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Rio de Janeiro e São Paulo precisam da Mata Atlântica para ter o que beber

Guardiã das águas – Considerada um dos ambientes naturais mais importantes do mundo por seu elevado grau de diversidade de animais e plantas, a Mata Atlântica guarda um bem ainda mais fundamental: a água. Os números dão a dimensão da riqueza. Por Roberta Jansen, do O Globo – 17/10/2007.

Os escassos remanescentes da floresta garantem o abastecimento de 120 milhões de pessoas, sobretudo no Sudeste. Revelar como o ciclo hidrológico da mata é imprescindível para a sobrevivência dos grandes centros urbanos é um dos principais objetivos de um estudo conduzido no Parque Estadual da Serra do Mar, em São Paulo.

É paradoxal mesmo. Se a Mata Atlântica não tivesse sido praticamente destruída, as grandes cidades não existiriam — pelo menos não onde estão. As áreas antes ocupadas pela floresta abrigam hoje mais de 80% da população do país e suas principais indústrias.

Mas se os 7% que restam da mata não forem preservados, não haverá água para manter tudo isso.

Quando chove em terras desmatadas, ocorre o que se costuma chamar popularmente de enxurrada. A água bate com força no solo exposto e corre rapidamente em direção aos rios mais próximos levando junto com ela grande volume de terra. O resultado imediato é a enchente, já que a água chega muito rápido aos veios. A médio prazo, todo aquele sedimento carreado se deposita no leito dos rios.

Dependendo da situação pode levar ao fim do manancial e à seca generalizada na região. Sem falar que, em função da geografia do local, pode provocar graves deslizamentos de terra.

Mas quando a chuva cai sobre a floresta, o processo é totalmente diverso. A água enfrenta vários obstáculos na vegetação até chegar ao solo. Com a velocidade bastante reduzida, o impacto é menor, o que permite que a água se infiltre no terreno, alimentando os lençóis subterrâneos.

São esses lençóis que vão abastecer os rios. Ou seja, não há um excesso de água lançada nem o carreamento de sedimentos.

Esse ciclo garante a afluência dos rios mesmo nos períodos mais secos do ano, e auxilia o equilíbrio climático.

“A mata protege os mananciais que abastecem Rio, São Paulo e a Baixada Santista”, afirma Luiz Roberto Numa de Oliveira, diretor de operações da Fundação Florestal de São Paulo, responsável pela coordenação dos parques do estado. “E a estabilidade das encostas e o equilíbrio do clima dependem diretamente disso”.

Floresta é uma usina de rios

O Parque Estadual da Serra do Mar tem um papel importante nesse ciclo. Com 315 mil hectares, é a maior área contínua preservada de Mata Atlântica, abarcando 28 municípios de São Paulo.

É essa região conservada que garante a sobrevivência dos rios Paraibuna e Paraitinga que vão se juntar mais à frente para formar o Paraíba do Sul — principal fonte de abastecimento do Rio de Janeiro.

No Laboratório de Hidrologia Florestal, que funciona no parque, cientistas fazem o monitoramento quantitativo e qualitativo das águas que, no fim desse ciclo, vão abastecer Rio de Janeiro, São Paulo e outras cidades.

Eles conseguiram medir, por exemplo, que nas áreas de Mata Atlântica 63% da água da chuva se infiltra no solo para alimentar os lençóis freáticos. Esse percentual é altíssimo mesmo quando comparado aos números da Amazônia — onde a infiltração é de 50%.

E fica ainda mais destacado posto ao lado dos números de regiões de pastagem, onde é inferior a 30%.

Resumindo, a Mata Atlântica é uma das maiores responsáveis pela produção hídrica do país.

“A Mata Atlântica tem uma diversidade muito elevada de árvores, com as mais diferentes folhas, e das mais variadas alturas. Além disso, o solo conserva um volume grande de matéria orgânica que o torna ainda mais poroso”, explica o engenheiro agrônomo José Luiz de Carvalho, coordenador regional dos parques do Vale do Paraíba e Mantiqueira. “Isso faz com que a infiltração da água seja muito maior. O processo é completamente diferente numa floresta de eucaliptos, por exemplo.”

Protetora de animais e plantas

Da Mata Atlântica original que cobria boa parte do litoral brasileiro restam apenas 7%. Mas mesmo tão reduzida e fragmentada, a floresta é uma das mais ricas em biodiversidade do mundo.

Estimativas indicam que existam 20 mil espécies diferentes de plantas, sendo que metade é endêmica — ou seja, não existe em nenhum outro ecossistema.

Um único hectare da mata pode abrigar 450 espécies de árvores, enquanto que uma floresta inteira da Europa tem de seis a oito. O número de animais é ainda mais impressionante. São 1,6 milhão de espécies, incluindo as de insetos.

Os cientistas ressaltam, no entanto, que os números podem ser ainda maiores já que nem tudo é conhecido.

matéria do jornal O Globo – 17/10/2007
enviada por João Suassuna, colaborador e articulista do EcoDebate