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Mudanças climáticas: 97% dizem sentir aumento da temperatura em comunidades de SP

 

projeções do aquecimento global

Mudanças climáticas: 97% dizem sentir aumento da temperatura em comunidades de SP

Estudo analisou impactos locais da crise climática em comunidades na porção de Mata Atlântica no estado de São Paulo; sumiço de peixes e falta de chuvas também estão entre as consequências que já afetam o bem-estar, a saúde e as finanças das famílias

Do IPAM

Um estudo publicado na revista científica Regional Environmental Change analisou os impactos locais da crise climática global em comunidades localizadas na porção de Mata Atlântica no estado de São Paulo. O resultado foi que 97% das 105 famílias entrevistadas disseram já perceber o aumento da temperatura e outras consequências relevantes das mudanças climáticas como o sumiço de peixes no mar e a falta de chuvas. Pesquisadores defendem que a discussão sobre como cada região do país é afetada pela mudança no clima, com atenção às vozes de quem vive nesses locais, é fundamental para estratégias de adaptação e de redução de riscos.

“O debate sobre o clima se coloca de forma ampla entre países, com seus acordos e protocolos internacionais, mas sabemos que as mudanças climáticas têm impacto diretamente no bem-estar humano. É como se ainda existisse uma insensibilidade da própria experiência humana nesse contexto, que se debruça sobre fatores climatológicos e serviços ecossistêmicos. Por isso, no artigo, colocamos a lente climática sobre experiências reais, para entender em que extensão as pessoas estão sentindo a mudança ambiental”, diz Patrícia Pinho, diretora adjunta de pesquisa no IPAM (Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia) e autora principal do estudo.

 

A pesquisa considerou diferentes contextos ambientais em regiões de bacias hidrográficas do estado. Participaram comunidades caiçaras do Parque Estadual da Ilha do Cardoso, em Cananéia; cooperativas e pequenos produtores de Corumbataí; e agricultores de Monteiro Lobato, no Vale do Paraíba. Com economia centrada na pesca e no turismo, Cananéia abriga 60% dos remanescentes florestais da Mata Atlântica e a Ilha do Cardoso tem 81% de seu território coberto por vegetação nativa. Já Corumbataí é uma região de base agropecuária, tendo 7% da cobertura de vegetação original. A indústria é a principal atividade econômica em Monteiro Lobato, que tem ⅓ da vegetação nativa, em uma região que é fonte de água para os estados de São Paulo e Rio de Janeiro.

Os impactos relatados foram categorizados em relação aos serviços ecossistêmicos prestados pela natureza: de regulação climática, de provisão de alimentos e de subsídio às relações socioculturais. Quanto à regulação climática, os danos ao equilíbrio do clima local, à qualidade da água e do ar foram os mais citados pelas pessoas entrevistadas. No âmbito da provisão de recursos, a escassez de peixes no mar, a piora nas condições climáticas para a lavoura e para a criação de animais, a falta de água fresca e de alimentos na natureza estão entre os problemas mais citados. E no aspecto sociocultural, prejuízos aos sentimentos de pertencimento e de inspiração à natureza foram lembrados, bem como turismo e heranças culturais.

 

As percepções sobre como o bem-estar humano é afetado diante das mudanças climáticas se assemelham nas localidades. Em Cananéia, 37,9% das pessoas entrevistadas relataram perceber impactos das mudanças climáticas na saúde. Também são percebidos impactos na insegurança econômica (31%) e em danos à infraestrutura (10,3%). Em Corumbataí são 44,8% que percebem danos à saúde, 17% mencionaram a insegurança econômica e 6,9% a infraestrutura – além de 7% que apontaram maior incidência de doenças. Em Monteiro Lobato a insegurança econômica foi o fator mais apontado: 33%, seguido pela saúde (18%), disponibilidade de água fresca (9%) e danos à infraestrutura (6%). Em todas as entrevistas, somente 5,7% das pessoas relataram não ter observado mudanças relacionadas ao clima.

“Desde o aumento na temperatura dos oceanos, que impacta a reprodução de peixes e de ostras, até a degradação de paisagens pelo avanço de commodities, o que une todos os casos é que as mudanças climáticas já são um fator preponderante. As pessoas percebem no dia a dia a variabilidade climática em jogo. Estamos vivenciando uma perda gigantesca de serviços ecossistêmicos, de floresta, de biodiversidade, e isso tem afetado a vida da população, seu bem-estar, suas relações sociais e seus modos de vida coletivos. É uma realidade que coloca em pauta, inclusive, a matriz econômica e as maneiras que a gente pensa o desenvolvimento”, conclui Pinho.

Referência:

Pinho, P.F., Canova, M.T., Toledo, P.M. et al. Climate change affects us in the tropics: local perspectives on ecosystem services and well-being sensitivity in Southeast Brazil. Reg Environ Change 22, 89 (2022). https://doi.org/10.1007/s10113-022-01938-8

 

in EcoDebate, ISSN 2446-9394

 

 

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