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Artigo

Palma Forrageira: um adensamento providencial, artigo de João Suassuna

 

[EcoDebate] As espécies Opuntia fícus indica e Nopalea cochenilifera representam, botanicamente, as variedades, Palma Gigante e a Miúda, respectivamente. Essas xerófilas vêm salvando a pecuária do Semiárido nordestino, quando da ocorrência das secas que assolam a região. No início dos anos 2000, o ex-deputado pernambucano, Ricardo Fiúza, preocupado com a alimentação da pecuária do Estado de Pernambuco, viajou para o México e Estados Unidos, para conhecer, naqueles países, a produção de Palma Forrageira plantada de forma adensada. O parlamentar queria encontrar formas de potencializar, em volumes, a comida dos grandes ruminantes em Pernambuco, principalmente os criados em regime de confinamento.

Levou consigo nessa viagem, o engenheiro agrônomo Paulo Suassuna e o zootecnista Alberto Suassuna, que já vinham trabalhando com a cultura da Palma no Nordeste seco. A viagem foi revestida de grande êxito, pois veio a capacitar os referidos técnicos, em uma nova forma de plantar a distinta xerófila no Semiárido brasileiro. Paulo e Alberto ao regressarem ao Brasil, conseguiram localizar e adaptar, para as condições semiáridas nordestinas, todo o processo de plantio adensado que haviam observado no exterior e alcançar, nos plantios brasileiros, as produtividades que estavam sendo obtidas no estrangeiro. Na ocasião, a Palma alcançava, no Nordeste, uma produtividade média em torno de 50 toneladas por hectare, e passou a produzir, adotando-se as novas técnicas de plantio, cerca de 400 toneladas/ha. Um ganho volumétrico fantástico, se levada em consideração a importância da cactácea no arraçoamento dos animais em períodos de estiagem.

Absorvidas as novas técnicas de plantio, os técnicos passaram a localizá-las e adaptá-las à região semiárida brasileira, iniciando suas ações no sertão do Estado de Pernambuco, o qual passou a produzir a cactácea em quantidades suficientes, enchendo de alegria os produtores rurais, ao verem, em um único hectare de suas propriedades, o plantio alcançar cerca de 400 toneladas, volume de biomassa suficiente para alimentar, por exemplo, e de forma sustentável, 200 carneiros. Um fato inédito, que veio a contribuir para a solução das mazelas trazidas pelas secas recorrentes no semiárido pernambucano.

No desenrolar dos trabalhos em Pernambuco, no entanto, algo curioso e inédito ocorreu: as autoridades responsáveis pelo setor agropecuário do Estado foram, gradativamente, perdendo o interesse pela nova técnica de plantio da Palma Forrageira. Uma atitude sugestiva de inveja começou a surgir entre os dirigentes pernambucanos desse setor, que viam na projeção dos técnicos, nos noticiários televisivos do País, difundindo a nova tecnologia de plantio, um complicador para a divulgação de suas imagens (dos dirigentes), como reais responsáveis pelo aumento da produtividade da cultura da Palma no Estado de Pernambuco. Passaram a fugir da Palma, como o diabo foge da cruz. A partir daí, o agrônomo Paulo Suassuna não teve mais espaços de trabalho nesse Estado, seguindo sua vida à procura de outras regiões áridas do Nordeste que tivessem interesse em absorver sua nova técnica de plantio, o mesmo ocorrendo com o zootecnista Alberto Suassuna.

Após o fiasco político havido nas ações de adensamento da cactácea em Pernambuco, Paulo Suassuna procedeu a igual investida no Estado da Paraíba, onde apresentou seu projeto para as autoridades locais, obtendo boa receptividade. Após ter implantado alguns projetos adensados, com o igual êxito obtido em Pernambuco, para surpresa do técnico, idêntico fato de inveja, das autoridades, voltou a ocorrer. A Paraíba também não apoiou os esforços do Agrônomo, na sua luta incansável de demonstração da viabilidade de plantio da Palma adensada, como sistema salvador da pecuária nordestina. Um fato político triste e realmente lamentável para a pecuária paraibana, e por que não dizer da pecuária do Nordeste como um todo.

Mas as notícias de sucesso dessa nova técnica de plantio adensado da Palma, oriundas das experiências havidas nos estados da Paraíba e de Pernambuco, embora tenham ocorrido em curto espaço de tempo, começaram a circular e a despertar o interesse de outras regiões secas do Nordeste. Paulo Suassuna começou, então, a cumprir uma extensa agenda de palestras e viagens, no país e no exterior, difundindo a nova técnica de plantio da cultura por ele localizada e adaptada. Dessa feita, o Estado de Sergipe, através do Sebrae local, convidou o agrônomo para uma apresentação em Aracaju. A explanação do técnico foi revestida de sucesso absoluto. Paulo Suassuna optou, então por residir naquele Estado que carinhosamente o acolheu, passando a elaborar planos e metas para a difusão da forrageira, dessa feita na região semiárida sergipana.

Com esse gesto de acolhimento técnico, as autoridades do setor agropecuário de Sergipe demonstraram uma forma de tratamento completamente diverso daquelas demonstradas pelos estados da Paraíba e de Pernambuco. Não faltaram ao agrônomo, o respaldo e o incentivo institucionais necessários aos trabalhos desenvolvidos no campo. Tanto isso é verdade, que os índices de produtividade, no Estado de Sergipe, alcançaram os valores mais elevados do planeta. Para se ter ideia desse fato, o Rancho Flora, no município de Canindé do São Francisco (SE), pertencente a Magno José de Melo (Nininho das Cabras), tornou-se o campeão mundial em termos de produtividade com a referida cultura, chegando a alcançar 732 toneladas em um único hectare. Um ganho fantástico, que bem exemplifica os cuidados adotados pelo produtor, que soube absorver, com a devida maestria, os novos ensinamentos técnicos, através dos indispensáveis apoios institucionais proporcionados pelo Sebrae-SE.

