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Artigo

O pior octênio (2009-16) da economia brasileira em 116 anos, artigo de José Eustáquio Diniz Alves

 

“O progresso é impossível sem mudança.
Aqueles que não conseguem mudar as suas mentes não conseguem mudar nada”
George Bernard Shaw

 

151021

 

[EcoDebate] Não há mais como esconder que a estagflação da economia brasileira é real, está causando muitos danos e vai gerar mais sofrimento nos próximos anos. O Produto Interno Bruto (PIB) do Brasil teve queda de 1,9% no segundo trimestre de 2015 contra o trimestre anterior e de 2,6% na comparação com o segundo trimestre de 2014. A cada semana, o boletim Focus do Banco Central aumenta o tamanho da recessão do biênio do segundo mandato da atual gestão do governo federal.

A crise vai se prolongar, pois, além do grande tompo de 2015, o ano de 2016 deve ser o segundo ano consecutivo de recessão. Com os enormes déficits no orçamento público e em transações correntes (mais a incapacidade do governo de governar e do legislativo de legislar) a crise deve ir longe, indicando um nova década perdida, pois estamos caminhando para a maior crise da história brasileira. O Brasil está numa armadilha fiscal, pois não consegue cortar gastos e nem aumentar impostos, enquanto os juros sobem e aumentam o déficit nominal. Recessão com aumento de juros é uma política que não está prevista nos manuais de economia.

A situação atual constrata com as altas taxas de crescimento do século XX, quando o Brasil apresentou uma das mais elevadas taxas de crescimento econômico e demográfico do mundo. A população brasileira era de 17,4 milhões de habitantes em 1900 e deve chegar a 206 milhões de habitantes em 2016, segundo as projeções do IBGE. Isto quer dizer que houve um crescimento demográfico de 11,8 vezes em 116 anos, o que representa um aumento de 2,2% ao ano.

No mesmo período, a economia brasileira cresceu 184,6 vezes, o que representa um aumento de 4,6% ao ano, segundo a série histórica de crescimento do PIB do IPEA e atualizado pela nova série de cálculo das Contas Nacionais, divulgada pelo IBGE, em março de 2015 (e considerando um variação do PIB de -3% em 2015 e -1,5% em 2016).

A renda per capita brasileira cresceu 15,6 vezes em 116 anos, o que representa 2,4% ao ano, no período. O FMI projeta uma renda per capita (em poder de paridade de compra – ppp) de US$ 16,2 mil em 2016. Ou seja, se o Brasil mantivesse o mesmo desempenho do passado, nos próximos 116 anos, poderia se tornar uma das nações mais ricas do mundo no século XXII. Porém, há diversos sinais que isto não deve acontecer.

O gráfico acima mostra as taxas anuais de crescimento do PIB entre 1901 e 2016 (linhas azuis) e a média móvel de oito anos – octênio (linha vermelha). A economia brasileira apresentou resultados negativos na primeira metade do século XX nos seguintes anos: 1902, 1908, 1914, 1918, 1930, 1931, 1940 e 1942. O único biênio de recessão foi em 1931 e 1932. Na segunda metade do século XX houve declínio do PIB nos anos de 1981 e 1983 (governo Figueiredo), pequena recessão em 1988 (governo Sarney) e outra enorme recessão em 1990 e 1992 (governo Collor). No século XXI houve uma pequena recessão em 2009 (governo Lula) e está previsto uma nova recessão no biênio 2015 e 2016 (governo Dilma). Só duas vezes na história, deste período de 116 anos, houve recessão por dois anos consecutivos.

Considerando a média móvel de 8 anos, em todo o período, o atual octênio (2009-2016) deve ser o que apresenta o pior resultado, seguido pelo octênio que cobre os governos Sarney e Collor. Todos os octênios entre 1901 e 1987 apresentaram crescimento médio anual acima de 2,9% ao ano. Até hoje, o pior octênio tinha sido o de 1987-1994 que apresentou crescimento médio de 1,56% ao ano. Todavia, se as previsões estiverem aproximadamente corretas (PIB de -3% em 2015 e de -1,5% em 2016) o octênio 2009-2016, com crescimento médio anual de 1,37%, será aquele de pior desempenho dos últimos 116 anos.

