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Artigo

Baixo Amazonas – A Nova Invasão, artigo de Pe. José Cortes

A mesorregião do Baixo Amazonas. Fonte: Wikipédia
A mesorregião do Baixo Amazonas. Fonte: Wikipédia

[EcoDebate] A região do Baixo Amazonas vive o seu grande momento de invasão, colonização e expropriação. As investidas à região não são de agora. Estas se iniciam no processo de colonização a partir do século 16, continuam com a exploração da borracha e, mais recentemente, com os grandes projetos sobretudo com a construção das rodovias que ”unem” a região ao restante do país. Hoje assistimos ao ataque final e definitivo a esta região por parte de diversos agentes do capital.

O ataque definitivo tem no comando vários protagonistas. A soja que ocupa terras da agricultura familiar, derruba florestas, destrói comunidades inteiras e grita alto e a bom som: “estamos trazendo o progresso para a região”. Madeireiras que derrubam, roubam e exportam ilegalmente a madeira. Mineradoras que entram em conflito com as comunidades tradicionais e ocupam seus territórios.

Presentemente duas novas ameaças estão no ar. Vamos agora apresentar cada uma delas:

A primeira ameaça vem do próprio governo do estado do Pará. Este iniciou no ano passado uma discussão sobre a destinação das glebas Nova Olinda, Nova Olinda II, Curumucuri e Mamuru. Para iniciar esta discussão o governo do Pará decretou uma Área de Limitação Administrativa Provisória (ALAP) cobrindo uma área de 1.210.602 ha nas glebas Nova Olinda, Nova Olinda II, Curumucuri e Mamuru.

Como estas glebas ficam nos municípios de Santarém, Aveiro e Juruti, os movimentos sociais da região junto com as lideranças das comunidades afetadas pela ALAP se debruçaram sobre esta área e encaminharam ao governo do estado uma proposta para a destinação da terra nas glebas tentando proteger os interesses dos indígenas e comunidades tradicionais da região.

A questão é que na referida área não se encontram só indígenas e comunidades tradicionais. Ali se encontram também os permutados que o governo do estado trouxe do município do Trairão. Estes permutados originários do Sul do País entraram naquelas terras sem que as comunidades locais fossem consultadas e uma parte das áreas dadas aos permutados pelo governo do Estado, são reindividicadas pelas comunidades indígenas.

O próprio governo do estado deflagrou um conflito na região que tenta arrumar com a destinação destas glebas tentando arrumar uma forma de conciliar conflitos inconciliáveis. Entre permutados e indígenas existe uma cosmovisão e utilização da terra que não se podem conciliar. Enquanto uns olham a terra como território coletivo, memória e sobrevivência física, social e cultural, os permutados olham para a região com olhos econômicos onde há muitas possibilidades e riquezas a serem exploradas de forma predatória. Esta rapina já está acontecendo conforme relatório do IBAMA.

O Governo do Estado do Pará não acautelou os interesses das comunidades locais e o seu real interesse é a rápida destinação das terras das glebas para que se possa iniciar o assalto legalizado à madeira da região.

No dia 16 de Abril de 2009, se reuniram em Santarém, o governo do estado com os representantes das comunidades das glebas e movimentos populares, permutados e setor madeireiro. O encontro, no seu primeiro dia, foi de apresentações de trabalhos realizados nas glebas no contexto da Lei de Concessão Florestal. Isso mostrou para a platéia presente qual o real interesse do Estado. A grande discussão para os governos federal e estadual não é sobre território das comunidades tradicionais, indígenas e quilombolas, mas como favorecer o setor madeireiro e possibilitar o último e grande assalto à região.

A outra grande ameaça vem do projeto Hidroelétrico em São Luís do Tapajós. A Eletrobrás apresentou ao Ministério de Minas e Energia um projeto estimado em R$ 31 bilhões para a construção do Complexo Tapajós que possui uma previsão de capacidade instalada para a geração de 10.682 mil megawatts (MW). O estudo de inventário, que identificou a viabilidade de cinco aproveitamentos ao longo dos rios Tapajós e Jamanxim, foi finalizado recentemente, em parceria com a CNEC, empresa de engenharia pertencente ao grupo Camargo Corrêa.

Este projeto, se levado adiante, será a morte definitiva do Tapajós e das comunidades tradicionais que vivem ao longo de suas margens. Já se sabe que existem pessoas que estão felizes com este projeto já que prevêem grandes negócios. Outros têm esperança de abundância de empregos. Mas, no final, para a região só ficará destruição e morte. Tudo em nome do progresso.

As populações locais, reunidas em Itaituba, se manifestaram contrárias ao projeto: “Diante do desrespeito das autoridades para com nossos povos, nós, ribeirinhos, agricultores familiares, pescadores, indígenas, sócio-ambientalistas, educadores populares, jovens, homens e mulheres atingidos e ameaçados pelo Complexo do Tapajós, e por outras obras, decidimos que: Não aceitamos e declaramos que somos contrários ao Complexo Hidrelétrico do Tapajós que, além de prejudicar nossa cultura e meio ambiente, não nos trará benefícios, beneficiando apenas o grande capital e empresas nacionais e estrangeiras.” (carta aberta, 30 de Abril de 2009 – Itaituba)

A mesma carta afirma as razões para esta recusa: ”Temos clareza de que os impactos ambientais, econômicos, sociais e culturais, na bacia do Rio Tapajós, comprometem a vida humana, animal e vegetal, sem respeitar fronteiras geopolíticas, nem acordos governamentais. Assim, denunciamos a conivência passiva e ativa do governo e seus órgãos, diante dos crimes cometidos pelas empresas construtoras de barragens (Andrade Gutierrez, Odebrecht, Camargo Corrêa, etc.) e empresas eletro-intensivas (Albras, Alunorte, VALE, Pará Pigmento, Alcoa, Itacimpasa, Imerys Rio Capim Caulim, etc.) que consomem muita energia, geram pouco emprego, saqueiam nossos recursos naturais, contaminam nossos rios, terra, floresta, ar e destroem e violam os direitos das comunidades locais e comunidades indígenas.” (Carta aberta 30 Abril de 2009 – Itaituba).

A CPT – Comissão Pastoral da Terra – esteve em todas estas discussões e reafirma que acima dos interesses do mercado, devem estar sempre os interesses das populações tradicionais da Amazônia. Reafirmamos que acima do mercado e do lucro está o direito a uma vida digna. Antes de mais nada, o governo precisa “investir em políticas públicas nas áreas de saúde, educação, moradia, agricultura familiar, pesca, estradas e vicinais e tudo o mais que as pessoas necessitam para viver com dignidade e conservar o meio ambiente e a cultura para as presentes e futuras gerações.” (carta aberta)

Pe. José Cortes-Coordenador da CPT Santarém

* Artigo enviado por Rogério Almeida, colaborador e articulista do EcoDebate

[EcoDebate, 29/05/2009]

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