Atualmente, Paulo Suassuna está desenvolvendo vários projetos em Sergipe, com previsão, até 2020, de continuar obtendo produtividades, nos plantios adensados, superiores a 400 toneladas/ha.

A Cochonilha do Carmim

Um fato digno de nota, nesse relato, diz respeito aos ataques severos da Cochonilha do Carmim (Dactylopius coccus), realizados nos palmais da região Setentrional nordestina. Esse inseto, praticamente aniquilou os palmais da região, trazendo prejuízos e desespero ao produtor, bem como uma nova realidade para ao setor agropecuário regional: juntamente com o fenômeno recorrente das secas, o ataque da Cochonilha do Carmim trouxe o perigo da inviabilização da criação do gado bovino nos limites do Nordeste seco.

No Semiárido sergipano, os problemas de ataques de cochonilhas existem, mas com outra espécie do inseto. Em Sergipe, os ataques, realizados pela Cochonilha de Escamas (Diaspis echinocacti), quando comparados aos da Cochonilha do Carmim, são menos danosos para os palmais. Em tais caso, os controles desses insetos não mais fáceis de serem realizados, tornando-se uma praga com reais possibilidades de convivência, sem a preocupação com a severidade dos danos causados pela Cochonilha do Carmim.

As dificuldades atuais de se combater o inseto por vias químicas (uso de defensivos), motivou Paulo Suassuna, à implantação, acompanhado de um sócio (pessoa física), no município de Juazeirinho (PB), zona de ocorrência da Cochonilha do Carmim, do maior banco de germoplasma da cultura da Palma do país. São 160 variedades que estão sendo testadas e observadas, para se saber de suas resistências aos ataques desses insetos. Essa experiência está se revestindo de grande êxito, tendo em vista ser, a variedade resistente, uma das poucas alternativas de solução que se tem atualmente encontrado para esse grave problema, tendo em vista a proibição, pelo Ministério da Agricultura, do uso de defensivos agrícolas, nos ataques verificados na cultura da Palma Forrageira no Semiárido nordestino.

Novos Projetos de plantios adensados

Os ciclos secos que o Nordeste brasileiro vem apresentando (2011, 2012, 2013 e parte de 2014 foram secos), com os ataques severos da Cochonilha do Carmim, foram fatores que resultaram em panoramas sombrios para a agropecuária regional. Estima-se, por exemplo, que a pecuária paraibana, em 2013, tenha sofrido uma diminuição em cerca de 70% do efetivo dos animais, devido à morte por inanição (fome e sede), ou mesmo pela venda destes, antes de sucumbirem ao flagelo. Para a reversão desse quadro, as novas técnicas de plantio da Palma, bem como a identificação de variedades resistentes ao ataque da Cochonilha, poderão se traduzir em soluções promissoras e bem-vindas.

Recentemente, em visita à região dos Cariris Velhos da Paraíba, especificamente no município de Taperoá, tive o privilégio de conhecer um trabalho de adensamento de Palma Forrageira (Opuntia) implantado na fazenda Pau Leite, de propriedade de Manelito Dantas Vilar. Foram plantados 4,2 ha de palma, para a obtenção de material (sementes) necessário à expansão da cultura em uma área de plantio adensado, de cerca de 30 ha. A ideia, nessa nova área, é a de possibilitar a criação, de forma sustentável, de cerca de 1000 cabeças de gado bovino em regime de lactação. Uma meta com possibilidades reais de ser atingida, que poderá fazer com que, uma única propriedade paraibana, venha a dar o exemplo de que é possível reverter o quadro sombrio no qual se encontra a Agropecuária do Estado, bastando, para tanto, o uso das técnicas adequadas de convivência com as secas, que estão atualmente em vigor, sendo uma delas o plantio adensado da palma forrageira.

Alguns aspectos técnicos (com fotos) do plantio de Palma Forrageira da fazenda Pau Leite:

palma forrageira

Por ser uma área plantada (4,2 ha), com vistas à obtenção de sementes (raquetes), para a ampliação de futuras áreas, o plantio foi realizado fazendo-se o uso da irrigação por aspersão.

palma forrageira

Para o plantio, as raquetes das palmas foram subdivididas em 110.000 pequenos retângulos (propágulos), número suficiente para se plantar 1 ha, adotando-se a nova técnica de adensamento.

palma forrageira

Devido à grande competição reinante no plantio adensado, foram feitas as análises de solos antes do plantio, com vistas a se proceder a correta e necessária adubação da área.

palma forrageira

O método de plantio adensado, em regime de sequeiro, foi orçado, na fazenda Pau Leite, em cerca de R$ 13 mil o hectare. Como a área está sendo irrigada, o custo do plantio, nessas condições, subiu para R$ 15 mil/ha.

Como a área do Pau Leite é susceptível aos ataques severos da Cochonilha do Carmim, e a variedade da cultura escolhida para o plantio (Opuntia) é igualmente susceptível a esses ataques, os técnicos responsáveis pelo palmal, optaram pela articulação constante com os centros de pesquisas da Paraíba, bem como as universidades locais, no sentido de obterem informações que venham proporcionar a condução da cultura da Palma de forma a mais segura possível, e dentro dos parâmetros esperados para o alcance dos objetivos.

Recife, 30/05/2014

Sobre o assunto:

TECNOLOGIA DO CULTIVO INTENSIVO DA PALMA: um projeto promissor

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* João Suassuna – Eng° Agrônomo e Pesquisador da Fundação Joaquim Nabuco

 

EcoDebate, 03/06/2014


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