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Artigo

A sustentabilidade dos mananciais e a ética do uso da água, artigo de Roberto Malvezzi (Gogó)

 

seca

 

[EcoDebate] Quando a lei brasileira de recursos hídricos 9.433/97 incorporou em seu texto o uso prioritário da água para consumo humano e a dessedentação dos animais (Art. 10, Inc. III), ela estava assimilando uma escala de valores. Quando falamos em valores – e numa hierarquia de valores -, então estamos falando de ética.

Esses princípios já existiam a partir de uma reflexão global (Princípios de Dublin), quando setores da humanidade deram-se conta que estávamos mergulhando numa crise da água. Ela faz parte de uma crise civilizacional maior, que sobre usa os bens naturais acima do que a natureza pode oferecer, ou num ritmo mais veloz do que ela é capaz de repor. É o que se chama de insustentabilidade.

Mas, há um vácuo na ética da água no Brasil. Não existe na lei brasileira de recursos hídricos nenhum parágrafo que normatize o cuidado com os mananciais, a não ser um princípio geral da referida lei que afirma ser necessária a gestão dos recursos hídricos integrada à gestão ambiental (Art. 30, Inc. III).

Em 2004, quando a Campanha da Fraternidade da CNBB questionou esse vazio, a resposta das autoridades é que essa dimensão estava implícita em outras leis ambientais, sobretudo no Código Florestal. Porém, o Código foi modificado.

Sem a vegetação, a penetração da água que forma os lençóis freáticos se reduz de 60% para 20%. Sabemos que é o rio aéreo da Amazônia que abastece todo sul e sudeste brasileiros, dependendo da evapotranspiração da floresta. Entretanto, quem pretende ter água nessa região, tem que respeitar também os parâmetros ecológicos locais para que ela esteja ao alcance. Logo, a compra de áreas de preservação na Amazônia em troca do desmatamento em nível local não soluciona o problema da recarga dos aquíferos. É preciso preservar a Amazônia e a vegetação local.

Os dois principais programas do governo federal para a água são no sentido de expandir o consumo. O Água para Todos visa realizar o valor primordial no uso da água que é o abastecimento humano. O Oferta de Água visa expandir seu uso econômico. Temos ainda investimentos pelo PAC em abastecimento humano, com o objetivo de ampliar os serviços de saneamento básico. Entretanto, não temos nenhum programa relevante em termos de proteção dos mananciais.

Sem uma visão sistêmica do ciclo das águas e sem uma ética do uso da água que implique o cuidado dos mananciais, comprometeremos sempre mais o abastecimento humano, a dessedentação dos animais e os demais usos.

O óbvio ulula diante de nossos olhos.

Roberto Malvezzi (Gogó), Articulista do Portal EcoDebate, possui formação em Filosofia, Teologia e Estudos Sociais. Atua na Equipe CPP/CPT do São Francisco.

Publicado no Portal EcoDebate, 21/01/2015

[cite]


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Alexa

One thought on “A sustentabilidade dos mananciais e a ética do uso da água, artigo de Roberto Malvezzi (Gogó)

  • O crescimento infinito em um planeta de dimensões e condições limitadas, só a insensatez do lucro poderia pensar.

    A crise hídrica – não somente no Brasil, mas a nível planetário – é promovida por dois fatores principais:

    1) destruição, para fins econômicos, das condições ambientais necessárias para ocorrência de chuvas em todas as regiões do planeta Terra, segundo as características naturais de cada uma delas, e das condições de armazenamento superficial e subterrânea, e da pureza da água;

    2) consumo excessivo para abastecimento da população humana e para a produção de alimentos, tanto para uso interno, quanto para exportação.

    Outros fatores que causam calamidades são os cortes feitos nas encostas, sem utilização de técnicas apropriadas, e a pavimentação do solo de grandes áreas povoadas por seres humanos, que além de causar calamidades, não permite que as águas se infiltrem e formem regiões alagadas, o que muito beneficiaria o meio ambiente e favoreceria o surgimento de muitos seres vivos, animais e vegetais, que contribuiriam para a alimentação da população humana, se não fosse grande demais, e para o equilíbrio ambiental e do ciclo hídrico.
    Para complicar um pouco mais, os aglomerados urbanos quase sempre são localizados nas áreas apropriadas para serem ocupadas pelas águas.

    Se se pretende pensar em soluções para esse problema – crise hídrica planetária – cujas consequências já são graves, e hão de muito mais graves se tornarem, deve-se iniciar, a nível planetário, com um rigoroso programa de controle de natalidade humana, objetivando reduzir, no menor espaço de tempo possível, a população humana do planeta Terra a um total equivalente a 10% da população atual.

    Junto com essa medida inicial, deve-se promover a desocupação das áreas a serem ocupadas pelas águas pluviais, e cessar todas as atividades que comprometam as águas, as florestas, as terras e o ar.

    Em síntese, seria uma grande revolução, que desbancaria o capitalismo e constituiria uma sociedade planetária socialista, no sentido mais puro da palavra.

    Se não vemos possibilidade de que tal proposta seja realizada, devemos nos preparar para crises – econômicas, políticas e ambientais – cada vez mais amplas, as quais nos levarão ao colapso.

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