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Justiça suspende votação de licenciamento ambiental para projeto de mineração em Paracatu-MG

A Justiça Federal em Patos de Minas concedeu liminar na Ação Civil Pública nº 2009.38.06.001018-9 e determinou a suspensão do processo de votação do licenciamento ambiental referente ao Projeto de Expansão e Lavra requerido pela empresa Rio Paracatu Mineração (RPM), até que os relatórios técnicos de identificação e delimitação de comunidades quilombolas atingidas pelo empreendimento sejam devidamente incluídos e analisados pelo órgão ambiental competente.

A Rio Paracatu Mineração pertence ao grupo canadense Kinross. O projeto de expansão da mina situada a 2 km ao norte da cidade de Paracatu/MG é um megaempreendimento voltado a triplicar a produção anual da RPM: dos atuais 20 para 61 milhões de toneladas de ouro por ano.

Com a ação ajuizada no último dia 20 de março, o Ministério Público Federal pretende resguardar os direitos de três comunidades remanescentes de quilombos – Machadinho, Amaros e São Domingos -, cujas terras serão afetadas pelo empreendimento. A expansão da barragem de resíduos, por exemplo, está prevista para ser feita em terras identificadas como pertencentes à Comunidade do Quilombo do Machadinho.

Segundo o MPF, existem várias inconstitucionalidades e ilegalidades no processo de licenciamento ambiental, as quais levaram inclusive à expedição, no ano passado, de três Recomendações aos órgãos ambientais e à própria mineradora para que não houvesse votação do processo de licenciamento até que as irregularidades fossem sanadas. Essas recomendações receberam parecer favorável ao acatamento emitido pela Assessoria Jurídica regional da SUPRAMNOR, órgão da Secretaria Estadual de Meio Ambiente. Mas o COPAM ignorou tanto os pareceres quanto as recomendações e insiste em continuar a votação do processo de licenciamento ambiental.

O MPF sustenta que as práticas da empresa mineradora causaram e vêm causando diversos danos patrimoniais e morais às comunidades quilombolas que habitam a região, por meio de processos complexos e sutis de “expulsão” de suas terras e de desagregação de sua identidade cultural.

Comunidades tradicionais – Para o juiz federal José Humberto Ferreira, ficou claro que a Rio Paracatu Mineração “está buscando o licenciamento ambiental para expandir sua lavra e construir a barragem de resíduos nas terras que estão sendo identificadas e delimitadas como sendo dos Remanescentes da Comunidade do Quilombo do Machadinho, o que tornaria letra morta o disposto no art. 68 do ADCT”.

O art. 68 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias dispõe que “aos remanescentes das comunidades dos quilombos que estejam ocupando suas terras é reconhecida a propriedade definitiva, devendo o Estado emitir-lhes os títulos respectivos”.

No caso, além de já terem sido reconhecidas oficialmente como remanescentes de quilombos e de terem tido as terras demarcadas pelo Incra, as comunidades aguardam apenas a conclusão do processo de outorga da titularidade, que se encontra em sua fase final.

Segundo o MPF, a Rio Paracatu Mineração tem pressionado a humilde comunidade de Machadinho a negociar a área já delimitada, mas ainda não titulada, através de métodos sutis como abertura de estradas próximas às propriedades dos quilombolas, aviso de compra e posse de escrituras na região circunvizinha, pressões sobre a comunidade quanto aos investimentos realizados e quanto aos empregos que supostamente deixariam de ser gerados em Paracatu.

“Até mesmo a notícia quanto ao rompimento de um dos tanques da RPM, que causou a morte de alguns animais e de parte da vegetação, serve para incutir medo nos quilombolas e forçar-lhes a idéia de inevitabilidade da venda das propriedades, que vão ficando isoladas, ilhadas, diante da compra dos terrenos circunvizinhos pela mineradora”, afirma o procurador da República Onésio Soares Amaral.

Inalienabilidade – Na decisão, porém, o juiz federal lembra que “a titulação da terra será efetuada mediante outorga de título coletivo e pró-indiviso às comunidades quilombolas, com cláusulas de inalienabilidade, imprescritibilidade e de impenhorabilidade”, devendo ser destacado que “a declaração de remanescentes de quilombos não é feita para pessoa determinada, de forma singular, mas sim para a comunidade, já que, de acordo com o regulamento, os remanescentes das comunidades de quilombos são os grupos étnicos-raciais”.

Em seguida, afirma que “a Carta Política de 1988, no § 5º do art. 216, tombou todos os documentos e sítios detentores de histórias dos antigos quilombos, não deixando margem para dúvida quanto a opção do povo brasileiro pela sua preservação”. “Portanto, se as terras ocupadas por remanescentes de comunidades quilombolas sequer podem ser desapropriadas pelo Estado para reforma agrária, também não podem ser ocupadas por empresa privada para fins de lavra”.

Em caso de descumprimento da decisão judicial, a mineradora ficará sujeita ao pagamento de multa no valor de um milhão de reais. Também os conselheiros do COPAM poderão pagar multa no valor de vinte mil reais, cada um deles, se descumprirem a liminar.

Assessoria de Comunicação Social, Procuradoria da República em Minas Gerais

Nota do EcoDebate: sobre o licenciamento ambiental e a atuação da Rio Paracatu Mineração (Kinross) sugerimos que leiam, também:

Declaração de guerra pela água na Câmara Municipal de Paracatu

A insustentável leveza da poeira venenosa, artigo de Serrano Neves

O Direito de Escolha

Por que continuarmos pobres e dependentes, mais de duzentos anos depois de Tiradentes?, artigo de Sergio Ulhoa Dani

[EcoDebate, 08/04/2009]

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