seus recursos até a última gota e a última árvore ser derrubada.

A discussão em torno da criação do estado do Maranhão do Sul murchou um pouco nos últimos anos, porque seus artífices se valeram de outros cargos políticos para continuarem suas carreiras como é o caso do prefeito de Imperatriz, o ex- deputado Sebastião Madeira, e do ministro das Minas e Energia, o senador Edson Lobão. A criação do Maranhão do Sul correspondia à criação do estado do Tocantins, cujo lema no governo de Siqueira Campos fora “Estado da livre iniciativa e da justiça social”.

Os grandes projetos para o sul do Maranhão, nas mãos de Edson Lobão, Madeira e tantos outros, serão as hidrelétricas e as monoculturas em larga escala nas bacias do rio Tocantins e do rio Parnaíba – Cerrado sul-maranhense. Alveja-se qualquer outro projeto da agricultura familiar ou de meio ambiente como acontece com a não-regularização de áreas de assentamento do Instituto de Terras do Maranhão no município de Tasso Fragoso e com o desinteresse na criação de unidades de conservação nos Gerais de Balsas.

Tirante os homens de projetos hidrelétricos ou de monocultura que pesquisam águas ou pesquisam solos como se vida não houvesse nesse Cerrado e como se alguns dias de pesquisa dessem pistas fundamentais sobre os recursos naturais, quem são os agricultores familiares que se agigantam sobre aqueles baixões e sobre aquelas serras – Serra do Boi Liso, Serra do Gado Bravo e Serra do Penitente- Gerais de Balsas?

Quem veio de muito longe – sente dificuldade – subir a Serra do Boi Liso. O Constâncio, que mora e trabalha na propriedade do senhor João Fonseca, sócio da Associação Camponesa, em Balsas, sente nada. De arrumação em arrumação – o curso de agroecologia para mais de quinze agricultores familiares de Balsas, Riachão e Tasso Fragoso, com recursos do Centro de Apoio Sócio Ambiental, acontecia de 21 a 24 de maio de 2009 – a Serra do Boi Liso se esparrama por mais de três mil hectares de Cerrado intacto. Aquele agricultor estava lá havia poucos anos, mas seu espaçar pelo capim encharcado demonstrava que seu fôlego resistiria. Do alto da Serra do Boi Liso se enxergaria o vão, contudo naquela oportunidade como em outras ela se mostrara inacessível para um simples olhar. De outra feita, um grupo que intentava comprar a Serra vasculhou todas as possibilidades para uma possível estrada até o topo e nada.

O curso de agroecologia, ministrado pela professora Marilene e pela sua equipe, moradores do município de Coroatá, compreendeu módulos em que se apresentavam noções de criação de animais, produção de adubo orgânico, horta ecológica e produção de inseticidas naturais a partir da flora do Cerrado. O senhor João Fonseca trouxe o curso para a sua propriedade porque nela estava realizando as suas técnicas agroecológicas e faturava anualmente mais de vinte mil reais. A forma que cria seus porcos distantes do igarapé EIU exemplifica muito disso: o cuidado com os recursos hídricos, afinal essa é uma região que chove muito e que chove muito pouco também.

Esse texto resulta de uma visita de cinco dias a região de Balsas para participar do Curso de formação para multiplicadores em agroecologia realizado pela Associação Oficina Nova Vida e financiado pelo Centro de Apoio Sócio-Ambiental (CASA).

Mayron Régis, assessor de comunicação Fórum Carajás

[EcoDebate, 15/06/2009]

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