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Migalhas da ditadura militar, artigo de Daniel Luiz Arrebola

 

[EcoDebate] O ano de 1964 é marcado na historia do Brasil com o golpe militar que inicia o período que chamamos de Ditadura Militar. Onde os presidentes eram impostos (não havia voto) por uma cúpula militar a qual escolhia generais para assumir este cargo. E com isso, o país vivia uma onda de fortíssima repressão. A liberdade de expressão foi colocada de lado, e dado lugar a um silencio que escondia serie de mals tratos, perseguições, torturas e assassinatos de pessoas que se posicionavam contra este regime.

No campo, muitos lideres campesinos, os trabalhadores e suas famílias sofreram muitas perseguições nesta época. No inicio da década de 1960 muitos municípios em estados do nordeste criaram, com apoio da igreja católica (em especial de alguns bispos como Dom Helder Câmara em Recife – PE e Dom Antônio Fragoso em Crateus – CE) as chamadas Ligas Camponesas. As ligas eram associações de trabalhadores do campo que se união para lutar por seus direitos, como 13 salario, férias, direito a descanso, e até mesmo contra o pagamento do “cambão”, porcentagem dos bens cultivados pelo trabalhador que era dada ao dono da fazenda ou engenho em troca da permanência da família em suas terras. Com o golpe de 64, o governo passa a perseguir os lideres das ligas camponesas, bem como outros movimentos e sindicatos nos quais os trabalhadores do campo se organizavam. Prendiam seus lideres, torturavam , promoviam chacinas junto a jagunços dos senhores de terras. Deu liberdade a mandantes de torturas e assassinatos que já tinham sido condenados. Durante os dois primeiros governos militares, Generais Costa e Silva e Médici, as ligas camponesas, bem como seus lideres e participantes, foram quase dizimados, principalmente nos estados da região nordeste do país.

Após 1985, este cenário muda com a volta das eleições democráticas para presidente. A repressão diminuiu e a liberdade de expressão renasce após se tornar cinzas por mais de 20 anos.

Contudo, se analisarmos os métodos utilizados pela ditadura, veremos que ainda hoje, deste grande banquete que os militares fizeram com o povo brasileiro, algumas migalhas caíram da mesa e ainda estão espalhadas pelo país para que governo, latifundiários e grandes empresas possam se deliciar com elas.

Quando vemos casos como os massacres comandados por fazendeiros no Mato Grosso do Sul contras a comunidade indígena Guarani Kaiwoa, onde jagunços invadem um acampamento feito de pedaços de pau e lonas pretas, atiram, e sequestram seu cacique, logo pensamos como cenas como essas ainda acontecem em nosso país. Casos assim aconteceram, por exemplo, na Paraíba durante o principio do regime militar, quando lideres campesinos como Pedro Fazendeiro e João Alfredo desapareceram e seus corpos nunca foram encontrados, a não ser por uma foto de dois corpos carbonizados que provavelmente sejam destes (segundo relato da filha de Pedro Fazendeiro, Neide, ao ver a foto dos corpos na edição de 2 de Setembro de 1995 do Correio da Paraíba).

Também podemos comparar a desocupação da comunidade do Pinheirinho, localizada na zona sul da Cidade de São José dos Campos – SP. A policia militar utilizou balas de borracha calibre 12 dando tiros a menos de 5 metros dos moradores. Praticamente a queima roupa. Vimos centenas de vezes cenas deste tipo acontecer nos muitos protestos realizados nas grandes cidades, principalmente no Rio de Janeiro, comandados por sindicatos e pela União Nacional dos Estudantes – UNE. No campo também muito das assembleias campesinas terminaram em tiros distribuídos ao léu pelos jagunços, policiais e militares. Como nos casos dos massacres nas usinas Estreliana e Caxangá, em Pernambuco, quando os trabalhadores das usinas paralisaram os trabalhos para lutar por seus direitos.

Não podemos esquecer outras ações que a ditadura realizava e que nosso governo realiza ainda hoje. Como passar por cima de todas as leis, criando regras próprias do regime que poderiam dar ao presidente leis máximas, como o Ato Inconstitucional numero 5 –AI 5. Se observarmos o caso da instalação da Usina Hidrelétrica de Belo Monte, veremos um exemplo claro disso.

