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Artigo

Entre Cegos e Banguelos, artigo de Daniel Clemente

 

artigo

[EcoDebate] No inicio de fevereiro de 2014, um adolescente de 15 anos que praticava pequenos furtos e delitos na zona sul da Cidade do Rio de Janeiro, foi espancado e amarrado a um poste com uma tranca de bicicleta, cerca de trinta pessoas participaram deste julgamento e punição extrajudicial. A repórter do SBT Rachel Sheherazade fez coro e aplausos aos ditos justiceiros, dizendo ser compreensível a atitude frente ao Estado ineficaz. Porém pediu compreensão ao cantor Justin Bieber: “Peguem leve com o Justin, o garoto só está crescendo”. Em sua turnê pelo Brasil, Bieber cuspiu em fãs, pichou muro, saiu com garotas de programa e participou de rachas automotivos.

A audiência e a glorificação aos justiceiros anônimos repercutiu em todo o território nacional, e na Cidade do Guarujá, no litoral paulista, o linchamento levou a execução de uma mulher de 33 anos, acusada de sequestrar crianças para utilizá-las em rituais de magia negra. A polícia militar alega que não existem provas sobre a veracidade deste boato provocado pelo noticioso “Guarujá Alerta” em sua página no facebook. O Jornal Folha de São Paulo em sua edição on-line abre espaço para que seus leitores opinem diante dos fatos, e assim fez um anônimo: O justo seria que, quem cometeu o crime sofresse uma punição idêntica. Às vezes a civilidade é um saco”.

E os casos dos novos justiceiros se repetem, em Maricá, no litoral do Rio de Janeiro, um homem de 22 anos, usuário de drogas, acusado de praticar roubos na região foi agredido e amarrado ao poste com cordas e cintos. Uma voz sem rosto se fez presente quando a polícia militar chegou ao local: “Tem que matar os marginais, só assim essa praga será exterminada”.

Diante de um Estado de Direito feito para não funcionar, a população arrisca-se na atribuição destinada aos seus representantes, e as tragédias do cotidiano passam a funcionar como um grito de justiça. Vivendo a era da informação, a distorção dos valores leva a opinião pública a retroceder no censo de justiça, punições movidas por populares motivadas pela estagnação do poder público está criando brumas frente ao verdadeiro problema nacional, o da falência da democracia representativa, desmoralizada pela inoperância e corrupção.

Saques aos cofres governamentais, impostos surreais, a política atuando com representantes de interesses particulares e políticos impunes em meio á corrupção. Porém os responsáveis por estes fatos não são amarrados ao poste, nem chicoteados com fiação elétrica, não são espancados por multidões, estão imunes pela mesma sociedade que está barbarizando em seus métodos. O voto legitima a falta de democracia participativa e amordaça o justiceiro, que pretende vingar a injustiça nos efeitos e não nas causas.

Estamos diante de uma causa perdida? Não, talvez não. Não é necessário encontrar uma solução, mas descobrir novos métodos sociais para a construção de uma sociedade mais justa.

Daniel Clemente é Professor de História, Sociologia e Filosofia do Colégio Adventista de Santos

 

EcoDebate, 15/05/2014


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2 thoughts on “Entre Cegos e Banguelos, artigo de Daniel Clemente

  • Debora Wanderley

    O que estamos assistindo não é justiça é vingança insana nos moldes medievais. A mulher que foi torturada e morta no Guarujá foi chamada de bruxa. Foi assassinada por uma turba enlouquecida que acreditou naquilo que estava propensa a acreditar sem qualquer direito de defesa da vítima. Magia negra, bruxa, povos amaldiçoados são exortações que pareciam enterradas na historia passada, na chamada idade das trevas, e que hoje estão renascendo no Brasil.

  • Vejo tudo isso com indignação total. Entretanto o “discurso elegante” a nada nos levará. Tudo está absolutamente claro, para mim, é lógico. Vivemos um momento desordenado na militança brasileira, em que a justeza de pensamento e de procedimento parece nada valer a pena, eis que aqueles que deveriam projetar condutas exemplares fazem exatamente o contrário e ficam “muito bem sucedidos” aos olhos de todos. Casuisticamente alguns poucos cidadãos revoltados fizeram-se parecer “justiceiros”, numa conotação clara de que o Estado perde toda a autoridade em vista de sua inoperância. Na verdade os (des)governantes que o povo pusemos no Planalto mostra a que vieram, o que pretendem com a bagunça ideológica que pretendem impor aos brasileiros. Rachel Sheherazade nada tem a ver com essa estória, salvo pelo comentário óbvio que fez em decorrência de seu munus profissional e público, corajosamente. Abriu-nos os olhos com sua franqueza. De resto, se Deus nos ajudar e a Copa não atrapalhar, precisamos mudar os governantes, trocando os que lá estão por outros, ainda que “menos piores”, a fim de que a esperança popular, a moral administrativa, a autoridade de Governo e de Estado retornem para realimentar a fé do brasileiro em si mesmo. Do contrário, salvem-se quem puder e quem conseguir não se tornar vítima dos ideólogos de esquerda exacerbada que estão atravancando a sociedade brasileira. Que Deus não desista de ser brasileiro como sempre foi!!!

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