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Neblina de carvão (smog) estagnou temperaturas entre 98 e 2008 e ‘mascarou’ efeito estufa

Consumo de carvão na China ‘suspendeu’ aquecimento global, diz estudo

A estagnação no aquecimento global entre 1998 e 2008 foi causada por um acentuado aumento no uso de carvão mineral pela China, cuja queima “mascarou” os dados sobre o efeito estufa, indica um estudo [Reconciling anthropogenic climate change with observed temperature 1998-2008] de cientistas americanos.

A ausência de um aumento significativo da temperatura no período é frequentemente usada pelos “céticos do clima” como argumento para negar a existência do aquecimento global pela ação do homem. Reportagem de Richard Black. Especialista de meio ambiente da BBC News.

Segundo o estudo, publicado na revista Proceedings of the National Academy of Sciences, o “smog” (mistura de fumaça e neblina) causado pelo carvão chinês atuou para “mascarar” o aquecimento real da Terra.

Dados do governo americano indicam que os chineses dobraram o seu consumo de carvão mineral entre 2002 e 2007.

Embora a queima do carvão por um lado produza mais dióxido de carbono, que contribui para o aquecimento global, por outro joga partículas minúsculas de sulfato na atmosfera, o que resfria o planeta ao refletir a energia solar de volta ao espaço.

Motivação

Os pesquisadores concluíram que o declínio da atividade solar e uma mudança geral das condições no Oceano Pacífico, passando do fenômeno El Niño para La Niña, também contribuíram para a temperatura global no período.

O pesquisador-chefe do estudo, Robert Kaufmann, da Universidade de Boston (EUA), afirma que sua pesquisa foi inspirada pelos questionamentos dos “céticos”.

“Dois anos atrás, eu falei em público em Nova Jersey (EUA) sobre mudança climática”, disse ele à BBC.

“Um senhor idoso me perguntou por que ele deveria acreditar nisto. ‘Eu estava olhando a Fox News e eles disseram que a temperatura da Terra não mudou nos últimos anos, de fato ela diminuiu’, disse ele”, afirmou o pesquisador.

Naquele ponto, eu não estava prestando muita atenção à mudança climática – eu havia retornado de um trabalho com o mercado de petróleo -, então eu chequei os dados e descobri que aquilo estava quase certo.”

Duas respostas

Os especialistas em clima mais famosos tradicionalmente respondem às questões sobre a “ausência” de aquecimento desde 1998 de duas maneiras.

A primeira é apontando que, em 1998, foram vistas as condições mais severas do El Niño já registradas, transferindo uma quantidade recorde de calor do oceano para a atmosfera, aquecendo o planeta.

Assim, enquanto não se vê um aumento da temperatura em uma série iniciada em 1998, é possível ver esta alta se a série for iniciada em 1997 ou 1999.

A segunda resposta é apontar que as temperaturas naturalmente variam de ano para ano, dando destaque à tendência consistente de alta que é notada quando são usadas médias de temperatura de longo prazo, em vez de números anualizados.

Alternativo

Mas o novo estudo, que usa modelos estatísticos muito diferentes dos tradicionais usados para simular o clima da Terra, oferece uma maneira alternativa de explicar a aparente suspensão do aquecimento global.

De acordo com números da Direção de Informações de Energia do governo americano (EIA, sigla em inglês), o índice de uso de carvão no mundo acelerou fortemente por volta de 2003, com a China na liderança.

O consumo dos chineses já havia dobrado nas duas décadas a partir de 1980. Depois disso, nos cinco anos entre 2002 e 2007, ele voltou a dobrar.

Na época de divulgação do último relatório do Painel Intergovernamental sobre a Mudança Climática (IPCC, sigla em inglês), em 2007, estes dados não estavam disponíveis para ser incluídos.

O britânico Piers Forster, da Universidade de Leeds, que liderou o capítulo do relatório do IPCC que analisa fatores de influência na temperatura global, afirma que o novo estudo é “interessante e conveniente”.

“O mascaramento do aquecimento global induzido pelo CO² pelas emissões de enxofre no curto prazo é bem conhecido – acredita-se que o nivelamento das temperaturas nos anos 1950 se devia à queima de carvão pela Europa e pelos EUA, e o mesmo mecanismo pode estar operando a partir do carvão chinês”, disse Foster à BBC.

“Outras flutuações naturais da força emitida pelo Sol, dos vulcões e do vapor d’água também foram consideradas como causas da ‘pausa’ no aquecimento, e podem ter dado alguma contribuição”, afirmou.

“É necessário enfatizar que qualquer mascaramento tem vida curta, e que o CO² do mesmo carvão vai continuar na atmosfera por muitas décadas e dominará o aquecimento de longo prazo pelas próximas décadas.”

Desde o fim do período estudado, em 2007, o consumo de carvão pela China já aumentou em 30%.

O mundo depois do ‘smog’

O “estouro” do consumo de carvão na Europa e nos EUA depois da Segunda Guerra causou um impacto ambiental tão grande em termos de “smog” urbano e chuva ácida que muitos governos introduziram leis reduzindo a emissão de aerossóis.

Com o ar mais limpo, as temperaturas começaram a aumentar novamente. Kaufmann acredita que a mesma coisa deve ocorrer agora, assim que a China e outros países em desenvolvimento resolverem as suas questões ambientais mais emergentes.

Dados dos dois últimos anos indicam que as temperaturas estão mais uma vez começando a aumentar. No entanto, o quão rápido isto vai ocorrer depende de vários fatores.

Um é o quão rápido os países em fase de industrialização irão determinar a instalação de equipamentos que removam as partículas de sulfato.

Outra é a atividade solar. Recentemente, ela deu sinais de retomada, com o Sol entrando em um novo ciclo de atividade – embora pesquisas levantem a hipótese de uma nova estagnação.

Outros grupos de pesquisa, enquanto isso, produziram provas mostrando que os ciclos naturais da temperatura dos oceanos, tais como a Oscilação Multidecadal do Atlântico, podem restringir as temperaturas por aproximadamente mais uma década.

Incertezas sobre alguns aspectos do sistema climático imensamente complexo da Terra, tais como o derretimento do gelo e o comportamento das nuvens, também podem confundir o quadro mais genérico.

Mas Kaufmann não tem dúvida de que as temperaturas retomarão a tendência de alta se as emissões de gases continuarem a aumentar.

“As pessoas podem escolher entre não acreditar na mudança climática (causada pelo homem), mas o termo correto é ‘crença’. Acreditar é um ato de fé, considerando que a ciência significa testar hipóteses e ver se elas se sustentam contra dados do mundo real”, afirma.

“Mesmo antes deste estudo não havia muitas provas científicas para negar a mudança climática, e agora eu não vejo qualquer contradição científica relevante. Se as pessoas não acreditarem nisso, será porque elas escolheram não fazê-lo.”

EcoDebate, 06/07/2011

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