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Número de suicídios entre indígenas do Amazonas pode ser oito vezes maior que média nacional

Tabatinga (AM) – Informações do Distrito de Saúde Indígena (Dsei) do Alto Solimões revelam que nos municípios amazonenses de Tabatinga, Benjamin Constant, Santo Antônio do Içá, Amaturá, São Paulo de Olivença e Tonantins a média de suicídios registrada em 2008 é de 38,32 para cada 100 mil habitantes. A taxa de suicídios nessa região pode chegar a ser quase oito vezes maior que a média nacional que, segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), varia de 3,9 a 4,5 para cada 100 mil habitantes.

O Dsei Alto Solimões é o primeiro do interior do Amazonas a organizar dados sobre o problema. A equipe atende 42.093 indígenas pertencentes a sete etnias, predominantemente ticuna.

A prática de suicídio entre indígenas que vivem na região do Alto Rio Solimões, no sudoeste do Amazonas, deve-se a fatores diversos mas, principalmente, a aspectos culturais e à falta de perspectivas para o desenvolvimento pessoal e profissional desses indivíduos. Essa é a opinião do gerente do Programa de Saúde Mental da Fundação Nacional de Saúde (Funasa), Carlos Coloma. De acordo com ele, o assunto continua sendo uma das principais preocupações não só entre os povos indígenas, mas também entre os profissionais que trabalham com essas populações.

“A morte tem um sentido diferente para os indígenas em comparação à cultura ocidental. Para muitos povos, morrer significa passar para outra vida. Isso pode ser uma das justificativas culturais para a prática. Contudo, a atitude, obviamente, está relacionada a uma questão emocional e pode também ser influenciada pela falta de oportunidades de educação e trabalho. A Funasa ainda não tem essas informações consolidadas, mas pretende identificar esses índices e, a partir daí, realizar o diagnóstico da situação”, avaliou.

Discussões sobre a prática de suicídio entre indígenas estiveram em pauta nesta semana em Tabatinga, no Seminário sobre o Enfrentamento de Situações que Colocam em Risco as Comunidades Indígenas do Dsei Alto Rio Solimões. Promovido pela Funasa, com apoio da Fundação das Nações Unidas para a Infância (Unicef), o encontro reuniu, entre os dias 26 e 28 deste mês, quase 100 pessoas, entre indígenas e representantes do Poder Público municipal, estadual e de organizações não governamentais, como o próprio Unicef e a Oficina Escola de Lutheria da Amazônia (Oela), além de integrantes do Exército e das polícias Civil e Militar.

De acordo com Coloma, a taxa registrada no Alto Solimões não é uma das mais altas entre as populações indígenas em comparação a outras regiões mundiais. Ainda assim, torna-se preocupante porque segue uma tendência mundial, que é o número maior de suicídios entre indígenas do que entre não indígenas. A questão apontada deve receber, nas próximas semanas, atenção especial da Funasa. Depoimentos e relatos feitos no encontro em Tabatinga serão utilizados pela instituição para a formulação de um plano que possa combater a incidência de suicídio nas aldeias.

Para o antropólogo e professor da Universidade Federal do Amazonas (Ufam) José Maria Trajano, os indígenas do Alto Solimões, sobretudo os que vivem mais perto das cidades, estão passando por uma crise de identidade.

“O caso do Alto Solimões se assemelha com o dos índios Guarany, no Mato Grosso, vivido há alguns anos. A crise de identidade é um problema. Esses indígenas já têm um conhecimento tradicional e quando estreitam o contato com o meio urbano, passam a desejar coisas e perspectivas que ainda não fazem parte das aldeias. Não alcançar o objeto de desejo pode gerar entre eles um conflito emocional entre o ter e o não ter, entre os valores tradicionais e os não tradicionais. Muitas vezes, o indígena fica confuso entre querer ter a identidade do povo branco e manter a identidade herdada de seus ancestrais”, avaliou o antropólogo.

Nas considerações de Trajano, por causa das dificuldades culturais, de educação formal, falta de profissionalização e falta de oportunidades, os índios acabam se deslocando de suas tradições e modo de vida e ingressando nessa crise. “A procura pelas drogas é uma das consequências dessa crise. A embriaguez pode favorecer situações de violência ou suicídio”, avalia.

O antropólogo acredita que as políticas públicas indigenistas devem considerar as diferenças existentes entre os indígenas que vivem em regiões mais próximas aos centros urbanos e os que vivem de forma mais isolada. “É o momento de pensar em outras possibilidades de educação e emprego para esses indígenas que estão mais próximos e que têm mais conhecimento e contato com o meio urbano. Isso porque eles também querem manter sua cultura, mas evoluir em educação e trabalhos profissionais”, afirmou.

Edição: Graça Adjuto

Matéria de Amanda Mota, da Agência Brasil, publicada pelo EcoDebate, 30/05/2009.

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