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Desmentindo as notícias falsas (fake news) sobre vacinas

 

Desmentindo as notícias falsas (fake news) sobre vacinas

JORNAL DA UNICAMP
TEXTO LUIZ CARLOS DIAS | INSTITUTO DE QUÍMICA
FOTOS ANTONIO SCARPINETTI | REPRODUÇÃO PIXABAY
EDIÇÃO DE IMAGEM PAULO CAVALHERI

Uma pesquisa do instituto Ibope, publicada no dia 7/9/2020 mostra que cerca de 20% da população brasileira pode não se vacinar contra a Covid-19, quando uma vacina estiver disponível, e 5% dizem que não vão tomar a vacina de jeito nenhum, enquanto 75% afirmam que vão se vacinar quando um imunizante seguro e eficaz estiver disponível. Entre os milhões de brasileiros que afirmam que não vão tomar a vacina, cerca de 34% declaram acreditar em pelo menos uma das notícias falsas (fake news) listadas abaixo como razão para não se vacinar. Mesmo considerando algumas falhas no levantamento, o número de pessoas que pretende não se vacinar pode ser realmente elevado e vemos nas redes sociais um criminoso movimento antivacinas crescendo no país, como mostram grupos com milhares de membros no Facebook.

Uma outra pesquisa, publicada no dia 10/10/2020 pelo Instituto Datafolha, mostra que pouco mais de 70% das populações de São Paulo, Rio de Janeiro, Belo Horizonte e Recife defendem a obrigatoriedade da vacinação contra a Covid-19 e cerca de 75% em média afirmaram que vão se vacinar. Novamente, cerca de 20-25% das populações destas quatro capitais afirmam que não vão se vacinar ou ainda estão em dúvida. Esses dados são preocupantes, pois é preciso uma adesão em massa da população para que o número de pessoas imunizadas e protegidas pela vacina seja suficiente para fazer o Sars-CoV-2, vírus que causa a Covid-19, parar de se espalhar, atingindo a tão falada imunidade coletiva.

Um outro estudo do Avaaz mostrou que, entre 2019 e 2020, notícias falsas publicadas no Facebook, relacionadas à área de saúde, foram acessadas cerca de 3,8 bilhões de vezes apenas nos Estados Unidos, Reino Unido, França, Alemanha e Itália. Um cenário preocupante é que este número é cerca de quatro vezes maior quando comparado aos acessos de notícias confiáveis e seguras de contas de dez grandes instituições de saúde, entre elas a Organização Mundial da Saúde (OMS) e o Centro de Controle e Prevenção de Doenças (CDC) dos EUA. O Facebook adotou medidas para inibir a disseminação de notícias falsas e grupos antivacinas abriram um processo contra  a rede social.

Entre as notícias falsas mais comuns declaradas como razões para não se vacinar são:

  • As vacinas não são seguras;
  • Receio de tomar a vacina e se contaminar com o novo coronavírus;
  • A vacina pode causar outras doenças, como autismo;
  • Bill Gates teria dito que a vacina pode matar cerca de 700 mil pessoas;
  • A vacina da Covid-19 contém chips implantados para controle populacional;
  • A vacina poderia alterar o DNA;
  • As vacinas são produzidas a partir de células de fetos abortados.

fake news

A disseminação de notícias falsas sobre vacinas é um ato criminoso e irresponsável. Vacinas salvam bilhões de vidas e se estamos aqui hoje é graças às vacinas, que junto com alimentação, esgoto tratado e água potável, são as melhores ferramentas de saúde pública. As vacinas serviram para erradicar ou manter doenças sobre controle.

Precisamos agir para combater as notícias falsas e distribuir nas mesmas redes sociais em que circulam essas mensagens com desinformação, notícias com informação científica correta, para que as mesmas pessoas que receberam fake news e desinformações tenham contato com notícias com informações confiáveis. Tudo isso sem violar a privacidade e a liberdade de expressão. Nós seremos em breve atingidos por uma onda gigantesca de mentiras sobre as vacinas e é preciso combater este movimento para evitar a maior campanha de desinformação da história, que pode levar a população a desconfiar das vacinas e levar a perdas irreparáveis em futuras campanhas de vacinação em massa. Nós não podemos correr riscos de perder décadas de progresso no combate a doenças que podem ser prevenidas. Um artigo publicado no dia 7/10/2020 na revista The American Journal of Tropical Medicine and Hygiene dá uma ideia do terrível impacto da infodemia e das teorias da conspiração na saúde pública em termos do aumento do número de casos e de mortes de Covid-19.

