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COP 15: Por que um fracasso em Copenhague seria um sucesso, artigo de Bjørn Lomborg

Poluição do ar em cidade chinesa
Poluição do ar em cidade chinesa. Foto da AFP

* Os políticos desperdiçaram quase 20 anos sem fazer qualquer progresso significativo na nossa tentativa bem intencionada, mas irrealista, de reduzir as emissões de carbono. Não temos mais tempo a perder com uma resposta criticamente inadequada ao aquecimento global *

[Der Spiegel] Os piores temores de vários delegados presentes nas negociações climáticas de Copenhague já se materializaram: ficou evidente que a tentativa oficial de substituir o Protocolo de Kyoto não resultará em um plano concreto para a redução de emissões de carbono.

Frustrados ativistas ambientais já estão se preparando para desenrolar as suas faixas de protesto, e os políticos procuram encontrar uma forma meio digna de declararem que a conferência foi um sucesso. Entretanto, nem manifestações nem um acordo político sem significado representarão uma vitória sobre o aquecimento global.

Ainda seria possível obter um resultado positivo deste fracasso da reunião, mais isto só aconteceria se os governantes admitissem os motivos pelos quais um acordo para a redução drástica e de curto prazo das emissões de carbono tem se mostrado elusivo, e passassem a cogitar opções mais inteligentes.

No decorrer dos últimos dez anos vem sendo travada uma discussão acalorada entre aqueles que negam a existência do aquecimento global e os que estão profundamente alarmados pelo início deste fenômeno. Em certos momentos, a retórica de ambos os lados mostrou-se exagerada. O aquecimento global é real e ele é causado pela humanidade. Isto está bem claro há muito tempo. Mas é também óbvio que nós não conseguimos adotar as políticas que fariam frente a este desafio da melhor forma possível.

Muitas vezes alega-se que nós poderíamos deter facilmente o aquecimento por meio de reduções das emissões de carbono, se os políticos demonstrassem vontade para isso. Na verdade, vontade política é a menor das nossas preocupações. Esta abordagem política – que temos adotado durante quase 20 anos – tem deficiências críticas. Ela é economicamente deficiente porque os impostos de carbono de curto prazo custarão uma fortuna e terão poucos resultados. Ela é politicamente deficiente, porque as negociações para a redução de emissões de dióxido de carbono tornar-se-ão ainda mais pesadas e divisivas para os protagonistas na Europa, na América e na Ásia. E ela é tecnologicamente deficiente por não garantir que as energias alternativas estejam prontas para fazer com que deixemos de depender do carbono.

O primeiro desses desafios fica óbvio ao examinarmos o plano das principais nações industrializadas – o Grupo dos Oito (G-8) – no sentido de utilizar a redução de emissões de carbono para limitar o aquecimento global a não mais do que dois graus centígrados acima dos níveis pré-industriais. Esta seria a política pública mais cara da história. Em um estudo para o Centro de Consenso de Copenhague, o iminente economista climático Richard Tol – um importante membro contribuinte dos grupos de trabalho do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas – demonstrou que, para se atingir a meta almejada, seria necessária a adoção de um imposto alto e global sobre as emissões de dióxido de carbono, com um custo mínimo de 45 euros (R$ 115) por tonelada.

A redução das emissões de dióxido de carbono custará mais do que o aquecimento global

Com base em estimativas convencionais, esse programa ambicioso reverteria grande parte dos danos provocados pelo aquecimento global, que deverão custar cerca de dois trilhões de euros (R$ 5,13 trilhões) por ano até 2100. No entanto, Tol concluiu que um imposto desta magnitude poderia reduzir o produto bruto global em impressionantes 12,9% até 2100 – o equivalente a 27 trilhões de euros (R$ 69,24 trilhões) por ano.

Os números apresentados por Tol baseiam-se em projeções de todos os principais modelos econômicos do Fórum de Modelagem de Energia da Universidade de Stanford. Cerca da metade dos modelos revelou que é de fato impossível alcançar a meta de manutenção dos aumentos de temperatura abaixo de dois graus centígrados com a implementação de reduções das emissões de carbono; o custo de 27 trilhões de euros refere-se aos modelos capazes de atingir essa meta.

Esta estimativa de custos é na verdade otimista. Ela assume que políticos de todo o mundo fariam, em todas as ocasiões, as escolhas mais efetivas e eficientes possíveis para a redução das emissões de carbono, sem desperdiçar dinheiro algum. Caso se deixe de lado esta esperança irrealista, o custo poderia facilmente ser dez ou até cem vezes maior.

Para colocar o problema de forma mais extrema: reduções drásticas de emissões de carbono nos atingiriam muito mais do que o aquecimento global em si. A redução das emissões de carbono é algo extremamente caro, especialmente no curto prazo, já que as alternativas aos combustíveis fósseis são poucas e dispendiosas. Sem alternativas viáveis ao uso do carbono, nós simplesmente prejudicaríamos o crescimento.

