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Notícia

Licenciamento ambiental em Minas Gerais: Legitimando a destruição em defesa dos lucros das empresas

Minas Gerais é conhecida por sua riqueza mineral e pelas águas, que dão origem às duas maiores bacias hidrográficas do Leste do Brasil. O minério é, mais do que insumo industrial, uma fonte de riqueza e de acumulação, muito especialmente para operadores e investidores do mercado volátil e anônimo global. Além do conhecimento, de modernas tecnologias e infra-estrutura em grande escala, o que será que faz o minério de ferro do Brasil ser o mais barato do mundo, como já disse o atual presidente da Vale?

A atuação do Governo de Minas e do COPAM (Conselho de Política Ambiental de MG), no sistema de licenciamento ambiental dos empreendimentos de grande porte no Estado vem para legitimar a destruição sócio-ambiental em regiões muito ricas ambientalmente. Em todo o Estado de Minas são vários os casos que mostram que o licenciamento é uma farsa, operada pelo sistema estadual (SISEMA), nele incluídos os órgãos licenciadores – colegiados compostos por maiorias dispostas a entregar o ouro, as águas, de maneira tão irresponsável, que o tempo se encarrega de dirimir as dúvidas e as posições dos ingênuos e bem intencionados, que não são poucos.

O mérito dos projetos de grandes investidores não é avaliado; pessoas a serem atingidas não são suficientemente informadas; audiências não aprofundam os problemas e não têm participação efetiva da sociedade; irregularidades no âmbito legal campeiam; o Estado cria artimanhas e “farseia” procedimentos, visando a liberação de licenças e a arrecadação de ativos de curto prazo, alterando se necessário as leis para facilitar a destruição e oferecer segurança “jurídica” para a dilapidação.

Atas de reuniões públicas são uma piada – revelam muito pouco do que foi discutido. Posições críticas e aspectos preciosos, são, não raramente, jogadas debaixo do tapete de procuradorias e arquivos mortos, para evitar que verdades e informações fornecidas aos tomadores de decisão, não sejam consideradas por eventual instância jurídica, com competência para mudar decisões tomadas ao arrepio da lei e da isenção dos processos.

ALGUNS CASOS

Votorantim Metais

Em Três Marias, ao lado do Rio São Francisco, a Votorantim Metais com a produção de zinco, há mais de 40 anos, vem poluindo as águas, contaminando e causando mortandade de peixes, principalmente de Surubins, o que coloca sob contínua ameaça a pesca artesanal. São inúmeras irregularidades que se juntam à omissão do governo estadual e de sua principal instância ambiental, o COPAM, que vêm minando a credibilidade do Estado quanto à defesa do bem público. Em 2005 a Secretaria de Estado de Meio Ambiente – SEMAD fez um relatório que confirmava a responsabilidade da Votorantim pela mortandade dos peixes. Mas a empresa se contrapôs a esse estudo e, até hoje, a Secretaria não apresentou a contra prova, a omissão dificulta os processos judiciais contra a empresa e a recuperação do passivo ambiental. Mesmo assim, ciente da responsabilidade da empresa por danos causados ao meio ambiente, o COPAM, em 2006 aprovou a licença de operação por mais 4 anos.

No município de Vazante, onde a Votorantim extrai o zinco processado em Três Marias, a mineração subterrânea já atingiu o aqüífero Guarani, região calcárea, de onde se bombeia 7.500 m3 por hora para viabilizar a retirada do minério. Grande número de dolinas vêm aparecendo na região, que também sofre pelo esgotamento de nascentes e lagoas e pela contaminação de córregos por falhas na barragem de rejeitos. Neste mês o MPF MG ajuizou uma ação civil publica pedindo a imediata paralisação dessa empresa, denunciando as irregularidades e a omissão do Governo Mineiro e Federal. http://noticias.pgr.mpf.gov.br / www.ecodenuncia.com.br

Barragem de Berizal

A Barragem de Berizal, na região Norte de Minas, vai atingir aproximadamente 700 famílias. Formando um lago de 3,6 mil ha, atingindo varias áreas férteis e fragmentos de matas de cipó em região de transição entre o Cerrado e a Caatinga, área caracterizada pela diversidade socioambiental. A SUPRAM Norte de Minas encaminhou ao DENOCS (empreendedor) um Relatório de Controle Ambiental para liberação da Licença Prévia (LP), sem cumprir a exigência do EIA/RIMA, apesar da obra ser enquadrada na classe 6. A LP foi aprovada primeiramente ad referendum, pela Presidência do COPAM, forçando um fato consumado para posterior aprovação do COPAM Regional Norte de Minas.

Serra do Gandarela

A Serra do Gandarela é parte integrante da Serra do Espinhaço, e expressa, por si só, a caracterização das reservas da Biosfera Serra do Espinhaço e Mata Atlântica, quer pela ocorrência de diversas espécies endêmicas, pela sua preservação quase inalterada e, similarmente ao Espinhaço, por ser um divisor das bacias São Francisco e Doce, e manancial de águas de excelente qualidade. Em 2004, o COPAM concedeu LP para a atividade minerária, atualmente pretendida pela empresa Vale, no Gandarela. O processo de concessão da LP pelo órgão competente FEAM dispensou a Declaração de Conformidade da Prefeitura de Caeté, item obrigatório no procedimento de licenciamento ambiental, bem como a Manifestação Prévia do Conselho Consultivo da APA SUL RMBH, por estar a referida área localizada nesta Unidade de Conservação Estadual da Região Metropolitana. Embora seja uma só área de relevante interesse natural e hídrico, seis (6) Autorizações Ambientais de Funcionamento (AAF) foram concedidas para projetos contíguos no interior da Serra do Gandarela, burlando o impacto cumulativo sobre a região e dispensando a realização de EIA/RIMA. O assunto foi encaminhado em novembro ao Ministério Público Estadual e foi aberto o inquérito nº 002/07 junto à Promotoria de Belo Horizonte pelo fato de se estar fracionando um projeto, de fato, bem maior. A Vale quer a todo custo minerar a maior fonte de água da margem direita do Rio das Velhas, à montante da maior captação que atende a Belo Horizonte e Região Metropolitana. A margem esquerda, coitada, já está quase toda minerada, muitas e muitas nascentes suprimidas e o lençol freático… imagine.