PODERIA EXISTIR UM MUNDO SEM VACINAS?

A Covid-19 abalou o planeta e ainda não temos vacinas. É impensável imaginar um mundo com doenças como varíola, poliomielite ou paralisia infantil, meningite meningocócica, coqueluche, sarampo, catapora, difteria, febre amarela, tétano, rubéola, diarreia por rotavírus, caxumba, tuberculose, hepatites A e B, HPV, influenza, pneumonia, raiva, entre outras, e sem vacinas.

Antes de você compartilhar notícias que chamam a atenção, sem fonte, converse com seu médico ou com especialistas, procure fontes verdadeiras, não confie em achismos e nem na pseudociência.

Na sequência, são apresentadas algumas considerações sobre as principais fake news que circulam nas redes sociais envolvendo vacinas. Para mais informações, visite o site da iniciativa União Pró-Vacina – UPVacina e aqui.

AS VACINAS NÃO SÃO SEGURAS: Não é verdade!

As vacinas, uma vez aprovadas para uso em massa, são seguras e eficazes. As vacinas são desenvolvidas com base na necessidade de se proteger a população de doenças fatais e que provocam incapacitação. As vacinas salvam cerca de 3 milhões de pessoas por ano, ou 5 pessoas a cada minuto, são responsáveis pelo aumento da nossa expectativa de vida e foram as principais responsáveis pela diminuição da mortalidade infantil. No Brasil dos anos 1950, cerca de 10% das crianças morriam antes dos primeiros cinco anos de vida. A varíola matou cerca de 350 milhões de pessoas no século 20 e graças às vacinas nós erradicamos a varíola do planeta e não vemos mais nenhum caso desde 1979. A paralisia infantil (poliomielite) está sob controle desde 1989, quando foi eliminada das Américas. Outras doenças como sarampo, catapora, caxumba, rubéola, tétano, difteria, rotavírus, coqueluche, meningite meningocócica, estavam controladas. Nós possivelmente não estaríamos aqui, vivos e bem, em um mundo com tantas doenças, mas sem vacinas.

Só existem algumas poucas contraindicaçõespara vacinas de vírus vivo ou atenuado, em pacientes que têm problemas de imunidade, que tomam algum medicamento que reduz a imunidade do organismo, ou que tem comorbidades mais sérias. As vacinas contêm o princípio ativo (antígeno), que provoca a resposta imune, algumas contém adjuvantes, como sais a base de alumínio (fosfato de alumínio e hidróxido de alumínio) ou esqualeno, polissorbato 80 e alfa-tocoferol, para ajudar na resposta imunológica e conservantes, como neomicina, compostos que previnem o crescimento de outros microrganismos, como bactérias e fungos.

Os adjuvantes ajudam na intensidade e na duração da resposta imune, permitem que doses menores do antígeno sejam usadas e ajudam a aumentar a estabilidade das vacinas durante o armazenamento. Tanto o princípio ativo, bem como os adjuvantes e os conservantes, estão presentes em quantidades muito pequenas nas vacinas, são seguros e são eliminados do organismo, como qualquer medicamento, comida e bebidas que ingerimos. Algumas vacinas mais antigas usavam o tiomersal (etil mercúrio), nunca o mercúrio elementar, como conservante em sua composição para evitar a proliferação de bactérias e fungos. Não há nenhuma evidência de que o tiomersal seja tóxico aos humanos e de que se acumule no corpo nas pequenas quantidades encontradas em vacinas, uma vez que é facilmente excretado pelos rins. Apesar de seguro, o tiomersal foi substituído por outros conservantes e não é mais usado em vacinas. O benefício de tomar uma vacina é sempre muito maior que o risco, que é mínimo ou inexistente.

RECEIO DE SE CONTAMINAR COM O NOVO CORONAVÍRUS: Não é verdade!

O novo coronavírus ativo não está presente nas vacinas, nem na candidata vacinal CoronaVac, da chinesa Sinovac, que usa o vírus inativado, incapaz de se replicar no corpo humano e causar doença.