Segundo as projeções do IBGE, a população brasileira era de 193,5 milhões de habitantes em 2009 e deve ficar com 206 milhões em 2016, o que representa um crescimento de 0,8% ao ano no octênio em questão. Assim, o crescimento da renda per capita deve ficar em 0,6% ao ano, bem abaixo da média histórica de 2,4% nos 116 anos considerados. Neste ritmo, a renda per capita só dobraria em um espaço superior a 100 anos (sendo que no século XX a renda per capita brasileira foi multiplicada por um fator de 12,3 vezes).

Mas o quadro é ainda mais grave, pois no último sexênio (2011-2016) o crescimento do PIB ficou em 0,64% ao ano, abaixo do crescimento populacional. O Brasil deve ter redução da renda per capita entre 2011 e 2016 (como veremos em outro artigo). Ainda mais agravante, no último quinquênio (2012-2016) o crescimento do PIB deve ser nulo, enquanto o crescimento populacional deve ficar em 0,8%. Ou seja, vai ocorrer decrescimento acentuado da renda per capita no quinquênio entre 2012 e 2016.

De fato as condições macroeconômicas do país não são favoráveis. A inflação está bem acima do limite superior da meta do Banco Central. A dívida pública está crescendo em ritmo alarmante. O governo não consegue gerar um superávit primário para pagar parte do déficit nominal. A carga tributária brasileira já está em níveis elevadíssimos. O déficit em transações correntes deve cair um pouco este ano de 2015, mas ainda está em um montante que exige grande aporte de capital externo. O Brasil já perdeu o selo de bom pagador pela Standard & Poor’s e está no rumo de perder o grau de investimento em outras agências, o que deve dificultar a capitação de recursos externos. O endividadmento das empresas brasileiras em dólar é alarmante. A subida do dólar pressiona a inflação que pressiona os juros. Todo o ambiente econômico aponta para uma recessão e o agravamento do desemprego, com um colapso da população ocupada no mercado de trabalho. As exportações poderiam ser o caminho para ativar a atividade produtiva, mas a crise internacional e a queda do preço das commodities está fazendo o valor das exportações cairem de US$ 256 bilhões em 2011 para algo em torno de US$ 190 bilhões em 2015. Cai, conjuntamente, a taxa de investimento, as expectativas dos empresários e o nível de confiança dos consumidores.

Nos primeiros 87 anos do século XX todos os octênios tiveram média acima de 2,9% (como visto), sendo que os octênios de 1968-75, 1969-76 e 1970-77 apresentaram crescimento médio anual de 10%. Contudo, nas últimas 3 décadas, houve 7 octênios com crescimento médio anual abaixo de 2% e apenas 2 octênios com média de crescimento pouco acima de 4%. Sem querer ser pessimista, pode ser que o octênio que vai 2011 a 2018 apresente crescimento, de forma inédita, abaixo de 1% ao ano.

Assim, antecipando o fim do bônus demográfico, parece que o Brasil está flertando definitivamente com o baixo crescimento. Além da crise do mercado de trabalho, o país tem aumentado as dívidas gêmeas (interna e externa) e entrado numa situação de baixa produtividade permanente dos fatores de produção. Isto inviabiliza qualquer tipo de recuperação que não seja “vôo de galinha”.

O Brasil está na situação em que os economistas chamam de “Dominância fiscal”. É um quadro em que o desarranjo das contas públicas se auto-alimenta e as políticas monetárias e de renda perdem a capacidade de conter a inflação via aumento dos juros. Aliás, os juros altos só agravam as finanças públicas, aumentando valor da dívida e tornando ineficazes as propostas de ajuste fiscal. Ou seja, o Brasil entrou em uma situação de “déficit primário crônico” e como não possui governança para mudar a situação, a crise econômica tende a se agravar. Segundo Nouriel Roubini (FSP, 13/10/2015): “O Brasil está a beira do precipício”.