No estatuto do índio, existe um artigo que garante a participação nas decisões tomadas pela união quando estas usufruem ou influenciam suas terras:

“Art. 42. Cabe ao órgão de assistência a gestão do Patrimônio Indígena, propiciando-se, porém, a participação dos silvícolas e dos grupos tribais na administração dos próprios bens, sendo-lhes totalmente confiado o encargo, quando demonstrem capacidade efetiva para o seu exercício.”

E também:

Art 5 da UNDRIP
“Direito de ser informado e decidirem sobre tudo o que acontece em seu Território. Direito de ser consultado sobre qualquer decisão ou atividade que aconteça dentro de sua Terra.”

Então, navegando totalmente contra a maré destes direitos, o governo federal não da atenção as milhares de reivindicações dos povos indígenas existentes na região, os quais já se posicionaram veementemente contra a instalação da usina, sabendo que a sua construção ira afetar de forma permanente o seu modo tradicional de vida.

Muitas outras facetas de um regime ditatorial e manipulador podem ser vistos por todo o país. Quando vemos casos de repressões a manifestações populares, dos professores que há anos lutam por salários dignos a sua profissão, quando vemos o judiciário calando-se diante de injustiças claras, vemos ai algumas migalhas que a ditadura deixou cair da mesa, e os poderosos e nossos governantes se aproveitam delas para ruírem um pedaço a mais de poder ou de capital.

Ainda podemos acabar com todas estas migalhas se quisermos, e para isso o povo deve mostrar voz e vez nas decisões do país. É neste momento que devemos fortalecer a nossa participação em espaços de construção e discussão do poder civil, como nas conferencias de juventude e do conselho de transparência e controle social – Consocial, espaços estes onde podemos deixar claro a posição da população com relação a construção de politicas publicas benéficas a todos. E também, conhecendo bem as propostas dos candidatos e dos partidos nas eleições que teremos este ano. E depois de eleitos, devemos ter acesso aos governantes, de forma que possamos cobra-los pelas suas promessas e seus atos.

Vivemos em um regime democrático, portanto, diferente do processo que se fez necessário nos países árabes (primavera árabe), não precisamos entrar em conflito armado contra nosso governo, pois um governo deve sim temer o seu povo, mas deve temer muito mais sua voz do que suas armas.

Daniel Luiz Arrebola, Graduando bacharelado em Ciências Sociais pela Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro. Membro do Centro Acadêmico de Sociologia da Puc Rio. Militante da Pastoral da Juventude Nacional.

EcoDebate, 13/02/2012

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12 thoughts on “Migalhas da ditadura militar, artigo de Daniel Luiz Arrebola

  • Daniel Luiz Arrebola,

    Você sabe muito bem que a ditadura militar no Brasil aconteceu para impedir a ditadura comunista, muito mais atroz e assassina que a que foi imposta, não?

    Na URSS morreram 60 milhões de pessoas.

    Em Cuba 100.000

    E no Brasil, quantos morreram?

    Você prefere esta ou àquela?

  • Prezado Sena,

    Não existe ditadura benigna. Toda ditadura é um ato de força por definição e, portanto, sustentada pela brutalidade.

    A ditadura militar no Brasil não foi diferente. Que o digam as esposas, companheiros, filhos e pais dos assassinados e desaparecidos.

    Os brutalizados e torturados também são testemunhas desta brutalidade. Assim como as estudantes gravemente feridas na invasão da PUC/SP, na noite de 22 de setembro de 1977.

    No mais, números chutados não são bons argumentos.

    Na II Guerra Mundial, pesquisadores estimam que entre 15 e 18 milhões de soviéticos morreram e destes mais da metade foi da população civil, assassinada pelas tropas nazistas. Será que a repressão do regime soviético matou 3 vezes mais pessoas que a II Guerra Mundial?

    Além disto, o autor não defende qualque tipo de ditadura. Ao contrário.

  • Cara Sena.

    Concordo com você quanto ao “nivel” de crueldade de cada um destes regimes. Contudo, acredito que não podemor por isso dizer que a nossa ditadura deve ser esquecida ou desmerecida em suas atrocidades.

    Att.

    Daniel Luiz.