Em segundo lugar, nós podemos observar também que essa abordagem é politicamente falha pelo simples fato de que países diferentes possuem metas muito diversas e todas as nações acharão difícil reduzir emissões a um grande custo doméstico para ajudar um pouco o mundo daqui a cem anos.

Isso é particularmente óbvio em países como a China e a Índia, que têm dependido do carbono como motor de um crescimento que está retirando milhões de pessoas de uma situação de miséria.

A lacuna entre as nações desenvolvidas e as subdesenvolvidas quanto a esta questão constitui-se no empecilho político para que se negocie um substituto de sucesso do Protocolo de Kyoto. A China e a Índia serão os maiores emissores de gases causadores do efeito estufa do século 21, mas os dois países ficaram isentos do Protocolo de Kyoto por terem emitido muito pouco durante o período de industrialização do Ocidente.

Há alguns argumentos para que a China e a Índia concordem em instituir limites para emissões de carbono – e razões convincentes para que resistam às pressões para a adoção de tais limites.

Os modelos climatológicos revelam que, pelo menos durante o restante deste século, a China na verdade terá um benefício líquido com o aquecimento global. Embora o aquecimento global vá provocar problemas no país, as temperaturas mais elevadas farão aumentar a produção agrícola e melhorarão a saúde da população chinesa. O número de vidas perdidas durante ondas de calor aumentará, mas a quantidade de mortes prevenidas no inverno crescerá muito mais rapidamente: o aquecimento terá um efeito bem mais drástico nas temperaturas mínimas do inverno do que nas temperaturas máximas do verão.

Alguns indivíduos na Europa sugeriram que os países ricos pagassem as nações desenvolvidas para garantir que estas participassem de um acordo para a redução das emissões de carbono. Deixando de lado o fato de que esse dinheiro poderia ser gasto de forma bem melhor, não se sabe se os contribuintes dos países mais desenvolvidos estariam dispostos a transferir dezenas, ou até centenas, de bilhões de euros para o mundo em desenvolvimento, para projetos de benefício limitado.

Em terceiro lugar, a abordagem atual é tecnologicamente deficiente. Nós carecemos dos substitutos adequados para o carbono que queimamos atualmente. O uso de combustíveis fósseis – embora extremamente criticado – continua sendo absolutamente vital para o nosso desenvolvimento, prosperidade e sobrevivência. Tentar taxar as emissões de carbono sem criar alternativas energéticas substitutas é algo que simplesmente deixaria o planeta em uma situação pior.

Promessas fantásticas com pouca ou nenhuma chance de serem cumpridas

A demanda global por energia dobrará até 2050. Falta ainda muito para que fontes alternativas de energia estejam prontas para o uso generalizado. Em um estudo de julho de 2009 para o Centro de Consenso de Copenhague, Isabel Galiana e Chris Green, da Universidade McGill, em Montreal, no Canadá, demonstraram o tamanho do desafio tecnológico. Eles observaram que uma redução de três quartos das emissões de carbono até 2100, com a manutenção de um crescimento razoável – uma meta um pouco menos ambiciosa do que a do G8 – exigiria que as fontes de energia não baseadas em combustíveis fósseis fossem duas vezes e meia maiores em 2100 do que o nível de consumo global de energia em 2000, uma quantidade impressionante. Se continuarmos na nossa rota atual, o desenvolvimento tecnológico estará muito longe de ser suficientemente significativo para tornar as fontes de energia que não são baseadas em carbono competitivas em relação aos combustíveis fósseis em termos de preço e efetividade.

Green e Galiana examinaram a situação atual da energia não baseada no carbono – incluindo nuclear, eólica, solar e geotérmica – e descobriram que, juntas, as fontes alternativas de energia nos forneceriam menos da metade do que seria necessário para que atingíssemos um patamar estável de emissões de carbono até 2050, e apenas uma fração minúscula daquilo que é necessário para a estabilização até 2100. A tecnologia simplesmente não estará pronta em termos de estabilidade e capacidade de ajuste. Em muitos casos, ainda existe uma necessidade de pesquisas e desenvolvimento de tecnologias energéticas básicos. Nós não estamos sequer próximos de alcançar o ápice da necessária revolução tecnológica que foi iniciada. E não nos devemos esquecer de que as futuras gerações não nos julgarão pela escala das nossas ambições, mas sim por aquilo que nós de fato realizarmos.

