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Barragens no rio Eufrates provocam discórdia entre Turquia, Síria e Iraque

Rios Eufrates e Tigre. Imagem da Wikipedia
Rios Eufrates e Tigre. Imagem da Wikipedia

No fundo de um vale estreito, às margens do mítico rio Eufrates, a pequena cidade de Halfeti morre aos poucos. As velhas casas de pedras estão quase todas vazias. Uma agência de correio, alguns cafés onde se grelham as enormes carpas do rio, e uma prisão ainda em atividade são os únicos vestígios de vida. A construção, a jusante, da barragem de Birecik, perturbou o sossego dessa região turca, próxima da fronteira Síria.

Trinta e um mil habitantes foram evacuados, antes da inundação da zona em 2000, para serem realojados em apartamentos novos construídos no alto da colina, no “novo Halfeti”. O vilarejo vizinho, Savasan, só pode ser acessado agora por barco. O minarete da mesquita e um poste de eletricidade ultrapassam as águas azuis do lago. O resto foi tragado. “Nós estamos passando por cima de minha escola”, mostra o capitão do barco. Zeugma, a antiga cidade do século 3 a.C., descoberta pouco antes da inundação, teve o mesmo destino. Matéria de Guillaume Perrier, do Le Monde, em Birecik (Turquia).

Ao longo do Eufrates, a Turquia instalou cinco represas como esta, destinadas à irrigação ou à produção de energia. Duas outras estão em construção. Alguns quilômetros ao sul de Birecik, a de Karkamis foi erguida bem na fronteira com a Síria. Mais ao norte, é a represa Atatürk, obra central do Plano para a Anatólia do Sudeste (GAP), um projeto de 22 barragens disseminadas pelo Tigre e pelo Eufrates e seus afluentes.

Esses reservatórios de água, que regulam artificialmente a vazão de água, são denunciados pelos defensores do meio ambiente, que constituíram no sábado (14), em Istambul, um tribunal simbólico para condenar três projetos de barragens. Mas também pela Síria e pelo Iraque, igualmente atravessados pelos dois grandes rios que se juntam para terminar seu curso no Golfo Pérsico. Há mais de 24 anos as águas da antiga Mesopotâmia são objeto de uma batalha diplomática entre a Turquia, que detém as fontes, e seus vizinhos, que brigam por um estatuto “internacional” para o Tigre e o Eufrates.

Por diversas vezes chegou a pairar sobre a região a sombra de uma guerra da água; nos anos 1970, entre a Síria, que construía suas primeiras represas, e o Iraque. Em 1990, é a Turquia que provoca um incidente ao fechar as comportas do rio durante um mês, para preencher o lago da barragem Atatürk. Mais tarde, Ancara ameaça pressionar a Síria, que até 1999 protegia o líder curdo Abdullah Ocalan.

“Hoje, as coisas estão melhores e eles estão se falando, o que já é bom”, constata Loic Fauchon, presidente do Conselho Mundial da Água, que organiza, em Istambul, seu quinto Fórum Mundial de 16 a 22 de março. “Três anos atrás, no México, coloquei os representantes dos três países na mesma sala para obrigá-los a discutirem.” Há pouco tempo o tom mudou: “Nosso objetivo é utilizar e compartilhar a água de forma equitativa”, declarou recentemente Veysel Eroglu, o ministro turco do Meio Ambiente.

Um novo acordo pode ser concluído no decorrer desse fórum de Istambul, do qual participa o presidente iraquiano, Jalal Talabani. “Em trinta anos eles já assinaram dezenas”, observa o cético Tahir Ongur, engenheiro turco e ativista antirrepresas. “É muito difícil chegar a uma conciliação”.

Em 2008, os três países haviam chegado a um acordo de abrir um Instituto da Água, na represa Atatürk, onde engenheiros estudariam o fluxo e as necessidades de água na região. Mas, um ano depois da previsão de seu lançamento, o projeto está paralisado.

Empobrecimento dos solos
O problema mais urgente é o empobrecimento dos solos, segundo Güven Eken, presidente da Doga Dernegi (associação de defesa da natureza), uma ONG de Istambul. “As barragens não retêm só a água, mas também os sedimentos naturalmente carregados pelos rios”, ele explica. “As terras agrícolas estão menos férteis e mais salgadas”.

Ainda que a vazão de entrada de água na Síria, fixada em 500 metros cúbicos por segundo pelo protocolo de Damasco de 1987, seja mais ou menos respeitada, o Iraque se mostra preocupado. “O desperdício e a má utilização reduziram o nível de água disponível por habitante”, avisou, em fevereiro, o ministro iraquiano dos Recursos Hídricos, Abdul Latif Rachid.

Com o Iraque sendo reconstruído, o consumo deverá aumentar nos próximos anos, explicam os organizadores do Fórum da Água. Os pântanos do sul iraquiano já secam a olhos vistos.

O FIM DA ‘ÁGUA FÁCIL’

Fórum Realizado de 16 a 22 de março em Istambul, o 5º Fórum Mundial da Água reunirá 15 mil pessoas em torno de desafios propostos pela administração desse recurso.

Necessidades 90% dos 3 bilhões de habitantes que se somarão à população mundial até 2050 se encontrarão em países em desenvolvimento, onde hoje a população não tem um acesso correto à água potável e ao saneamento.

Doenças 3 milhões de pessoas morrem prematuramente a cada ano de doenças ligadas à água em países em desenvolvimento.

Clima Em 2030, 47% da população mundial viverá em zonas sujeitas a grandes problemas hídricos.

Tradução: Lana Lim

* Matéria [Turquie, Syrie, Irak : les barrages de la discorde]do Le Monde, 16/03/2009, no UOL Notícias, 17/03/2009 – 00h03

[EcoDebate, 18/03/2009]

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