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trabalho escravo: Entre dez libertados do corte de erva mate, cinco são índios

Trabalhadores eram mantidos por meio de dívidas, contraídas na compra de alimentos e ferramentas. Alojamento era irregular e não havia sanitários. Cinco dos dez trabalhadores eram da Terra Indígena Xapecó, em Ipuaçu (SC)

O grupo móvel de fiscalização do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE) libertou dez trabalhadores submetidos à escravidão na Fazenda Vista Alegre, em General Carneiro (PR). Cinco deles tinham migrado de Clevelândia, também no estado do Paraná, e os outros cinco, do povo Kaingang, vinham da Terra Indígena Xapecó, em Ipuaçu (SC). Por Bianca Pyl, da Agência de Notícias Repórter Brasil.

Aliciados por um “gato” – contratador que atua como intermediário dos donos da propriedade – conhecido como Chico, eles eram submetidos a um esquema de endividamento antes mesmo de iniciar o corte de erva-mate. O proprietário mantinha um acordo com o comerciante para o qual os empregados deviam. O “gato” levou os trabalhadores até Ponte Serrada (SC) antes mesmo do início das atividades para que eles próprios adquirissem alimentação e ferramentas.

No final do mês, os trabalhadores “ganhavam uma carona do dono do mercado” para voltar para casa e assim eram obrigados a pagar o que deviam. “Era uma forma de garantir o recebimento mensal dos empregados”, relata Luize Surkamp Neves, auditora fiscal e coordenadora da fiscalização. Os funcionários recebiam por produção e, com os descontos da dívida ilegal, os sálarios ficavam bem abaixo do mínimo – em torno de R$ 120 a R$ 200.

Segundo Gláucio Araújo de Oliveira, procurador do Ministério Público do Trabalho (MPT), o dono da fazenda foi autuado no Art. 149 do Código Penal e deverá responder na Justiça pelo crime de trabalho escravo.

Para chegar até o local, os fiscais fizeram um rastreamento prévio das áreas de cultivo das folhas que são utilizadas para o preparo do chimarrão. “Fomos procurando porque sabemos que as condições de trabalho no corte de erva-mate, geralmente, não respeitam a legislação brasileira”, conta Luize. O grupo móvel chegou no local dia 18 e só encerrou a ação em 26 de setembro.

Os dez libertados estavam no local desde o início do corte de erva-mate, que começou em junho. Todos ficavam alojados em barracas de chão batido só com a cobertura de lonas plásticas. Dois ou três trabalhadores dividiam cada barraca, que também tinha um espaço com fogão.

Os funcionários improvisavam a cama com madeira encontrada na mata e o colchão era do trabalhador, assim como os equipamentos de proteção individual (EPIs) e as ferramentas. O corte de erva-mate exige o uso de botas de proteção, cinto de segurança e capacete porque os trabalhadores sobem na árvore para colher a erva.

No local também não havia instalações sanitárias e os funcionários usavam a água de um rio próximo para beber, tomar banho e preparar as refeições. Faz muito frio na região: a temperatura chega a cair abaixo de zero.

Segundo Luize, o proprietário da fazenda acompanhou a fiscalização e pagou as verbas rescisórias. Foram lavrados 12 autos de infração. Os trabalhadores voltaram para suas cidades de origem e irão receber o seguro-desemprego para trabalhador resgatado

Muitas empresas não cultivam a erva-mate e a compram de locais onde ela é cultivada na forma nativa, como em General Carneiro. O dono da área vende a erva, mas não se responsabiliza pelo corte. “Mas nós entendemos que é de responsabilidade do fazendeiro retirar a erva vendida”, explica Gláucio. O procurador conta que muitas vezes a empresa nem vê a área, ela usa um olheiro para encontrar o local, que também fica responsável por negociar com o fazendeiro e encontrar a mão-de-obra que fará o corte da erva. “Nesse caso, o aliciador era amigo do dono da fazenda. O gato também poderá ter alguma punição criminal, mas não trabalhista”, disse.

Segundo a auditora, essa situação se repete nessa atividade. “No ano passado fizemos um trabalho de fiscalização muito focada no corte de erva mate em Santa Catarina. Aí percebemos que muitas empresas passaram a cortar no Paraná para driblar a fiscalização”, explica.

[EcoDebate, 16/10/2008]

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