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Salmão, piracema e vida, artigo de Roberto Naime

 

Salmões. Foto: Peter Essick / National Geographic

 

[EcoDebate] Por aqui, os principais protagonistas dos eventos de piracema podem ser e são os peixes de água doce. Um dos principais problemas das barragens quer sejam de geração energética ou de outra finalidade, está em se compatibilizar com os eventos anuais de piracema nos rios. Mas existe uma efeméride natural que merece abordagem. É a piracema executada pelo salmão do Pacífico, que se torna o centro de uma cadeia alimentar que chega a envolver mais de 200 espécies, particularmente animais, mas também recicla nutrientes, se tornando essencial também para os solos e a flora das regiões.

As espécies de salmão atlânticas também fazem este movimento de retorno ao local que nasceram para desova, mas não encerram seu ciclo de vida e, portanto, o que ocorre no Pacífico, particularmente nas regiões da Colúmbia Britânica até o Alaska é inédito, e documentário da BBC registra que é um processo único no planeta. Se diria original, único, envolvente e empolgante.

As espécies de salmão consumidas no mercado brasileiro provêm em geral de fazendas de cultivo no Chile e os ambientalistas criticam muito estes sítios, acusando variados impactos ambientais que podem produzir ou produzem. Também a cor da carne, que depende da alimentação, tem coloração rosada mais fraca do que dos salmões naturais do hemisfério norte, sejam pacíficos ou atlânticos.

Existem 5 espécies de salmão envolvidas neste evento. O chamado salmão rosa, o salmão vermelho, o salmão prateado, e os tipos denominados real e selvagem. Não se observa diferença entre o comportamento dos vários tipos. Estas espécies vivem nas águas frias do oceâno Pacífico, e uma vez na vida, em torno dos 4 anos, retornam até aos rios que nasceram e que desaguam no oceano desde a região mais norte do continente americano, e sobem estes rios para praticarem a desova num fenômeno que entre nós é conhecido por piracema mas envolve somente peixes que já vivem em rios nos quais vão subir até as nascentes para praticar a desova.

O documentário registra que recentemente se descobriu a presença de nódulos ferríferos no cérebro destes peixes que possibilita que se orientem sobre a latitude da terra e busquem exercer a desova exatamente nos mesmos cursos de água que nasceram. Outra característica notável desta espécie, e também fruto de evolução da espécie dentro de uma concepção darwiniana, é a capacidade que estes peixes tem de enfrentarem fortes correntezas e transformarem tais eventos em fatores favoráveis, utilizando a cauda como se fossem velas.

Não se sabe porque, ao contrário dos salmões atlânticos, as espécies pacíficas fazem desta efeméride da desova, sua última atividade de vida. Durante seu percurso desde o oceâno Pacífico até os rios onde, em alguns casos sobem centenas de quilômetros, se tornam elos importantes da interminável cadeia alimentar, servindo de fonte protéica para os ursos cinzentos, recém-despertos de hibernação, espécimes de gaviões e até mesmo lobos.

Como são milhares de peixes, sobram centenas de espécimes para cada indivíduo que é capturado por qualquer de seus predadores. Até reproduzirem nas regiões de cascalheiras onde nasceram. Cada indivíduo produz milhares ou milhões de ovos, que também vão servir para alimentação de aves, sem prejuízo para a reprodução da espécie.

Ao final, as carcaças que não se encontram em condições de serem consumidas por nenhuma espécie predadora, quando ao final do ciclo reprodutivo perecem exaustos, permite uma grande ciclagem de nutrientes na floresta. As carcaças são removidas pelos banquetes dos predadores e acabam alimentando de nutrientes os solos e as espécies vegetais. Cerca de 80% do Nitrogênio existente em florestas tropicais temperadas acaba sendo proveniente de fontes marinhas. Integram a reciclagem também o carbono e potássio e certamente o elemento fosfato, ainda que em menor quantidade.

A biodiversidade nas florestas tropicais temperadas é muito grande e importante, sendo ainda maior que nas florestas meramente tropicais. De qualquer forma é uma efeméride natural, ou um grande evento de vida que deve ser destacada e cuja importância e todas as relações ambientais são de difícil identificação e descrição. E só comprovam a complexidade que os ecossistemas podem assumir em condições normais ou até mesmo em situações extremas.

A saga dos indivíduos, sendo que vários deles irão parecer antes de atingir seu desiderato, embora vários ou a maioria atinja seus objetivos, guarda uma certa analogia ou celebração de vida com o cotidiano humano, mesmo que em outros contextos que não sejam especificamente naturais. Durante toda vida, se praticam decisões ou desafios que acabam determinando se existirá a possibilidade de atingir os objetivos de vida e as expectativas de cada indivíduo.

Portanto não se deve e nem se pode reduzir as análises ambientais a meros esquemas cartesianos. É necessário reconhecer a complexidade natural e buscar de forma permanente compatibilização com parâmetros de vida que almejem sustentabilidade e possibilitem continua melhoria das condições ambientais e da qualidade de vida de todos os entes envolvidos nesta mesma jornada.

Dr. Roberto Naime, Colunista do Portal EcoDebate, é Doutor em Geologia Ambiental. Integrante do corpo Docente do Mestrado e Doutorado em Qualidade Ambiental da Universidade Feevale.

Publicado no Portal EcoDebate, 16/04/2015

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