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Artigo

Certificando o Etanol, por Ana Echevenguá

[EcoDebate] O sistema energético atual faliu! O mundo está em busca de fontes alternativas e/ou substitutivas do petróleo, tanto pela sua escassez como pela poluição que ele e seus derivados provocam.

O Brasil já possui um mercado interno consolidado para o etanol já que o utiliza desde a década de 20. Com o Proálcool, implementado em escala comercial no final dos anos 70, foi pioneiro em substituir a gasolina, na crise do petróleo. Desde então, o álcool da cana é usado como combustível no País de duas maneiras: como álcool etílico hidratado carburante, em carros 100% movidos a álcool, ou como álcool anidro, adicionado à gasolina.

A partir de julho de 2007, ocorrerá o aumento de 23% para 25% na mistura de álcool anidro na gasolina. Ordens do governo a pedido das usinas que estão se sentindo prejudicadas com a queda de 30% nos preços do combustível. Este aumento de percentual de álcool acarreta uma demanda adicional de 400 milhões de litros/ano. E não vai influir negativamente nas exportações porque, hoje, o Brasil conta com um excedente de 4 bilhões entre o que produz e o que consome internamente.

Dos vários países produtores, o Brasil foi o primeiro a ter uma Bolsa com contrato futuro do etanol (BM&F), condição essencial para que se tenha referência de preços, como ocorre com as demais“commodities”1.

Lá fora, o Brasil tem mantido boas relações com a Índia, a China e a União Européia. O maior comprador ainda é o mercado americano. Mas é necessário abrir novos mercados que não apresentem tantas barreiras e entraves ao nosso produto. Afinal, os americanos estão sempre exigindo mais vantagens pecuniárias além das que hoje lhe são concedidas,

E o mercado europeu?

A União Européia decidiu estimular a geração de combustível renovável para contribuir com a redução do efeito estufa. Pretende que 10% de sua frota de carros, até 2020, estejam utilizando etanol.

Ela sabe que precisará importar o etanol para não afetar a sua produção de alimentos. Alguns países do bloco (Luxemburgo, Malta e os países bálticos, por exemplo) terão dificuldades para atingir a meta e deverão importar 100% do etanol que consumirem. A Espanha, ao contrário, já é uma das líderes européias na produção de biocombustível.

Para tanto, a UE estuda a possibilidade de exigir que os exportadores de biocombustíveis certifiquem a sustentabilidade ambiental de seu produto. Sem certificação, o biocombustível não será comercializado no mercado europeu. A regra será aplicada tanto aos produtores dos 27 países da Europa como aos produtores estrangeiros.

Tudo isso por quê?

1. Porque a sociedade civil organizada européia, há tempos, alerta que o uso do etanol, apesar de sua contribuição ao resfriamento global, pode provocar impactos negativos ao meio ambiente e à produção de alimentos.

2. Porque a União Européia já exige certificação na importação de madeira. Os exportadores de países tropicais precisam, hoje, provar que a exploração é sustentável e que o meio ambiente está sendo preservado.

Será preciso conferir se a certificação ambiental a ser exigida terá critérios concretos sobre a sustentabilidade socioambiental sob pena de ser tratada como uma barreira protecionista. O Engenheiro Thomas Fendel já deu seu parecer a respeito do assunto: “Isso é mais um jeito de avacalhar com a produção e comercialização do pequeno produtor. Nunca vi uma certificação socioambiental para o porcotróleo, muito mais sujo e concentrador de renda para poucos ladrões…”.

Empresas certificadoras

Já que a certificação para atestar a qualidade do etanol, o desenvolvimento de novas tecnologias e estratégias serão exigências do mercado global de biocombustível, várias empresas deverão investir neste filão de mercado.

O INMETRO – Instituto Nacional de Metrologia, Normalização e Qualidade Industrial – desde 2003, já aventa a possibilidade de trabalhar com a certificação do etanol, em parceria com o NIST (National Institute of Standards and Technology).

A ‘Triplo A – Normas’, de Londrina-PR, declarou estar apta para a primeira Certificação Internacional do Etanol no mundo. A empresa desenvolveu um programa que analisa simultaneamente os aspectos técnicos, sanitários, sociais, ambientais e administrativos em todos os elos da cadeia produtiva da cana-de-açúcar (propriedade, usinas, transporte, distribuição, postos de combustíveis).

Será que o etanol brasileiro está apto a atender aos requisitos estabelecidos no processo de certificação? Não sei.

Historicamente, a indústria da cana se baseia no latifúndio, na superexploração da mão-de-obra (inclusive no trabalho escravo). Segundo a UNESP, 200 mil migrantes vivem, durante os 08 meses da colheita de cana, em São Paulo, em condições degradantes.

O Brasil tem, hoje, cerca de 5 milhões de hectares de cana-de-açúcar plantados (75% em São Paulo). Da área total cultivada, 80% é queimada durante os 06 meses de pré-colheita, ou seja, 4 milhões de hectares. Esta queima provoca:

– problemas ao meio ambiente devido à formação de gases poluentes e contribuintes do efeito estufa;

– prejuízos à saúde dos seres vivos: além das implicações respiratórias, os poluentes afetam diversos órgãos do organismo.

Não obstante, o setor sucroalcooleiro está entre os 05 mais representativos na dívida ativa da União, concentrando grandes devedores, segundo o procurador-geral-adjunto da Fazenda Nacional, Agostinho Netto. A dívida ativa, hoje, soma R$ 600 bilhões. Isto é apropriação de recursos públicos.

Mas, apesar desse quadro nebuloso, os usineiros são alvo de elogios. Segundo o Presidente Lula, “Os usineiros, que até dez anos atrás eram tidos como bandidos do agronegócio deste país, estão virando heróis nacionais e mundiais porque todo mundo está de olho no álcool, porque tem política séria, porque, quando a gente quer ganhar o mercado externo, temos de ser mais sérios”.

1 – Commodity: palavra inglesa que significa mercadoria. Mas no mercado financeiro é utilizado para indicar um tipo de produto, geralmente agrícola ou mineral, de grande importância econômica internacional porque é amplamente negociado entre importadores e exportadores. Existem bolsas de valores específicas para negociar commodity. Alguns exemplos de commodity seriam: café, algodão, soja, cobre, petróleo etc… Tipos de commodity: agrícola. Ex. café; mineral. Ex. ouro; financeira. Ex. dólar; ambiental. Ex. água, petróleo. Fonte: http://pt.wikipedia.org/wiki/Commodity

Ana Echevenguá, advogada ambientalista, coordenadora do programa televisivo Eco&Ação, email: ana@ecoeacao.com.br

in www.EcoDebate.com.br – 21/06/2007

Nota do EcoDebate

Ana Echevenguá é colaboradora e articulista do EcoDebate. O Eco&Ação – Ecologia e Responsabilidade [ http://www.ecoeacao.com.br/ ] e o EcoDebate são parceiros estratégicos, somando esforços na socialização da informação sócio-ambiental, compartilhando conteúdos e divulgado informações de suma importância para a defesa e preservação do meio ambiente.