  • oberdan campelo

    Verdades fragmentadas.
    Os vencedores contam a sua (e) (hi) stória, e essa é que será transmitida e difundida como a verdade absoluta. O Daniel, aparentemente, é um jovem e militante de uma pastoral, é justo que defenda a ___stória que lhe é permitido o acesso. E você, Henrique? Questiona os números apresentados pelo Sena e defende números estimados!?? No Brasil, o número oficial, contado pelo Grupo Tortura Nunca Mais, encontra-se no site, inclusive os nomes dos mortos e desaparecidos, só conseguiram provar a responsabilidade do Estado em próximo a 200 casos. O Governo atual já teve acesso aos arquivos secretos e descobriu que a maioria dos outros, e inclusive alguns dos 200, não constam nesses arquivos. Então a quem devemos responsabilizar? Má companhia? Bebidas? Drogas? Abandono da própria família, a mesma que hoje reinvidica? A presidenta Dilma já sabe a verdade. Por que omite? Não há que se defender B ou C, devemos apurar os que houve durante o regime militar, as mortes suspeitas desde Ulisses, Tancredo, Celso Daniel, PCs, Chico Mendes, não devemos abrir os olhos para o passado e fechar para o presente. Henrique/Sena não sejamos passionais. Daniel, depois que você completar 30 anos leia o texto que escreveu.
    Fraternalmente,

  • Prezado Henrique,

    Eu concordo, nenhuma ditadura é benigna, no entanto observo que no dia-a-dia testemunhamos críticas ao Regime Militar, onde mencionam mortes e torturas. Entretanto, vejo que a verdade não é verdadeira, pois se tratando da história percebe-se que falta sinceridade aos críticos. Esses demonstram que os militares foram os vilões da história. Ora, quantas foram as mortes provocadas pelos “inofensivos guerrilheiros”. Tudo foi muito difícil e poderia ter sido evitado, mas não foi, e talvez, esse tenha sido o preço para impedir que implantassem no Brasil, o mesmo modelo filosófico do Gran Comandante, aquele que fuzilou milhares no Paredon. Muitos dos críticos o idolatram.

  • Prezados,

    Em primeiro lugar, não fui passional ou parcial. Nem mesmo apresentei quaisquer números, apenas questionei um número inconsistente.

    Tenho convicção que não existe ditadura benigna e que os direitos humanos não devem ser relativizados.

    Comparar ditaduras pela contagem de corpos é sem sentido, exatamente pela existência de corpos, independente de seu número.

    Ao longo da história, em todo o planeta, as ditaduras sempre foram regimes de força e sempre foram marcados pela brutalidade. Maior ou menor, mas sempre brutal.

    É essa a minha visão da questão e por isto, insisto, os direitos humanos não podem e não devem ser relativizados.

  • Caros amigos.

    Concordo com algumas observações, contudo venho a perguntar: Devemos bater palmas a algum regime ditatorial?. Realmente muitas das mortes ocorridas no periodo podem não ser de responsabilidade do governo, entretanto, devemos passar a mão na cabeça dos responsaveis pelas quais foram?. Como Henrique bem fala, nenhum regime ditatorial é benigno. Não se deve deixar de pautar a nossa ditadura militar tendo como exemplo outros exemplos mundiais.
    E não me refiro neste texto apenas as mortes, mas sim também os casos de torturas que foram muitos (e isso compravado até por pessoas que ainda hoje estão vivas para contar) e outras formas de repressão, como a liberdade de expressão, entre outras.

    Att.

    Daniel Luiz.

  • Não nos devemos esquecer de que a implantação da ditadura militar de 1964 não ocorreu sem o apoio da grande maioria da população brasileira, a qual incutiu a propaganda dos defensores do golpe em defesa da família e da crença religiosa. Para a grande maioria o golpe era necessário para salvar do comunismo.
    Fazer o quê? Esse é o povo brasileiro!
    Para tristeza da minoria, se atualmente retornassemos às condições do início dos anos 1960, um novo golpe militar, semelhante àquele, receberia, novamente, o apoio da grande maioria.
    Fazer o quê? Esse é o povo brasileiro!

  • Bom texto! Devemos explorar mais a parte da ditadura que menos se ouve, no norte-nordeste, bem onde foi mais sangrenta! E ponha “migalhas” nisso, daniel!! São mais escalopes gordos, bifes jogados, isso sim! Resquícios propositais de uma política programada sem data de expiração!
    Parabens pelo artigo.

