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Notícia

Clima e Desmatamento: Sociedade Brasileira

Embora seja um assunto novo, a relação entre as florestas e a mudança climática já vem ocupando a pauta de discussões no Brasil, principalmente entre os Povos da Floresta – populações indígenas e tradicionais que vivem dos recursos florestais e em áreas de conservação – e entidades da sociedade civil, sobretudo as ambientalistas. Do Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia (IPAM).

Vinte anos depois do primeiro encontro dos Povos da Floresta, realizado em 1987 e presidido por Chico Mendes, um grupo de organizações sociais, que forma a Aliança dos Povos da Floresta, realizou, em setembro de 2007, um segundo encontro, em Brasília, com o objetivo principal de discutir as Mudanças Climáticas e seus efeitos nessas populações.

“No momento em que a comunidade internacional coloca o clima em discussão, resolvemos atuar novamente juntos”, disse Alberto Cantanhêde, do Grupo de Trabalho Amazônico (GTA). “Precisamos discutir a compensação ambiental para populações que preservam as florestas”, afirma o vice-presidente do Conselho Nacional dos Seringueiros (CNS), Júlio Barbosa de Aquino.

A questão das mudanças climáticas encontrou os Povos da Floresta amazônica ainda impactados pela seca de 2005. A possibilidade de episódios como esse se tornarem comuns na região tornou-se o centro das discussões em todos os fóruns regionais. “Vimos que, mesmo sendo os que menos desmatam, somos os que mais sofrem as conseqüências. Ficamos sem água para beber – dependendo em plena floresta de receber água em garrafas – e isolados, sem poder nos transportar”, disse Adilson Vieira, também do GTA.

Uma das maiores reivindicações desses povos e de seus parceiros é que haja repasse direto às populações tradicionais de recursos ou pagamento por serviços ambientais. Um manifesto assinado por ambientalistas, cientistas, representantes do governo e de comunidades indígenas também reforça os direitos dessas populações e pede a inclusão das florestas no combate às Mudanças Climáticas.

Com mais de 250 assinaturas, o texto da Declaração das Florestas (lançada em setembro de 2007) ressalta que as nações em desenvolvimento não são as principais responsáveis pela alteração climática, mas têm um papel fundamental na preservação das florestas. Uma das recomendações da declaração é que os créditos de carbono gerados pela conservação da floresta sejam incluídos nos mercados globais.

COLABORAÇÃO DAS ONGs

Lançadas ao longo de 2007, várias propostas da sociedade civil têm enriquecido esse debate, como os documentos Pacto pela Valorização da Floresta e pelo Fim do Desmatamento na Amazônia e Três Estratégias Fundamentais para a Redução do Desmatamento na Amazônia, resultados do trabalho conjunto de várias organizações que atuam na Amazônia.

Realizado por nove organizações não-governamentais (IPAM, ISA, ICV, WWF, CI-Brasil, Imazon, The Nature Conservancy, Greenpeace e Amigos da Terra-Amazônia Brasileira), o Pacto pela Valorização da Floresta e pelo Fim do Desmatamento na Amazônia é uma proposta para zerar, em sete anos, o desmatamento na Amazônia, através da aplicação de metas de redução das taxas de derrubada da floresta. Para tanto, se o governo federal redefinir suas políticas para a região, calcula-se que serão necessários cerca de R$ 1 bilhão a R$ 2 bilhões por ano, os quais deverão ser, em parte, alocados em um fundo destinado a compensar financeiramente os produtores rurais que abrirem mão de seu direito legal de desmatar em prol da conservação florestal. Uma outra parte desse recurso seria destinada aos Povos das Florestas, que seriam compensados pela conservação das florestas em suas terras (reservas extrativistas e terras indígenas), através do pagamento por serviços ambientais e pela redução compensada do desmatamento. O plano estabelece metas de redução da expansão da fronteira agrícola, cortando o ritmo de desmatamento em 25% no primeiro ano, 25% no segundo, 30% no terceiro e assim por diante até os 100%, a partir da taxa atual, de 14.000 km2 ao ano.

O IPAM, junto com o Woods Hole Research Center, também desenvolveu um estudo econômico que calculou o custo de oportunidade envolvido na redução do desmatamento. O principal resultado indica que 70% do desmatamento na Amazônia (e das emissões de carbono dela decorrentes) podem ser contidos a um custo de menos de 10 dólares por tonelada de carbono (cerca de metade do preço no mercado hoje). A esse valor, contudo, deve-se adicionar outros custos, tais como aqueles de transação, por exemplo. Ainda, o custo de oportunidade calculado não reflete o valor final da floresta. Para isso, deve-se calcular o seu valor para a conservação da biodiversidade, equilíbrio climático e produção das chuvas. Esses resultados fazem parte do relatório Três Estratégias Fundamentais para a Redução do Desmatamento, realizado em parceria ainda com as organizações Aliança da Terra, Amigos da Terra, Imazon, ISA e Universidade Federal do Mato Grosso. O documento sugere estratégias para diminuir o desmatamento ilegal na Amazônia.

Durante a COP 13, em Bali, outras propostas foram apresentadas, como a do Greenpeace, que estabelece um complexo mecanismo de mercado para captar recursos dos países ricos e investi-los na proteção das florestas tropicais dos países em desenvolvimento. Um dos principais aspectos da proposta é a criação de um novo órgão ligado ao Protocolo de Quioto, o Mecanismo de Redução das Emissões do Desmatamento das Florestas Tropicais, pelo qual um percentual mínimo das obrigações dos países do Anexo I com a redução nas emissões de gases de efeito estufa deveria ser cumprido com a compra de unidades do novo mecanismo.

Para evitar que a compra dessas unidades inunde o mercado, derrubando o preço do carbono, haveria um teto para a sua aquisição pelos países desenvolvidos. Se esse teto fosse de 3% do total de unidades que os países do Anexo 1 precisarão comprar na segunda fase de obrigações entre 2013 e 2018 (previsão), a venda de unidades vinculadas ao mecanismo das florestas resultaria numa receita anual de 14 bilhões de euros para as nações em desenvolvimento, com base no preço de 20 euros por tonelada de CO2 equivalente. O preço dessas unidades seria definido em leilões ou estaria atrelado ao mercado de Quioto. Eles não poderiam ser trocados com os créditos do MDL ou das permisssões européias. A estrutura de governança desse novo mecanismo cuidaria da distribuição dos benefícios auferidos às comunidades indígenas e Povos da Floresta.

O IPAM, o WHRC e a Universidade Federal de Minas Gerais, por sua vez, lançaram o documento “Os Custos e Benefícios da Redução das Emissões de Carbono Oriundas do Desmatamento e Degradação da Floresta na Amazônia Brasileira”, onde avaliam os custos de redução das emissões de carbono oriundas do desmatamento na Amazônia Brasileira e propõem compensações financeiras pela proteção da floresta a serem destinados aos Povos da Floresta, proprietários legítimos de terra e ao governo.

Os resultados do estudo indicam que mais de 90% dos custos envolvidos com a decisão de manter a floresta e não convertê-la a outros usos da terra (agricultura/soja e pecuária), pode ser compensado a um preço de US$ 3,00 a US$ 5,00 por tonelada de carbono ou a um valor total de US$ 257 bilhões. O relatório sugere, ainda, que um programa de redução do desmatamento pode trazer compensações como, por exemplo, dobrar a renda familiar dos povos da Amazônia e evitar prejuízos econômicos causados por incêndios florestais e queimadas, da ordem US$ 10 a US$ 80 milhões por ano.