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Crescimento econômico e populacional e redução da biocapacidade, artigo de José Eustáquio Diniz Alves

 

biocapacidade

[EcoDebate] A humanidade já ultrapassou os limites da sustentabilidade, conforme mostra os estudos mais recentes. A pegada ecológica da população mundial ultrapassou a biocapacidade do Planeta. A Pegada Ecológica serve para avaliar o impacto que o ser humano exerce sobre a biosfera. A Biocapacidade avalia o montante de terra e água, biologicamente produtivo, para prover bens e serviços do ecosistema à demanda humana por consumo, sendo equivalente à capacidade regenerativa da natureza. Contudo, existe uma grande disparidade entre a situação dos países, como mostra as informações do relatório Planeta Vivo, de 2012, da WWF (com base nos dados de 2008). Vejamos alguns exemplos.

O Japão é um país com alto déficit ambiental (pegada ecológica maior do que a biocapacidade), mas como é um país muito desenvolvido tecnologicamente, pode exportar bens industriais e serviços e importar matérias-primas e alimentos para manter o alto padrão de vida de seus habitantes. O país do “sol nascente” depende da biocapacidade de outras regiões. Porém, a população japonesa já está diminuindo de tamanho e deve apresentar uma grande redução ao longo do século XXI, aliviando a pegada ecológica global do país.

Australia e Nova Zelândia são países de baixa densidade demográfica e que possuem alta pegada ecológica per capita (6,68 gha e 4,31 gha, respectivamente), mas também uma alta biocapacidade per capita (14,57 gha e 10,19 gha). Portanto, são países com alto nível de renda e de IDH (Índice de Desenvolvimento Humano), mas superavitários em termos ambientais (com biocapacidade maior do que a pegada ecológica). Possuem ainda baixo crescimento demográfico.

Quase todos os países da América Latina e Caribe são também ambientalmente superavitários e a região está em estágio avançado da transição demográfica. A grande exceção é o Haiti que embora tenha uma pegada ecológica muito baixa, de apenas 0,60 hectares globais (gha), possui uma biocapacidade ainda menor, de meros 0,31 gha. Sendo um país sem capacidade de exportar bens e serviços não tem como importar matérias primas e alimentos. Atualmente, o Haiti depende muito de ajuda internacional para evitar uma epidemia de fome. Como a população é uma das que mais cresce na região, uma alternativa é a emigração dos seus habitantes.

Estados Unidos (EUA), Canadá e Europa Ocidental são exemplos de países com alta pegada ecológia em relação à biocapacidade e possuem alto déficit ambiental (pegada ecológica per capita maior do que a biocapacidade). Estes países desenvolvidos só podem manter o alto padrão de vida de suas populações na medida em que importam matérias-primas e commodities do resto do mundo. Mas em termos populacionais possuem fecundidade abaixo do nível de reposição e, como nos EUA, a população só não está caindo por conta da imigração.

Na África existem vários países com superávit ambiental, como Angola com população de 18 milhões de habitantes, pegada ecológica per capita de 0,89 gha e biocapacidade de 2,98; Moçambique com 22,3 milhões de habitantes, pegada ecológica de 0,78 gha e biocapacidade de 2,21 gha e Congo com 3,8 milhões de habitantes, pegada de 1,09 gha e biocapacidade de 12,2 gha. Todos estes países possuem baixa densidade demográfica e têm espaço para um moderado crescimento populacional.

Situação menos confortável tem a República Democrática do Congo, que possui uma população de 62,5 milhões de habitantes, uma pegada ecológica de 0,76 gha e uma biocapacidade de 3,1 gha. Contudo, o alto crescimento populacional previsto no país vai reduzir a biocapacidade per capita e, havendo melhorias mínimas no padrão de vida, vai haver aumento da pegada ecológica. Portanto, não é improvável que o país passe de uma situação de superávit ambiental para uma situação de déficit, em poucas décadas.

Porém, os casos mais dramáticos são de países que possuem baixíssima pegada ecológica (baixos níveis de vida e de IDH), baixíssima biocapacidade e alto crescimento populacional.
Vejamos alguns casos: Egito, com população de 78,3 milhões de habitantes, pegada ecológica per capita de 2,06 gha e biocapaciade per capita de 0,65 gha; Etiópia com 79,4 milhões de habitantes, pegada de 1,13 gha e biocapacidade de 0,65 gha; Quênia com 38,5 milhões de habitantes, pegada de 0,95 gha e biocapacidade de 0,53 gha; Malawi com 14 milhões de habitantes, pegada de 0,78 gha e biocapacidade de 0,67 gha e Ruanda com população de 10 milhões de habitantes, pegada ecológica per capita de 0,71 gha e biocapacidade per capita de 0,52 gha.

Em resumo, existem países ricos e desenvolvidos que possuem alto déficit ambiental e importam recursos do resto do mundo. Existem alguns países – como o Brasil – que possuem alto superávit ambiental (pegada ecológica per capita menor do que a biocapacidade) e são exportadores de recursos naturais. Porém, existem países que são pobres e com baixos níveis de cidadania e que possuem alto crescimento demográfico e alto déficit ambiental.

Do ponto de vista do Planeta, a situação dos primeiros é mais preocupante, mas do ponto de vista das necessidades nacionais a situação dos últimos é dramática. A migração dos países pobres com déficit ambiental para os países ricos (também com déficit) pode minorar o stress demográfico e social nestes países de origem, mas tende a agravar o problema da pegada ecológica nos países de destino e aumenta o déficit ambiental global.