  • O artigo de Daniel Luiz Arrebola é muito interessante. Nós, que vivemos a ditadura militar, nos lembramos daquele tempo sem saudade.
    Entretanto, ele faz um paralelo entre aqueles tempos e os tempos de hoje, o que, em minha opinião, é absolutamente controverso. Com relação à hidrelétrica de Belo Monte, o assunto do momento, não a considero que seja uma “migalha da ditadura militar”.
    Concordamos com a aplicação ao continente americano do art. 5º do Pacto dos Povos Indígenas da Ásia (UNDRIP), que lhes dá o direito de serem informados e de decidirem sobre tudo o que acontece em seu Território, bem como de serem consultados sobre qualquer decisão ou atividade que aconteça dentro de sua Terra. No caso de Belo Monte, os indígenas foram devidamente informados sobre o projeto e a redução da área do reservatório se deveu a sua resistência, o que fez com que o Governo mudasse o modelo da usina para fio d’água, decidindo que não inundaria terras indígenas. Por outro lado, há a redução esperada da vazão da Volta Grande do Xingu, mas também isso foi considerado, tendo sido fixado em 700 m3/s a vazão mínima naquele trecho.
    Diante disso, não vejo paralelo entre os chamados anos de chumbo e os anos que estamos vivendo.

  • mano sinho hip-hop-sergipano

    parabens pelo artigo Daniel e muito boa as colocações dos demais, infelizmete temos que relacionar que a postura sangrenta, perseguidora e torturadora da ditadura teve a aprovação do povo, mais será agora o povo culpado? mais e em relação a ditadura invisivel de quem vive perseguido pela necessidade, maltratado pela injustiça, toturado pela falta de oprtunidade e condenado pela corrupção e pala perseguição e opressão do estado, o povo brasileiro gerado do abuso e de um mascarado “estrupo” a terra da exploração pela colonização, nasce um povo que já existia mais que em nova casa e em uma nova terra mãe, que os acolhia mais não podia fazer nada pois era a mais explorada, devastada, esse novo povo que se formava não sabia o que era e em que crê! na crença que vem de dentro? ou na crença que se crê! pois bem o povo que era a grande maioria não se reconhecia e por uma pequena menoria os recohecia como os “ninguen” meus irmão confesso não te cursado as grandes academias e nem as pequenas mais na faculdade da vida tive poucas opções e entre viver e sobreviver tive que me reconhecer e como os valores da nossa sociedade tá na familia a minha não sabia quem era nem se reconhecia e entre as poucas opções tive duas o cano do oitão pra trazer a solução ou usa a mente as palavras pra fazer revolução, que cai a ditadura das grandes midias, das multnacionais do imperalismo e da fraqueza e omissão do estado, e que os que pensam e discultem as tragedias e as mazelas e as conquista do povo brasileiro assumam o papel que não é facil de dizer ao povo quem e o que ser brasileiro não é só grito gol e vibra a emoção do esporte, agora é uma historia nova na velha historia do brasil que a verdade seja mostra em cada beco em cada morro, no sertão nos calaboços e nos porrões da condenação emcima da ijustiça brasileira, pois na diversidade do nosso pais não nos reconhecermos que somos povo brasileiro e se isso não acontecer seremos massa de monobra, e sofremos uma ditadura do grande capital mundial para que assumam de verdade o quanto exploram o patrimonio da nação indio-luso-afro brasileiro,
    salve a todos! essas são as sincera linhas da minha compreesão e do sofrimento da minha realidade.

  • Rapaz!
    Que coisa divertida!
    Uns debatendo sobre o conteudo histórico, se engalfinhando em cima de cadaver alheio.
    Ou vem esperando o cadaver fresco, dos povos da florestas, pequenos agricultores, e ribeirinhos.

    Caro Paulo Afonso, não sou bacharel e direito, nem pretendo ser. Faço apenas as mesmas perguntas de sempre.
    Energia para que?
    Energia para quem?
    As custas de que?
    As custas de quem?

    A lógica do Daniel é perfeira, as migalhas que ele fala, é o uso da força bruta.
    Contra os índios e pessoas que vivem de Volta Grande no Xingu, contra os moradores de Pinheirinho, contar os Laranjeira Nhanderu em Dourados (MS), e quantos mais.

    Rapaz, isto tem fim não.

    Aliás Ruben Alves já criticava, pessoas que queriam formar os jovens. Formar no sentido de colocar em uma forma. Aquela que agrada ao “experiente”.
    Os jovens devem ter o direito de serem sujeitos de seu próprio futuro, não apenas mantenedores do futuro, como continuação deste presente.

    Um futuro melhor, mais justo, humano, e por incrível que possa parecer! Mais possível!

    Daniel, parabéns!

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