Todas as vacinas, independente da nacionalidade, se da China, EUA, Reino Unido, Rússia ou qualquer outro país, devem passar por um processo longo de desenvolvimento antes de serem aprovadas e todas, sem exceção, seguem os mesmos protocolos de testes. As vacinas precisam passar por testes rigorosos em várias fases para garantir que sejam eficazes e seguras. Normalmente, o período para desenvolver uma vacina segura e eficaz, desde as etapas iniciais até a vacina ser aprovada para ser distribuída para a população é de 10 a 12 anos, mas pode até levar mais tempo. Primeiro, é preciso estudar e entender a doença, descobrir o micro-organismo (agente infeccioso) que causa a doença, se vírus, parasita, bactéria, sequenciando o seu genoma. Uma vez identificado, no caso das vacinas de primeira geração, é preciso neutralizar (inativar) ou atenuar (enfraquecer) o micro-organismo. No caso dos micro-organismos atenuados, é preciso confirmar se eles conseguem levar à produção de anticorpos neutralizantes e células de memória capazes de proteger contra a infecção.

As candidatas vacinais devem passar por uma fase pré-clínica em animais, (ratos, camundongos, hamsters, macacos), na qual se testa a segurança. Se passam nessa fase, entram nas fases de avaliação clínica em seres humanos, as chamadas fases 1, 2 e 3. A fase 1 envolve um pequeno grupo de voluntários saudáveis, onde se avalia a segurança, o aparecimento ou não de efeitos colaterais adversos e a capacidade de gerar imunização (imunogenicidade). Se bons resultados são obtidos, a candidata passa para a fase 2, agora com centenas de participantes, coletando informações sobre segurança, doses, horários, modos de administração e novamente a imunogenicidade. Passando pelos rigores da fase 2, entra em fase 3 com milhares de voluntários de vários países, ambientes, grupos sociais, uma amostragem bem diversificada de pessoas de diferentes faixas etárias e sexo.

A fase 3 é a mais importante e fornece resposta definitiva da eficácia, da resposta de proteção e de segurança. A fase 3 envolve estudos randomizados, com grupo placebo e duplo-cego, o que significa que nem os médicos e pesquisadores aplicando as candidatas vacinais e o placebo sabem quem é quem e nem os pacientes sabem se tomaram a candidata vacinal ou o placebo, que se parece com a candidata vacinal. Todos os voluntários nos dois grupos estão expostos e sujeitos à infecção. A realização da fase 3 no Brasil depende de aprovação das agências regulatórias locais, como o CONEP (Comissão Nacional de Ética e Pesquisa) e a ANVISA (Agência Nacional de Vigilância Sanitária). O nível de exigência é elevado, segue protocolos rígidos, mas se a candidata vacinal se mostra segura e eficiente, é aprovada e após registro, que no Brasil é coordenado pela ANVISA, pode ser produzida em larga escala e distribuída para a população. Isso leva tempo. A vacina da caxumba foi uma das mais rápidas desenvolvidas até hoje e levou cerca de 4,5 anos.

AS VACINAS CAUSAM DOENÇAS: Não é verdade.

As vacinas são um marco na história da saúde humana, não causam a doença que estão combatendo e nem outras doenças. Em alguns casos raros, o vírus atenuado (enfraquecido) pode causar sintomas similares ao da doença, pois as vacinas de vírus atenuados contêm o vírus viável, mas enfraquecido, sendo incapaz de causar uma infecção como aquela causada pelo vírus selvagem ao qual a maioria da população está exposta. O objetivo de vacinar é induzir uma resposta do organismo através da introdução de um corpo estranho ou um micro-organismo (o antígeno), que não cause mal, mas que engane o sistema imune de forma que esse produza uma resposta em termos de produção de anticorpos (resposta humoral) e células citotóxicas (reposta celular com produção de células T de memória). Assim, o sistema imune fica treinado e gera uma memória imunológica, para o momento em que tiver contato com o micro-organismo selvagem real (vírus, bactéria, parasita) possa produzir uma resposta imune eficiente, gerando uma memória imunológica.

Ter inchaço, dores no local, dor de cabeça, cansaço físico, um pouco de febre é normal e desejado, pois é o seu organismo produzindo resposta imunológica para combater aquele corpo estranho. Quando você tiver contato com o vírus selvagem real, seu organismo estará treinado e pronto para produzir os anticorpos para te proteger. Como os vírus sofrem mutações, é importante atualizar a vacinação, como no caso da gripe, pois o nosso sistema imune, mesmo imunizado contra o vírus do ano passado, não conseguirá reconhecer o vírus deste ano. Com certeza, considerando a proteção contra doenças tão graves, esses pequenos efeitos colaterais adversos são aceitáveis.