Capão Xavier

A mineração de Capão Xavier é realizada na jazida/reservatório de água que abastece os mananciais de Mutuca, Fechos, Catarina e Barreiro. As condições para a captação e adução das águas – desapropriação de terrenos, perfuração de túneis, aquisição de tubos e montagem de adutoras e estações de tratamento – foram criadas por diferentes governos do Estado e de Belo Horizonte, ao longo da primeira década até os anos 50 do século passado. No início dos anos 80, o então governador Francelino Pereira sancionou leis transformando parte significativa dos terrenos destes mananciais, em Áreas de Proteção Especial, para proteção do abastecimento público.

O Projeto Capão Xavier teve as licenças Prévias, de Instalação e Operação concedidas pelo COPAM, por intermédio da Câmara de Atividades Minerárias, com anuência da COPASA e da Prefeitura de Belo Horizonte (Gestão Fernando Pimentel), e pareceres favoráveis da Fundação Estadual de Meio Ambiente e do Instituto Estadual de Florestas.

Depois de iniciada a atividade da mina de Capão Xavier, veio a público que alguns dos principais reservatórios da COPASA estão sendo assoreados e terão pouco mais do que 20 anos de vida útil. Durante a CPI Estadual de Capão Xavier, representantes da empresa alegaram que as águas acumuladas no reservatório natural de Capão Xavier não estariam em risco e pouco significavam para Belo Horizonte e a Região Metropolitana.

Técnicos da FEAM também informaram, após a mina ter sido licenciada, que as interferências físicas nos mananciais tornariam sem efetividade a classificação das águas dos mananciais impactados, todas Classe Especial e as melhores da RMBH, fornecidas, por gravidade e diretamente do subsolo, para uma população de 350 mil habitantes, para as regiões do Barreiro e Zona Sul de Belo Horizonte, para condomínios de Brumadinho, Nova Lima e a Siderurgia Valourec-Mannesmann.

Parque do Rola Moça – Serra da Moeda – Serra da Calçada

O Parque Estadual da Serra do Rola-Moça abriga parte dos mananciais diretamente afetados pela mina de Capão Xavier, e mais os de Taboões, Rola-Moça e Bálsamo e é a maior reserva natural da Região Metropolitana de Belo Horizonte. O retorno da mineração ao Parque Estadual Serra do Rola-Moça foi proposto pela empresa AVG, que prevê a reativação da Mina Casa Branca (desativada judicialmente pelo enorme passivo ambiental) e a passagem de uma esteira para transporte de minério pelo interior do parque. Órgãos do Estado argumentam que é necessária a reativação da Mina Casa Branca, alegando a necessidade de que alguém assuma a recuperação da área degradada. A comunidade do entorno não foi consultada sobre o retorno dessa atividade.

A Vale chama de “Serra da Moeda Sul” uma área que pretende explorar e que também compreende a Serra da Calçada, nos municípios de Brumadinho e Nova Lima. A relevância natural, histórica e arqueológica da Serra da Calçada, e a forte mobilização social por sua preservação, motivaram o Conselho Estadual do Patrimônio Cultural a aprovar o seu tombamento provisório. Em recente reunião na Assembléia Legislativa, representantes da Fiemg e de empresas interessadas na área, manifestaram-se favoráveis ao meio ambiente e à preservação da Serra da Calçada, mas declararam que seu tombamento ou a declaração da mesma como Monumento Natural, implicarão na judicialização do caso. Os defensores das Serras Moeda-Calçada ficaram “sem entender” se as empresas Vale e Anglo Ferrous querem mesmo a preservação deste importante patrimônio.

Serra da Piedade

A Serra Piedade, monumento natural do Estado e santuário da Padroeira de Minas Gerais vem sofrendo constantes investidas de empresas mineradoras, ao mesmo tempo em que motiva forte apelo popular em sua defesa. A última atividade minerária foi paralisada em 2006, por liminar da Justiça Federal em ação civil pública movida pelos ministérios públicos Estadual e Federal e o IPHAN contra a empresa Brumafer, a FEAM e o Estado de Minas Gerais, pelos danos causados à Serra da Piedade. Para corrigir os danos ambientais, um novo empreendedor pretende minerar a Serra da Piedade por pelo menos mais 15 anos, para, desta forma, “recuperar” o passivo ambiental da atividade de mineração anterior. A Serra da Piedade é tombada em níveis estadual, federal e municipal.

Estes casos, entre outros, demonstram irresponsabilidade e descaso em relação a leis AMBIENTAIS do País, que, embora MUITO AVANÇADAS, SÃO REGULARMENTE desrespeitadas por órgãoS municipais, estaduais e federais teleguiados pela voracidade do capital.

Articulação Popular em defesa do Rio São Francisco/ SOS Serra da Piedade / Movimento Pelas Serras e Águas de Minas http://www.pelasserraseaguasdeminas.com.br – Novembro/2008

* Nota divulgada em Belo Horizonte, durante Diálogos da Terra no Planeta Água e enviada por Isabela Cancado e Alexandre Gonçalves

[EcoDebate, 01/12/2008]

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