Neste momento, os políticos estão fazendo cada vez mais promessas fantásticas que têm pouca ou nenhuma chance de serem cumpridas. Vejamos, por exemplo, o Japão. Em junho, aquele país comprometeu-se a reduzir em 8% até 2020 os níveis de gases causadores do efeito estufa em relação aos índices de 1990. Conforme observou em um estudo o cientista Roger Pielke Jr., do Centro de Pesquisas de Políticas Tecnológicas e Científicas, o cumprimento dessa promessa exigiria a construção de nove usinas nucleares novas e o aumento da utilização delas em um terço, a construção de mais de um milhão de novas turbinas eólicas, a instalação de painéis solares em quase três milhões de residências, dobrando a percentagem de novas casas que atendessem aos rigorosos padrões de isolamento térmico, e o aumento das vendas de automóveis “verdes” de 4% para 50% das vendas totais de carros.

Isso seria um esforço hercúleo, especialmente para uma nação que já foi um exemplo mundial em termos de eficiência energética. Mas o plano japonês foi altamente criticado ao ser apresentado. Quando o novo primeiro-ministro do Japão prometeu uma redução bem maior, de 25%, ainda que não contasse com nenhuma maneira visível de cumprir a promessa, ele foi sonoramente aplaudido. Belas palavras são mais valorizadas do que metas realistas.

Um investimento de 53 bilhões de euros só impediria uma hora de mudança climática

A nossa atual abordagem para resolver o problema do aquecimento global – focada primariamente na quantidade de carbono que tentaríamos reduzir por meio de impostos, em vez de em como tornar isso tecnologicamente possível – coloca o carro adiante dos bois.

A resposta mais efetiva seria aumentar drasticamente as verbas públicas para pesquisas e desenvolvimento de fontes de energia não baseadas no dióxido de carbono. Em vez de tornarmos os combustíveis fósseis mais caros, precisamos tornar a energia alternativa mais barata.

Serão necessários investimentos anuais em pesquisas e desenvolvimento da ordem de 66 bilhões de euros (R$ 169 bilhões). Isto é uma quantia 50 vezes maior do que aquilo que o governo gasta atualmente, mas é apenas uma fração do custo proposto para a redução das emissões de carbono. Green e Galiana, os acadêmicos da Universidade McGill, descobriram que, em termos econômicos, cada dólar investido evitaria um dano climático no valor de 11 euros (R$ 28).

Nós não podemos confiar na iniciativa privada. Assim como ocorre com a pesquisa médica, muitas das necessárias descobertas inovadoras no setor energético não gerarão recompensas financeiras significativas, de forma que atualmente não existe nenhum incentivo forte para o investimento privado nessa área.

Um aumento drástico de financiamentos públicos resolveria vários dos problemas políticos com a abordagem adotada em Kyoto. Haveria uma probabilidade bem maior de que nações em desenvolvimento como Índia e China adotassem uma rota de inovação mais barata, inteligente e benéfica.

Taxas de carbono poderiam desempenhar um importante papel secundário no apoio à pesquisa e ao desenvolvimento. Green e Galiana propõem que a taxação do carbono fique inicialmente limitada a uma pequena taxa (digamos, de US$ 5 por tonelada) para o financiamento de pesquisas e desenvolvimento de tecnologias energéticas. Eles sugerem que, com o passar do tempo, dever-se-ia permitir que esta taxa subisse no sentido de estimular o desenvolvimento de tecnologias alternativas efetivas e acessíveis.

É importante que os investimentos em pesquisa e desenvolvimento tecnológico sejam dedicados à criação de novas tecnologias alternativas, e não ao simples aperfeiçoamento das atuais tecnologias ineficientes. Um exemplo deste último caso é a Alemanha, que paga uma fortuna para reduzir muito pouco as emissões de carbono por meio do apoio à energia solar. Esse apoio custa 43 centavos de euro (R$ 1,10) por kWh, o que é equivalente a gastar 716 euros (R$ 1.834) para a redução de cada tonelada de carbono emitido. Mas o custo de cada tonelada em termos de danos climáticos é de cerca de quatro euros (R$ 10,24).

O custo disso é fenomenal – cerca de 53 bilhões de euros (R$ 135,73 bilhões) pelos painéis solares instalados de 2000 a 2010 -, mas o efeito máximo será o adiamento do aquecimento global em apenas uma hora, no final do século. Essa tolice incrivelmente dispendiosa é um exemplo de política que gera uma sensação agradável, mas que não tem efeito concreto.

Os governantes deveriam abandonar as problemática negociações para a redução de emissões de carbono e concordar em investir em pesquisas e desenvolvimento de tecnologias alternativas no nível que se faz necessário.

Desde que os políticos prometeram pela primeira vez reduzir as emissões de carbono, no Rio de Janeiro, em 1992, nós desperdiçamos quase 20 anos sem fazer nenhum progresso significativo na nossa tentativa bem intencionada, mas basicamente irrealista, de diminuir essas emissões. Não temos mais tempo a perder com uma resposta criticamente deficiente ao aquecimento global.

Tradução: UOL

Artigo [An Incredibly Expensive Folly: Why Failure in Copenhagen Would Be a Success] do Der Spiegel, no UOL Notícias.

Ecodebate, 09/12/2009

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