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Falta de investimento atrasa nova vacina contra febre amarela

Objetivo de pesquisa inédita da Fiocruz do Recife é reduzir reações adversas que atingem até 5% dos vacinados. Pesquisadores da Fundação Oswaldo Cruz no Recife conseguiram melhorar a vacina de febre amarela durante testes em laboratório, aumentando ainda mais a segurança do produto, mas ainda não há garantia de financiamento para a continuidade do estudo, inédito no mundo, que demanda agora avaliações em primatas e humanos. Faltam cerca de R$ 6 milhões em investimentos. Por Fabiane Leite, do O Estado de S.Paulo, Quinta-Feira, 10 de Janeiro de 2008 | Versão Impressa

Segundo Ernesto Marques, do Departamento de Virologia e Terapia Experimental do Centro de Pesquisas Aggeu Magalhães, o trabalho , que tem financiamento de R$ 3,7 milhões do governo federal e do governo americano, visa a combater reações como febre, dores no corpo e dores de cabeça que atingem até 5% dos que tomam a vacina, além de diminuir o risco de casos muito mais raros de mortes após o uso do produto – alguns já foram registrados no Brasil e em outros países.

Os cientistas deixam claro, no entanto, que a vacina atual ainda é considerada extremamente segura e seus benefícios são maiores do que os riscos. O produto, fabricado pela Fiocruz, é pré-qualificado pela Organização Mundial da Saúde (OMS), o que é uma referência para fabricantes. “Estamos tentando melhorar o que já é bom”, afirmou Rafael Dhalia, também pesquisador do centro. O grupo, que trabalha em parceria com a Universidade Johns Hopkins, dos EUA, elabora uma vacina a partir de uma seqüência de DNA do vírus da febre amarela sem o uso de ovos para o seu desenvolvimento. A vacina atual, cuja maneira de fabricar é a mesma desde 1937, a despeito de algumas melhorias, utiliza vírus vivo e atenuado, cultivado em ovos de galinha. Isso faz com que o produto seja vetado para alérgicos a ovos.

Os pesquisadores conseguiram imunizar camundongos com duas doses da nova vacina e agora trabalham para diminuir o número de doses e tornar o produto ainda melhor para testá-lo em primatas e, em seguida, em humanos. Mas não há recursos para essa fase, diz Marques. “Temos candidatos ao financiamento, mas acerto mesmo não existe”, afirmou o pesquisador. Procurados, o Ministério da Saúde e a Fiocruz não se manifestaram. “Se tivéssemos recursos hoje, em dois anos a vacina poderia estar pronta”, disse Marques.

Ontem, a Fiocruz, principal produtora da vacina no mundo, anunciou que dobrará a produção neste ano das cerca de 15 milhões de doses anuais para 30 milhões. A medida já vinha sendo estudada desde o fim do ano passado, quando começaram a ocorrer mortes de macacos em razão da doença – a contaminação dos primatas é o primeiro sinal de alerta para se evitar casos em humanos. Atualmente, há oito casos suspeitos de febre amarela em pessoas. O ministro da Saúde, José Gomes Temporão, negou ontem risco de epidemia (leia abaixo).

MORTES

Desde 1999, foram registrados pelo menos três casos de morte de pessoas que receberam a vacina da Fiocruz, segundo a própria bula do produto. Vacinas de outros fabricantes também tiveram problemas. Esses fatos levaram o ministério a cancelar uma vacinação de toda a população recomendada pela Organização Pan-Americana de Saúde (Opas) naquela época, recorda Expedito Luna, coordenador de Vigilância Epidemiológica do ministério até o ano passado. O especialista contabiliza pelo menos seis casos de morte até hoje no País – o ministério não forneceu dados oficiais ontem. Na região de Ica, sul de Lima, no Peru, foram notificados no fim do ano passado quatro casos de mortes associados à vacina da Fiocruz.

Estudo publicado em 2001 na revista The Lancet sobre casos de mortes no Brasil apontou que características individuais das pessoas imunizadas poderiam explicar os eventos. As vítimas morreram com sintomas da febre amarela. “Nenhuma vacina é livre de riscos. A sociedade e os governos é que devem pesar riscos e benefícios”, diz Luna, que participou do trabalho.