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Artigo

A prevenção da Hepatite C, artigo de Ana Echevenguá

[The hepatitis C prevention, article by Ana Echevenguá]

“A revolução hoje passa pela palavra e não pelas metralhadoras” – Plínio de Arruda Sampaio

[EcoDebate] Celso Galli Coimbra, advogado gaúcho, contestou, em 2003, que “os doadores (de fígado) são pacientes em morte cerebral. Esta situação é sempre irreversível e fatal”. Para tanto, valeu-se de prova técnica neurológica que fundamentou as acusações do caráter homicida do procedimento declaratório de morte encefálica, feitas perante o Ministério Público e Poder Judiciário de São Paulo.

Desde então, todo o procedimento médico que tenha como pressuposto necessário a declaração de morte (encefálica), deverá enfrentar a sustentação jurídica e neurológica da acusação feita, e que é de conhecimento público.

Muitas pessoas são declaradas mortas – quando podiam ser salvas – com o único objetivo de abastecer a indústria de transplantes de órgãos. Declaradas mortas para beneficiar a sobrevivência de umas (e, quem sabe, o bolso de tantas outras).

As pessoas que tiveram morte encefálica podem ter sido vítimas de homicídio? Estamos diante de uma “situação antropofágica”, como relata Dr. Coimbra? Isto é verídico? Será que desejamos, ainda que inconscientemente, a morte de um ser humano para captação de seus órgãos e possível salvação de outro? Por fatores emocionais ou financeiros?

Infelizmente, Dr. Coimbra está certo! A doação de órgãos tornou-se um negócio rentável para vários segmentos da sociedade!

No caso dos portadores do vírus da Hepatite C, é possível, através da medicina preventiva, evitar que a única solução terapêutica, para esses doentes, seja o transplante do fígado?

Claro que sim!!

Temos ao nosso lado, a Constituição Federal que, em seu art. 196, garante “a redução do risco da doença e de outros agravos” e o acesso universal às ações e serviços que promovam, protejam e recuperem a saúde.

Para tanto, a informação correta é fundamental. Ventura Barbeiro, engenheiro agrônomo, credita “parte dos problemas de nosso mundo à falta de informação e conhecimento, ou melhor, à falta do compartilhamento de nosso conhecimento. Acredito que a solução de muitos de nossos problemas está na distribuição do conhecimento. Se temos um grave problema social devido à cruel distribuição de renda de nosso país, entendo que este problema é profundamente agravado pela má distribuição do conhecimento e valores humanos”.

A maioria das modalidades de infecção desta doença pode ser evitada:

– desde 1992, são obrigatórios os testes no sangue utilizado nas transfusões;
– desde meados de 1980, a prevenção médico-hospitalar aderiu ao uso do material descartável; as pistolas de vacinação, por exemplo, desapareceram…;
– o contágio, atualmente, provém do compartilhamento de utensílios para drogas injetáveis ou aspiradas (o vírus, fora do organismo, tem prolongada duração de vida). Os índices de infecção pelo HCV, nos usuários de drogas injetáveis estão, em média, de 4 a 10 vezes acima dos de infecção pelo HIV.

A Proposta do Consenso da Hepatite C, realizado em 2002, pelo Instituto Nacional da Saúde dos EUA, confirmou que a transmissão da Hepatite C acontece, principalmente, por exposição a sangue infectado. Como não existe, ainda, vacina para Hepatite C, deve-se evitar, primordialmente, o contato com esse tipo de sangue:

1. no uso de drogas injetáveis;
2. por transfusão de sangue não testado;
3. nos transplantes de órgãos sólidos provenientes de doadores infectados;
4. em realização de práticas médicas inseguras;
5. em exposição profissional ao sangue infectado;
6. durante o parto de mães infectadas;
7. em pessoas com múltiplos parceiros sexuais e práticas sexuais de alto risco.

A Hepatite C é um mal silencioso! Tem um número 7 vezes superior de infectados (notificados) ao de AIDS. Mas há um universo de pessoas que são portadores do vírus HCV e não sabem. Eu, você… Por quê? Porque a maioria das pessoas infectadas não apresenta sintomas. A maioria dos estudos sobre o tema comprova que as pessoas infectadas souberam de sua doença ao doar sangue ou através de sintomas de dano hepático considerável.

Como a saúde é um direito de todos, seus problemas poderiam ser melhor resolvidos de forma preventiva. Isso afastaria procedimentos de alta complexidade e custo, que promovem o enriquecimento – muitas vezes ilícito – de muitos.

Mas não temos saúde preventiva. Aliás, temos a pior saúde pública do mundo. De quem é a culpa? De todos! Será que conseguimos reverter esse quadro? Não sei. Mas temos alguns bons exemplos:

1. No Brasil, foi implementado, com sucesso, um programa exemplar, relativo à AIDS. Tal programa deveria ser aplicado, também, para detectar infectados do HCV, através do respectivo teste, nos Postos de Saúde, e, se necessário, tratá-los.

2. Alguns municípios brasileiros instituíram programa de prevenção e de tratamento da Hepatite C. E os portadores desta contam com amplo tratamento fornecido pelo SUS.

A única forma de se identificar a Hepatite C é através do teste Anti-HCV. A detecção em tempo hábil evita a cirrose, o câncer e/ou a morte.

Por isso, a melhor campanha de prevenção está na detecção dos infectados para que estes possam tomar medidas preventivas, menos onerosas ao Estado. E esta economia, ao evitar que os danos hepáticos evoluam para a cirrose ou o câncer, deve ser fator de incentivo ao Ministério da Saúde e ao SUS.

Se isso for feito, o transplante de fígado tornar-se-á medida descartável para a cura da Hepatite C.

Ana Echevenguá, advogada ambientalista, coordenadora do programa Eco&Ação, presidente da ong Ambiental Acqua Bios, e- mail: ana@ecoeacao.com.br

[EcoDebate, 03/11/2008]

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