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Notícia

Gado e soja no Amazonas têm impacto negativo

Nos meses de janeiro e fevereiro deste ano, o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) registrou 552 pontos de alerta de desmatamento na Amazônia. O número eqüivale a 71% de todos os pontos identificados ao longo de 2007. Apenas em fevereiro, o Sistema de Detecção em Tempo Real (Deter) contabilizou 725 quilômetros quadrados de novas áreas desmatadas. Já no mês de março, segundo dados divulgados no último dia 22 pelo Inpe, o desmatamento caiu 80% em relação ao mês anterior. Por Marina Mezzacappa, do ComCiência, Revista Eletrônica de Jornalismo Científico, SBPC/LABJOR.

Compreender o papel da expansão do cultivo da soja na dinâmica do desmatamento amazônico foi o que motivou a cientista social Elane Conceição de Oliveira a realizar seu mestrado na Universidade Federal do Amazonas (Ufam) no curso de pós-graduação em Ciências do Ambiente e Sustentabilidade na Amazônia. A pesquisadora procurou analisar o padrão de avanço da soja em direção ao sul do estado do Amazonas, especialmente sobre o município de Humaitá, e o seu impacto no desmatamento da região.

A soja começou a ser cultivada no Brasil no início do século XX, na região sul. Posteriormente, o cultivo da monocultura expandiu-se para o centro-oeste do país, avançou pelo norte da região e para o leste de Rondônia, chegando ao sul do Amazonas.

“A principal hipótese do trabalho era que a expansão da fronteira agrícola da soja contribuísse, ainda que indiretamente, para o aumento dos desmatamentos na região amazônica”, explica Oliveira. Segundo ela, a análise dos dados coletados em sua pesquisa comprovou que, de modo geral, a expansão da fronteira agrícola para o sul do Amazonas assumiu um padrão de impacto sobre o meio ambiente, ainda que em proporções baixas em relação a outras regiões analisadas. De acordo com a pesquisadora, o aumento da área plantada de soja reflete diretamente no crescimento no número de focos de calor, ou seja, pontos em que são registradas queimadas.

Dinâmica do desmatamento

Oliveira avalia que o processo de ocupação da Amazônia, realizado a partir da segunda metade do século XX e orientado para o desenvolvimento da região, causou mais impactos sociais, econômicos e ambientais negativos do que positivos. Ela aponta que não apenas a soja, mas também o gado, são componentes importantes da dinâmica do desmatamento na região. “O avanço de uma atividade econômica sem uma política de comando e controle por parte do estado pode trazer conseqüências irreparáveis para a sociedade e para o meio ambiente, como o desmatamento das florestas e o inchaço das cidades”, explica Oliveira.

Segundo ela, a dinâmica do desmatamento na Amazônia passa por fases como a especulação fundiária, a extração madeireira e a utilização das terras para pecuária extensiva de baixa produtividade ou cultivo de grãos (como a soja). Essa dinâmica reflete, em parte, o processo como se deu e como ocorre atualmente o modelo de desenvolvimento da região, com uso intensivo e extensivo dos recursos naturais pelo grande capital. Nesse processo acontece o fenômeno em que as pequenas propriedades são engolidas pelas maiores, isto é, há uma expropriação da terra do pequeno agricultor dando lugar ao grande latifundiário. Além disso, há o inchaço das cidades, já que milhares de trabalhadores dirigem-se à região em busca de oportunidades de emprego.

Para conter esses impactos negativos, a pesquisadora aponta que as políticas públicas para minimizar o avanço da fronteira agrícola sobre a floresta não devem ser orientadas no sentido de extinguir definitivamente as atividades econômicas já consolidadas nos municípios. “Elas devem controlar o uso especulativo do solo como reserva de valor para futuros processos produtivos que potencialmente agridam o meio ambiente”, diz. Uma das medidas importantes nesse sentido seria a valorização da mão-de-obra do pequeno produtor familiar. “O pequeno agricultor, sem crédito e sem meios de transporte para escoar sua produção, acaba vendendo suas terras para o grande capital”, explica.

Outras medidas elencadas pela pesquisadora para frear o desmatamento resultante do avanço da fronteira agrícola são a realização de um zoneamento ecológico-econômico estratégico; a identificação das áreas já degradadas para realização de reflorestamento; a inibição de assentamentos improdutivos; a identificação das áreas propícias à agricultura para desenvolvimento de um sistema de cultivo que maneje o solo de maneira sustentável; e a identificação e conscientização dos principais atores envolvidos na especulação de terra (muitas vezes pública) e no uso desordenado do solo. “Deve-se também incentivar processos produtivos que aproveitem as potencialidades do sul do Amazonas, como o açaí e a mamona”, conclui.

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