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Artigo

As uvas continuam verdes, artigo de Maurício Gomide Martins

[EcoDebate] Já que não conseguimos alterar as ações irracionais da atual civilização, em sua sanha de crescimento material e concomitante destruição dos valores espirituais, vamos procurar um caminho que nos traga compensação, tirando por um momento nosso olhar do parreiral ecológico, donde pendem as uvas a que tanto desejamos.

Vamos acomodar nossos ideais e gritos de vida em pontos suaves e tranqüilos – enganando-nos por esforço de auto-anestesia mental –, num mundo heterogêneo em que os insensíveis e impensantes se entregam aos atrativos da frivolidade. Será uma reflexão lenitiva para descanso de mentes ingloriamente preocupadas em preservação do paraíso herdado.

E os frágeis ecologistas, como as conchas da caudal oceânica que são jogadas aleatoriamente para um ambiente bruto e primário, ficam atordoados e obedientes ao balanço dos impulsos rumo à modernidade louca. É mais cômodo deixar-se jogar de um lado para outro do que despender esforços para seguir um rumo ditado pela razão. É mais confortável adotar a opinião pragmática do caldo cultural, sustentado pela mídia insidiosa, do que construir seu próprio pensamento, puro, sedimentado pelo raciocínio e mais próximo da verdade.

Arremessadas a esmo e sem voz nesse turbilhão de interesses individualistas, ninguém ouve nossas mensagens, nem percebe que esses movimentos adversos cavam o túmulo para todos, indistintamente. A vida humana se esvairá nessa insanidade mental, e o planeta enfim ficará livre para cumprir seu misterioso destino cósmico.

Sim, é mais cômodo viver usufruindo de todas as conquistas tecnológicas, economizando energias que são transformadas em tecido adiposo. Está na moda ser obeso! Para que cobiçar as uvas maduras se elas são inalcançáveis? Deixemos que os alimentos oferecidos pelos parreirais astutos pereçam em holocausto ao nada, pois a humanidade não tem como se justificar pelo insucesso em alcançá-los. Afinal, construir uma escada ecológica requereria um esforço mental tão grande!

Melhor os ecologistas anularem sua capacidade cerebral, misturando-se ao torvelinho inculto e feliz da plebe, que desconhece as potencialidades cerebrais e vive feliz, fervendo de satisfação apenas com a vivência mundana, regada por festas, drogas e cabrestos midiáticos. Isso lhe basta, pois têm a cabeça moldada pelas conveniências do sistema, que os tornam simples consumidores frívolos, incapazes de sentir sua própria existência, facultada pelo simples uso da síntese “cogito, ergo sum”.

Tornam-se eles unicamente em buscadores de recursos aptos a lhes satisfazer os desejos do nada. A busca de irrealidades passa a ser o objetivo de vida. Assim, a vivência ficará mais simples e sem preocupações: a terra ficará mais bonita, ainda que lhe faltem os elementos produtivos; o mar mais explorável, ainda que sem peixe; o céu mais róseo, ainda que prenúncio de tempestade.

Os valores, as ânsias e sentimentos da alma onde e como ficam? Ora, vida espiritual… Para quê? Podemos muito bem viver sem essas coisas incômodas. O animal humano já se livrou de grande parte dessas inconveniências e está vencendo a luta contra os diversos tipos de emoções, inclusive o básico amor. Hoje, a moda é o consumo da redentora droga viciante que supre todas as necessidades do espírito e resolve todos os problemas existenciais. São as delícias da irresponsabilidade. Ela também possui suas vantagens individuais.

O planeta, depois de livre da praga humana que lhe frustrou o privilégio e honra de abrigar a inteligência – essa apurada forma energética – encontrará finalmente as condições propícias para acolher em seu âmbito respeitosos filhos instintivos, seguidores sem pecado do roteiro estabelecido pela Natureza.

Para aplacar o pensamento ecológico que teima em alcançar as uvas, só nos resta resmungar, com fingido desdém e lânguida angústia, que as uvas continuam verdes.

Maurício Gomide Martins, 82 anos, ambientalista e articulista do EcoDebate, residente em Belo Horizonte(MG), depois de aposentado como auditor do Banco do Brasil, já escreveu três livros. Um de crônicas chamado “Crônicas Ezkizitaz”, onde perfila questões diversas sob uma óptica filosófica. O outro, intitulado “Nas Pegadas da Vida”, é um ensaio que constrói uma conjectura sobre a identidade da Vida. E o último, chamado “Agora ou Nunca Mais”, sob o gênero “romance de tese”, onde aborda a questão ambiental sob uma visão extremamente real e indica o único caminho a seguir para a salvação da humanidade.

EcoDebate, 15/02/2011


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