Por tudo isto, os brasileiros já estão assistindo a inesperada interrupção do crescimento econômico de longo prazo – caindo na estagnação do rendimento per capita – muito antes de ficar rico e ter uma estrutura etária envelhecida. Ou dito de outra forma, no ritmo atual, o país pode ficar preso na armadilha da renda média ou entrar em um período de submergência, apequenamento e empobrecimento. O Brasil, considerando os padrões internacionais, poderá jamais superar a condição de nação subdesenvolvida, carente e tristemente desigual em termos sociais.

 

José Eustáquio Diniz Alves, Colunista do Portal EcoDebate, é Doutor em demografia e professor titular do mestrado e doutorado em População, Território e Estatísticas Públicas da Escola Nacional de Ciências Estatísticas – ENCE/IBGE; Apresenta seus pontos de vista em caráter pessoal. E-mail: jed_alves@yahoo.com.br

 

in EcoDebate, 21/10/2015

[cite]


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7 thoughts on “O pior octênio (2009-16) da economia brasileira em 116 anos, artigo de José Eustáquio Diniz Alves

  • Nossa! É preocupante a situação.
    Sds, Leo

  • Quanta merda! Só poderia ter sido escrita por um demografo ou por um economista neoliberal. A dívida pública brasileira é uma das menores do mundo e não está fora de controle. A população brasileira está vivendo muito melhor agora do que em qualquer outro período da história brasileira, o nível de desemprego, embora aumentando é baixo em relação ao resto do mundo. E estamos no meio de uma das mais graves crises do capitalismo no mundo. Os Estados Unidos e a Europa estão quebrados. Esse autor é um talibã! Aos infernos com os fundamentalistas.

  • José Eustáquio

    Prezado Leo, Obrigado.

    Prezado Evaristo,
    A pessoa quando parte para a agressão irracional é porque não tem razão e só lhe resta a apelação.

    Voce dizer que a dívida pública não está fora de controle é ignorar completamente a realidade. Em % do PIB a dívida está chegando a 70% do PIB (maior do que a de inúmeros países). Isto é baixo em relação à situação da Grécia (170%), mas o ritmo de subida e o custo da divida brasileira é muito alto. Por conta disto o governo está vivendo um “déficit fiscal crônico” e cortando investimentos e direitos sociais. Só não vê isto quem ignora os boletins do Banco Central do Brasil.

    Dizer que a população brasileira está vivendo o seu melhor momento é ignorar que o PIB per capita diminuiu 0,7% em 2014, vai diminuir 4% em 2015 e deve diminuir 3% em 2016. No mínimo voce poderia dizer que a população estava vivendo o seu melhor momento até 2013. Mas desde 2014 a coisa só está piorando e tende a se agravar nos próximos anos.

    Dizer que o desemprego é baixo é ignorar que a metodologia do desemprego aberto deixa de lado o desemprego oculto e o desalento. Na verdade o mercado de trabalho estava melhorando até 2012, depois desta data só piora. A população ocupada está diminuindo e os dados do Ministério do Trabalho, do Caged, mostra que se está demitindo mais de 5 mil trabalhadores com carteira assinada por dia nos ultimos 10 meses. Tanto os dados do IBGE quanto principalemente do DIEESE mostram que o desemprego no Brasil está muito acima do desemprego nos EUA.

    Culpar a crise internacional pela situação nacional é ignorar que o Brasil é um dos países que apresentam as menores taxas de crescimento do mundo e está puxando a média global e a America Latina para baixo.

    Concordo que os EUA e a Europa estão quebrados e que deve vir uma grande crise internacional. Mas isto não isenta o governo brasileiro pelos erros cometidos nos ultimos anos e que jogou o Brail numa armadilha submergente.

    Se alguém discordar destes dados, por favor, mostre com números e com fatos objetivos que o Brasil seria esta maravilha toda que os ufanistas nacionalistas neodesenvolvimentistas tentam vender para iludir a população brasileira.

    Abs, JE

  • Valdeci Silva.