AS VACINAS CAUSAM AUTISMO: Não é verdade.

As vacinas servem para prevenir doenças e não causam doenças. A mentira de que vacinas causam autismo foi criada em 1998 pelo ex-médico britânico Andrew Wakefield, quando publicou um artigo nada científico na revista The Lancet, relacionando a vacina da Tríplice Viral (sarampo, caxumba e rubéola) com casos de autismo em crianças. Posteriormente, foi comprovado que não havia absolutamente nenhuma evidência de que vacinas causem autismo e esse artigo foi retratado (despublicado). O estudo foi considerado totalmente antiético, repleto de informações falsas e o abominável. Wakefield teve sua licença de médico cassada pelo Governo, mas a repercussão causou enorme estrago na saúde pública no Reino Unido, levando a um aumento no número de casos de sarampo e caxumba desde sua publicação. Desde então, teve início o famigerado e criminoso movimento antivacinas, que presta um enorme desserviço à saúde pública. Não se vacinar contra sarampo pode levar à morte e a complicações muito graves do sistema nervoso central, causando encefalite.

O BRASIL QUER VACINAR OS ADOLESCENTES CONTRA HPV PARA DIMINUIR A POPULAÇÃO: Não é verdade.

A vacina contra HPV é ótima e é usada para prevenir casos de câncer de pênis, anal, vagina, vulva e outros. A vacina deve ser aplicada em meninos e meninas e é fundamental para diminuir casos de câncer e para termos gestações saudáveis.

BILL GATES TERIA DITO QUE A VACINA PODE MATAR CERCA DE 700 MIL PESSOAS: Não é verdade, vacinas salvam vidas, não matam.

O nome do bilionário Bill Gates é um dos preferidos do movimento antivacinas e alguns grupos religiosos. Embora tenha criado sua fortuna no ramo de desenvolvimento de softwares com a Microsoft, o empresário fundou a fundação filantrópica Bill e Melinda Gates, que vem apoiando e financiando projetos humanitários em várias ações de saúde pública, incluindo o desenvolvimento e distribuição de vacinas. Essa mentira espalhada pelo movimento antivacinas sugere que quando se injeta vacinas com vírus nas pessoas, quem tem boa imunidade sobrevive e quem tem imunidade mais baixa, morre. É um completo absurdo.

O nome de Bill Gates também está associado a um plano que teria originado a Covid-19, em virtude de uma observação dele em uma palestra em um TED talk em 2015, com o título: “O próximo surto? Não estamos preparados” , em que ele descrevia o risco de a humanidade enfrentar uma pandemia e como seria o cenário. Além da teoria de conspiração, que relaciona o nome de Bill Gates a controle populacional e ao surgimento da Covid-19, outra bastante associada ao seu nome é a de implantação de microchips para monitorar a população. Essa teoria surgiu pelo fato dele ter comentado sobre a possibilidade de aplicação de uma tinta invisível nanotecnológica na pele para registrar as vacinas aplicadas no paciente, como se fosse uma carteirinha de vacinação.

Segundo o movimento antivacinas, a pandemia de Covid-19 seria então aproveitada para implantar microchips na população mundial através das vacinas, permitindo o controle das pessoas com antenas 5G e não permitindo que as pessoas com chips implantados atravessassem os portões do céu. Fato é que Bill Gates apenas comentou sobre a possibilidade de termos alguns “certificados digitais” ​​para mostrar quem já se recuperou de um caso da Covid-19, foi testado ou recebeu a vacina, sem nenhuma menção a microchips e muito menos à tecnologia 5G. É muita criatividade dos defensores do movimento antivacinas, que poderia estar sendo usada, ao contrário, para promover o bem.

VACINAS SÃO USADAS PARA CONTROLE POPULACIONAL: Não é verdade.

As vacinas nunca foram usadas para controle populacional e não causam infertilidade. Esta tese provavelmente teve origem em uma das tantas teorias de conspiração envolvendo o nome de Bill Gates e um projeto da fundação Bill e Melinda Gates de conscientização pelo planejamento familiar na África. Algumas alas da Igreja Católica, juntamente com o forte movimento antiaborto presente na África e nos EUA, disseminaram mentiras sobre hormônios sendo injetados em vacinas antitetânicas em mulheres africanas, para controle populacional. Estas informações foram desmentidas, mas como sempre, trouxeram à tona mais uma fake news que só vem atrapalhando as campanhas vacinais em uma população desinformada.