Tudo isto, é um bom tema para se discutir no processo de revisão da Conferência Internacional sobre População e Desenvolvimento (CIPD) do Cairo, também conhecido como “CIPD além de 2014”. A humanidade precisa repensar o ritmo de crescimento econômico e demográfico dos últimos 200 anos, pois vivemos em um planeta finito e os avanços tecnológicos não têm evitado o aumento da degradação ambiental e a redução da biodiversidade.

José Eustáquio Diniz Alves, Colunista do Portal EcoDebate, é Doutor em demografia e professor titular do mestrado em Estudos Populacionais e Pesquisas Sociais da Escola Nacional de Ciências Estatísticas – ENCE/IBGE; Apresenta seus pontos de vista em caráter pessoal. E-mail: jed_alves@yahoo.com.br

EcoDebate, 17/07/2012

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One thought on “Crescimento econômico e populacional e redução da biocapacidade, artigo de José Eustáquio Diniz Alves

  • Meus cumprimentos ao Professor Alves!
    Fica evidente que os países ricos são os grandes consumidores de recursos naturais, os maiores poluidores, os maiores beneficiários dos frutos do crescimento econômico.
    Gostaria de enfatizar que estes ricos, para continuarem ricos, impõem aos pobres os ônus da preservação. E, pior de tudo, sem remuneração. E com sensação de que somos culpados pelo estado de coisas. Eles espalham pelo mundo afora, por meio de suas ONGs (criadas e mantidas por nações e corporações dominantes) o terrorismo ambiental. Aqui no Brasil isto está sendo levado ao extremo. Por que há tanto destaque na mídia sobre os aspectos ambientais negativos do Brasil, e pouco se fala sobre os aspectos positivos do Brasil? O Brasil é o país líder – com folga – na preservação ambiental no mundo.
    O relatório Planeta vivo da WWF (2012) indica que 10 países (ali incluídos 5 países do BRIICS) detinham, em 2008, 60% da biocapacidade ( capacidade de regeneração dos ecossistemas) do planeta. O Brasil, segundo o relatório é o país mais limpo do mundo, e possui, sozinho, 15,4% de toda a biocapacidade do planeta, sendo nossa capacidade per capita de 9,63 gha (hectares por habitante), para uma pegada ecológica de 2,93 gha; Europa ocidental apresenta uma pegada ecológica de 4,72 gha e biocapacidade de 2,24 gha; o Japão, pegada de 4,17 e biocapacidade de 0,59; America do Norte pegada de 4,72 para 2,24 gha de biocapacidade. Observem no relatório que o maior superavita é do Brasil, com 229 de superávit. Uma das sugestões deste relatório da WWF (que me parece estar a serviço dos ricos e dominadores) é de que seja forçoso concluir que a biocapacidade sobrante dos países (pobres) seria mais bem aproveitada se exportada e utilizada por outras nações. Os residentes nos países ricos são dependentes dos recursos de outras nações para atender suas necessidades e como os recursos estão escasseando, a competição está crescendo. A disparidade entre as nações ricas em recursos e as nações pobres em recursos muito provavelmente terão grandes implicações geopolíticas no futuro, diz o relatório (WWF, 2012). Se o capital natural é o que vale para o futuro, acho que vai se alterar o poder, pois os pobres de hoje que detém o capital natural serão ricos amanha, e os ricos de hoje, pobres. Então, os ricos atuam na causa ambiental para impedir os pobres de usarem estes recursos, ou forçá-los a vender sem incorporar as externalidades ambientais, sobe pena de ficarem ricos. Por isso, o Brasil tem 72% de seu território protegido como Reserva Legal, APP, Unidades de Conservação e Terras Indígenas (Embrapa/ISA/MMA/FUNAI).
    Áreas indígenas………..1.126.939 km2………………. … 13,2 %
    Ucs……………………….1.513.309 km2……………… ……17,71 %
    RL………………………..2.685.542 km2…………………….31,54 %
    APPS………………………1.442.544 km2…………………..16,94 %
    TOTAL PRESERVADO SEM ENTORNO UCS…………….. 79,39 %
    Entornos – estimativa cenário de 10 km …………………7,42 %
    TOTAL PRESERVADO COM ENTORNO 10 km…………..86,81 %
    Área utilizável sem entornos Ucs…………………………20,61 %
    Área utilizavel com entorno 10 km……………………….13,19 %

    No entanto, há plano de aumentar mais e mais a proteção, conforme reivindicação dos ambientalistas. No dia 14/6/2012 (O Estadão) a Presidente Dilma Roussef acusou Ongs internacionais de fazerem “acusações socioambientais” contra o Brasil, naquilo que qualificou de “praticas fraudulentas de competição”, em favor de interesses estrangeiros, especialmente na área de energias limpas.
    A criação de Unidades de Conservação (UC) no Brasil, por sua vez, esta sendo feita em escala fantástica, incentivada e financiada por ONGs internacionais (dinheiro que vem de onde? ), sem que no entanto os proprietários sejam indenizados, com conivência do executivo e legislativo (tem corrupção no meio??). E, pior, são “parques de papel”, porque o governo cria UCs em áreas privadas, não vem indenizando aos proprietários, não toma posse, não possui domínio, deixando-as abandonadas. O Passivo fundiário brasileiro é de 21 milhões de hectares, o que, se traduzidos pelo real valor dos recursos ecossistêmicos, de R$150 mil por hectare de áreas de alto valor ecológico (por exemplo: Costanza ou pela avaliação eMergética), daria um passivo fiscal da ordem de R$ 3 trilhões (TRES TRILHOES DE REAIS!!).
    Como escreve Carasco, no livro Mafia Verde, o Ambientalismo a Serviço do Governo Mundial, Rio:Ed. Capax Dei, no Brasil o ambientalismo está a serviço de um colonialismo que nos é imposto, utilizando-se das Ongs e do comando das diretrizes e políticas públicas.

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