O sabor de 2015, artigo de Daniel Clemente
[EcoDebate] Ninguém consegue saborear a esperada refeição antes mesmo de ficar pronta, é indispensável ter todos os ingredientes necessários para a realização do desejo alimentar, o cozinheiro conduzirá com suas mãos a precisão das misturas para que o resultado final contemple a vontade inicial. Assim será o ano de 2015, um prato a ser servido por você, o cozinheiro, que cultivou durante os 365 dias anteriores os sabores da vida, transformará o desejo, sentimento marcado pela ausência de algo ou de alguém, em felicidade, contemplação da presença e da vida boa. Todas as festividades que marcam o encerramento e inicio dos calendários são os talheres, a mesa posta, os enfeites do salão, a música tocada, as louças decoradas, os arranjos, guardanapos de pano ou papel, as cadeiras confortáveis ou banquinhos de plástico, mas, servido para degustação dos convidados foi o que você, o cozinheiro, preparou durante todo o ano de 2014, todos sentiram o sabor, de azedo a doce, proporcionado por suas mãos.
Porém, a vida não pode ser conduzida como se tivesse uma receita pronta, dessas que são despejadas em programas de culinária por diversos meios de comunicação, senão bastaria seguir as dicas do chef culinário para que a vida encontrasse o sabor desejado. Uma vida totalmente previsível deixa de lado a degustação do inesperado, o sabor do improviso, o paladar do acaso, sendo esses o tempero do cotidiano, pequenas situações que fazem toda a diferença, assim como o sal, o orégano, a nós moscada, que com pequenas pitadas pintam o colorido das refeições, os pequenos casos tornam-se grandes acontecimentos, momentos vividos por minutos são contados durante horas no decorrer dos anos. No banquete de 2015 que está sendo servido, o tempero será dosado por suas mãos, o imprevisível será saboreado por sua conduta.
Nem todas as receitas conduzem aos sabores desejados, o Lehman Brothers, o quarto maior banco de investimentos dos EUA foi a falência no ano de 2008, esta instituição receitava as economias do sul do mundo o arrocho salarial, corte de gastos nas áreas sociais, superávit primário, abertura dos mercados as grandes potências, e as nações saborearam o gosto amargo de uma receita que prometia uma economia mais doce. No Brasil, os ditadores de botas resolveram tomar conta da cozinha reclamando dos indigestos sabores sociais, logo proclamaram “primeiro temos que fazer o bolo crescer para depois repartir”, foram poucos os que saborearam as bonanças econômicas, muitos ficaram com o azedo da desigualdade. As democracias também apresentam o seu cardápio, prometendo incríveis banquetes, mas se parecem mais com as redes fast foods, onde os sabores são industrializados e empacotados, peça pelo número, você ama tudo isso.
Levar a vida ao sabor dos alimentos é pensar no próximo, nem todos sentem os mesmos gostos, porém, todos sentam a mesa, afinal, um almoço familiar, um jantar com amigos, uma porção a beira mar, uma passagem de ano, são pretextos para desfrutar o bom papo, a boa companhia, os resultados vividos, o sabor do ano que se abre.
Daniel Clemente
Professor de História e Sociologia
Colégio Adventista de Santos
Pós Graduando PUC-SP
Publicado no Portal EcoDebate, 07/01/2015
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