UM CORPO SADIO NÃO PRECISA DE VACINAS: Não é verdade.

Nós adquirimos imunidade inata com o leite materno, que não nos protege de todas as doenças. Se nós estamos aqui hoje escrevendo e lendo essa matéria, é graças as vacinas que tomamos enquanto crianças. A imunização provoca uma resposta imune adaptativa (anticorpos e linfócitos de memória) através da inoculação de antígenos. Uma pessoa só está imune à uma doença se produzir anticorpos e linfócitos de memória. Hábitos saudáveis podem auxiliar na resposta imune eficaz, mas não imunizar.

VACINAS SÃO PREPARADAS COM FETOS ABORTADOS: Não é verdade.

Esta é uma das maiores mentiras criadas pelo movimento antivacinas e explora o aborto, um tema sensível e um tabu da nossa sociedade. Tivemos vacinas que continham o vírus que foi cultivado em células fetais humanas, mas fetos abortados nunca fizeram e não fazem parte da composição de nenhuma vacina. Não se usam fetos abortados nesse processo, as células humanas fetais, como a HEK-293, são cópias de células imortalizadas de um tecido coletado em 1972. Hoje, as células usadas na produção de algumas vacinas não são mais as mesmas das originais, o tecido coletado em 1972 deu origem a outras gerações, que são chamadas de células imortalizadas, são replicadas apenas in vitro, sendo usadas na produção do agente infeccioso. Essas células são utilizadas na produção dos vetores virais de vacinas, como os adenovírus modificados.

NÃO PRECISO ME VACINAR SE OUTRAS PESSOAS SE VACINAM: Não é verdade.

A vacinação em massa, quando atinge grande número de pessoas, protege as pessoas saudáveis e as vulneráveis contra quaisquer infecções, como idosos, bebês, imunodeficientes e imunossuprimidos, como pessoas com câncer ou HIV. Essa proteção, chamada de imunidade coletiva, somente é eficaz quando uma grande parcela da população está imune, quando a cobertura vacinal atinge cerca de 92-95% da população, que assim fica protegida, evitando a disseminação de doenças. Dessa forma, é essencial que todos aqueles indivíduos que possam ser vacinados sejam, de fato, vacinados para proteger aqueles que não podem se vacinar. Quando uma grande quantidade de pessoas estiver vacinada, nós evitamos a circulação do vírus selvagem nos “buracos” onde houver pessoas que não foram vacinadas.  Quanto mais pessoas se vacinarem, menores as chances de surtos e novas ocorrências de determinada doença em uma população.

PODEM SER USADAS SERINGAS CONTAMINADAS COM HIV NA APLICAÇÃO: Não é verdade.

São sempre usadas seringas e agulhas descartáveis, abertas na hora e na frente da pessoa que vai ser vacinada. É um absurdo falar isso, uma enorme irresponsabilidade e falta de respeito e consideração com os nossos valorosos profissionais da saúde.

vacina Covid-19

ESSAS DOENÇAS JÁ FORAM ERRADICADAS OU JÁ IAM DESAPARECER: Não é verdade.

A cobertura vacinal (vacinação em massa) é a melhor estratégia para prevenção de doenças, pois é nos “buracos” dessa cobertura, onde temos pessoas não vacinadas, que os vírus e bactérias circulam. É por causa das estratégias de imunização coletiva que doenças comuns há anos, que matavam milhões de crianças, hoje são raras. Imaginem que, se por acaso, um vírus selvagem, de uma doença já controlada, estiver inoculado em algum local e encontrar uma pessoa já vacinada contra ele, uma possível epidemia terminaria ali mesmo. Imaginem agora que esse vírus selvagem encontra uma pessoa não vacinada, um primeiro hospedeiro suscetível. Ele infecta essa pessoa, mas se todos no entorno dessa pessoa estiverem vacinados e protegidos, a doença termina ali, naquela pessoa infectada e não é transmitida. Negligenciar a vacinação ou não se vacinar pode causar a volta de doenças eliminadas. No Brasil, até 2016, não havia casos de sarampo, uma vez que a cobertura vacinal estava acima de 95%. Em 2017, quando caiu para 91%, um novo surto da doença surgiu, causando mais de 18 mil casos e 18 mortes, entre 2018 e 2019.

