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Juízes entram com ação no Supremo contra uso do amianto

Associações de magistrados e procuradores pedem inconstitucionalidade de lei federal que permite industrialização de mineral nocivo à saúde. De 1980 a 2003, morreram 2.414 no país. Por Henrique Gomes Batista e Cássia Almeida, do O Globo, 03/04/2008.

BRASÍLIA e RIO. A campanha contra o amianto no Brasil — onde é utilizado principalmente para a confecção de telhas e caixas d’água, apesar de ser um produto comprovadamente cancerígeno — ganhou força ontem. As associações nacionais dos Magistrados da Justiça do Trabalho (Anamatra) e dos Procuradores do Trabalho (ANPT) entraram com uma ação no Supremo Tribunal Federal (STF) para banir o uso do amianto no Brasil. São nos tribunais trabalhistas que estão concentradas as ações de exempregados da indústria que buscam indenização por doenças contraídas pelo amianto. Segundo dados da Fundação Oswaldo Cruz, houve 2.414 mortes por mesotelioma, câncer da pleura relacionado à exposição ao amianto, de 1980 a 2003.

A fibra mineral também causa asbestose (endurecimento do pulmão) e outras doenças do sistema respiratório. Segundo as entidades, cerca de um milhão de trabalhadores estão expostos aos riscos do material no Brasil.

— Hoje existem produtos, como os fios de PVA e o polipropileno (PP), substitutos seguros do amianto. O custo seria de 10% mais, algo que não justifica expor tantas pessoas a tantos riscos — argumentou Sebastião Caixeta, presidente da ANPT, lembrando que pode demorar até 40 anos para que as doenças se manifestem.

O artigo segundo da Lei nº 9.055, de 1995, permite extração, industrialização e utilização do amianto classificado como crisotila, o chamado branco — o tipo cinza, mais letal, é banido em todo o mundo. As duas associações foram ao STF para pedir a inconstitucionalidade do artigo.

Elas se baseiam na Convenção nº 162 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), ratificada pelo Brasil em 1990, que determina a substituição do amianto sempre que houver alternativas tecnológica e economicamente viáveis.

Trabalhadores dizem que milhares perderam emprego O amianto é proibido em 48 países no mundo, inclusive em toda a União Européia, Argentina, Uruguai, Chile, Costa Rica e Honduras. De acordo com Caixeta, a Organização Mundial de Saúde (OMS) emitiu resolução informando que não há níveis seguros para uso de substâncias cancerígenas como o amianto.

No país, há 27 leis estaduais e municipais contra o amianto, a grande maioria considerada inconstitucional pelo Supremo.

A justificativa é que a competência para regulamentar o tema é federal. Tramitam no STF seis ações diretas de inconstitucionalidade contra as leis de São Paulo (estado, suspensa por liminar, e cidade), Estado do Rio (duas), Pernambuco e Rio Grande do Sul.

— Nossa ação pode auxiliar na luta contra o amianto. Até agora o STF não pôde entrar no mérito da questão — disse Cláudio Montesso, presidente da Anamatra.

O advogado da ANPT, Mauro Menezes, acredita que a proibição do amianto no Brasil é questão de tempo. Ele cita o fato de que a maior parte dos países que proibiram o produto o fez depois que a lei brasileira permitiu o uso do material, ou seja, a permissão brasileira teria se antecipado a estudos que comprovaram os riscos do amianto.

Além dos moradores de Minaçu (GO), um dos locais de maior exposição, pois é onde fica a única mina ativa de amianto do país, os trabalhadores na construção civil, na indústria de material de construção e na confecção de roupas para bombeiros estão entre os que correm mais riscos.

STF ficou dividido, pela primeira vez, em setembro O presidente da Confederação Nacional dos Trabalhadores do Amianto (CNTI), Emílio Alves Ferreira Júnior, disse, por meio de nota, que “os trabalhadores deste segmento tiveram um ganho significativo com esta lei que complementou os acordos de uso seguro, controlado e responsável com os empresários”. Ele diz temer que haja desemprego: “Estamos temendo que milhares de trabalhadores da mina e do segmento de telhas de fibrocimento com uso de crisotila poderão perder o emprego de uma hora para outra, caso seja deferido o pedido de liminar”.

A CNTI é responsável pelas seis ações que tramitam no STF contra as leis estaduais.

Segundo a auditora fiscal do Trabalho e coordenadora da rede virtual pelo banimento do amianto, Fernanda Giannasi, a sessão do Supremo de setembro passado, ao julgar a ação contra a lei que baniu o amianto em São Paulo, foi um divisor de águas. O tribunal, que vinha derrubando todas as leis sobre o tema, dividiu-se pela primeira vez. O processo está com o ministro Joaquim Barbosa, que pediu vista na época: — O voto do ministro Eros Grau, a favor da lei paulista, e outros discursos mais simpáticos ao banimento mostraram que há espaço para essa ação no Supremo. A lei federal que permite o uso nunca foi questionada no STF.