    Gostei, José Eustáquio, mas faço uma observação que considero sumamente importante, não apenas para a questão econômica, mas para todos os assuntos relacionados com a qualidade e manutença dã vida de todas as espécies, no planeta Terra: abordar esses assuntos enfocando apenas o Brasil, como se ele fosse uma ilha que não influencia nem é influenciada pelo restante do planeta, pode levar muitos leitores a pensarem que o capitalismo está triunfante em todos os demais países da Terra, como bem observou Evaristo, apontando os EUA e a Europa, que sempre foram o poderio do capitalismo.
    A abordagem feita assim, de forma pontual, adquire um caráter de embate político entre os partidos de esquerda e os conservadores, e, portanto, fica carente de credibilidade.
    Conforme muitas previsões de esstudos científicos, inclusive divulgados em muitos de seus artigos, essa crise capitalista é prevista e deve evoluir até ao ponto de toda a engrenagem do sistema emperrar, ou seja, até acontecer o colapso total.
    Se estou enganado, corrija-me, por favor.
    Abraços, Valdeci.

  • Jose Eustaquio

    Olá Valdeci,

    Concordo com voce. Não dá para ver um país isoladamente. Mas evidentemente o espaço é curto e temos que focar em determinados aspectos específicos em cada artigo.
    Abs, JE

  • Excelente artigo!

    Os EUA podem estar quebrados, mas muito provavelmente deixarão de importar petróleo e gás natural em 2020.
    A Europa, embora com muitos problemas econômicos e sociais devido ao recrudescimento de políticas capitalistas em alguns dos seus países, prossegue na senda do desenvolvimento.
    Quanto ao desemprego deste Brasil, só no Bolsa Família estão entre 20 a 25 milhões de pessoas desempregadas, mas que não constam das estatísticas oficiais.

    Continuação de bons temas.

  • celso colonna cretella

    Prezados compatriotas

    Tenho 78 anos; sou engenheiro civil, praticante até hoje, há 54 anos.
    Todos vcs – cada qual com seus enfoques e jusrificativas – possuem razões dignas de ponderação. O que me permito acrescentar é que jamais, em minha longa vida, assistí a tamanho aparelhamento por parte de um governo, no sentido de se locupletarem do Poder em benefício de seus próprios e mesquinhos interesses.
    Não sou adepto de NENHUM Partido Político pois considero TODOS muito parecidos mas posso afirmar que jamais poderia imaginar que o Brasil chegasse ao ponto de DESTRUIR nossas maiores empresas, tendo como a Petrobras como maior exemplo, valendo, hoje, 12 % do que valia há 10 anos….e assim várias outras.
    O Brasil atinge, hoje, os mais baixos índices de desenvolvimento humano de sua história.
    Pertenço a uma empresa que- como muitíssimas – demitiu 60 % de seu efetivo e está sem trabalho. Os remanescentes reduziram seus salários em 50% para tentarmos preservar a continuidade da empresa.
    Somos, no país, quase 9 milhões de pessoas sem trabalho.
    No centro de SP – onde resido – já são cerca de 95 edifícios invadidos e as ruas tomadas por drogados, desempregados etc.
    As enchentes inundam bairros periféricos, que foram ocupados sem nenhum critério técnico e sob a criminosa omissão de nosso Poder Público.
    Os tributos já consomem 5,5 meses de trabalho de cada brasileiro e se fala em recriar a já mal utilizada CPMF.
    Alguém me poderia explicar a existência de mais de 30 Partidos Políticos? Acaso existem mais de 30 ideologias?
    Que haja 2, ou 3;mas 30 e tantos?
    Só que, cada Partido criado, recebe 500 milhões de verba, pelo Governo.
    E porque de outros 30 e tantos Ministérios?
    Quanto custam para cada brasileiro?
    Enfim: o Brasil carece de VERGONHA NA CARA, Honestidade, governos decentes, que pensem no povo e no país e não nas suas próprias e futuras gerações, que têem seus futuros assegurados.
    SEM CARÁTER, SEM VERGONHA, SEM DECÊNCIA, SEM ÉTICA, nenhuma nação poderá sobreviver e assegurar um futuro digno aos seus filhos.

    Bom final de semana a todos.

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