AS VACINAS SÓ BENEFICIAM AS INDÚSTRIAS FARMACÊUTICAS: Não é verdade.

As vacinas previnem doenças, evitam que você fique doente, enquanto medicamentos, que são a maior fonte de renda para as indústrias farmacêuticas, servem para tratar doenças, muitas delas que não foram evitadas por vacinas, ou porque não temos vacinas que evitem essas doenças. Então, esta é uma narrativa absurda. A vacinação, diferente do que dizem, não é uma estratégia lucrativa para a indústria farmacêutica, em comparação aos medicamentos, porque quando você evita que a pessoa fique doente, você reduz a necessidade de tratamento com medicamentos. Aquele velho ditado, que diz que é mais barato prevenir do que remediar, é verdadeiro.

VACINAS CONTÉM UM COMPONENTE CHAMADO LUCIFERASE: Não é verdade!

Os grupos antivacinas disseminaram a mentira de que vacinas contém a enzima luciferase em sua composição, associando as vacinas com a marca da besta. Claro que ao ler o nome luciferase, logo vem à mente a lembrança de Lúcifer. A palavra luciferase é derivada do latim lux fero, que significa portador de luz. A luciferase foi caracterizada pelo cientista francês Raphaël Dubois, por sua função no mecanismo de bioluminescência (emissão de luz por seres vivos), sendo a enzima responsável por catalisar a linda reação biológica de oxidação da luciferina por oxigênio, transformando energia química em energia luminosa e fazendo com que vagalumes brilhem no escuro. A luciferase não faz parte da composição de nenhuma vacina.

VACINAS GENÉTICAS ALTERAM NOSSO DNA: Não é verdade.

Esta teoria sem fundamento teve origem em uma declaração da osteopata americana Carrie Madej, que afirmou em um vídeo na internet que “esta tecnologia vai criar uma nova espécie e, talvez, destrua a nossa”. As vacinas de DNA e RNA não alteram o nosso material genético e não nos transformam em espécies diferentes. O DNA é o material genético que codifica as nossas características, as funções de nosso organismo e tem milhares de genes presentes em cada célula do nosso corpo. O DNA é lido (transcrito) no núcleo de nossas células pela maquinaria celular gerando o mRNA (RNA mensageiro), que é transportado para o citoplasma e lido por um conjunto de estruturas chamadas ribossomos, que transformam a informação do mRNA em proteínas.

As vacinas de DNA inserem no nosso organismo, apenas um pedaço muito pequeno do DNA, chamado de plasmídeo, onde ocorrem modificações e inserções de genes do próprio agente causador da doença (patógeno). Quando ocorrer a introdução da vacina de DNA no nosso organismo, normalmente através de um processo conhecido como eletroporação, este pedaço de DNA será lido pela maquinaria celular no núcleo de células do paciente, produzindo a proteína codificada pelo gene, que esperamos seja reconhecida como estranha pelo sistema imune, induzindo imunidade contra aquela proteína.

Nas vacinas de RNA, o mRNA é incorporado em nanopartículas lipídicas (gorduras), que carregam a fita de mRNA para dentro do citoplasma. Elas seguem um princípio muito semelhante às vacinas de DNA, mas não necessitam que o mRNA seja inserido no núcleo, visto que a tradução dessa molécula é realizada no citoplasma. Não existe possibilidade de que vacinas de DNA e de mRNA alterem nosso DNA, pois não são inseridos dentro do genoma humano e não vão nos tornar seres humanos geneticamente modificados.

ENFIM, O PRESIDENTE DISSE QUE NINGUÉM É OBRIGADO A SE VACINAR, MAS respeitar a vacinação é uma questão de responsabilidade social, coletiva, empatia e respeito à vida. Quando você está vacinado, está protegido e isso ajuda a proteger quem eventualmente não pôde se vacinar. É preciso uma campanha nacional forte de conscientização para mostrar para a sociedade que vivendo em coletividade, vacinar é necessário.

O Brasil sempre foi modelo de vacinação em massa, não podemos perder isso.

Luiz Carlos Dias é Professor Titular do Instituto de Química da Unicamp, membro titular da Academia Brasileira de Ciências (ABC), Comendador da Ordem Nacional do Mérito Científico e membro da Força-Tarefa da UNICAMP no combate à Covid-19.

in EcoDebate, ISSN 2446-9394, 21/10/2020

 

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