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Artigo

O Código (Florestal) dos ruralistas, artigo de Adriana Ramos

[Correio Braziliense] Nada contra o setor rural, muito pelo contrário. A aprovação na Câmara dos Deputados de proposta de alteração do Código Florestal que praticamente desobriga os proprietários rurais de manter florestas em suas propriedades não significa que todo produtor rural considera a floresta um empecilho ao sucesso. Na bacia do Rio Xingu, onde o Instituto Socioambiental (ISA), organização não governamental (ONG) atua há mais de 15 anos, diversos produtores rurais atenderam ao chamado da Campanha Y Ikatu Xingu para recuperar as matas ciliares de modo a garantir as condições ecológicas necessárias à sustentabilidade socioambiental da bacia.

A região da bacia do Rio Xingu é habitada por povos indígenas e por populações oriundas das diversas regiões brasileiras. O processo histórico de ocupação dessa região a caracterizou como importante polo de desenvolvimento agropecuário. Entretanto, esse processo implicou o desmatamento de áreas extensas, afetando as matas ciliares, que têm importância fundamental para a proteção de nascentes e cursos d´água. Estima-se que já foram desmatados quase seis milhões de hectares de vegetação nativa na bacia do Rio Xingu em Mato Grosso, o que significa que aproximadamente 33% da cobertura vegetal original foi suprimida no estado.

Desde 2004, os atores sociais da região — índios, pequenos e grandes produtores, ambientalistas, pesquisadores e lideranças municipais — decidiram se unir em torno de uma campanha pela proteção e recuperação das matas ciliares e dos recursos hídricos da bacia. A campanha foi criada para promover políticas e prover recursos técnicos e financeiros que permitam a proteção dos direitos das terras indígenas, a viabilização econômica dos assentamentos, a redução dos custos de recuperação das matas ciliares nas propriedades rurais e o provimento de serviços de saneamento básicos nas cidades desta região, de modo a garantir a preservação do Xingu e do seu inestimável valor simbólico para as futuras gerações. Mais de 2.400 hectares de nascentes e beiras de rios estão em processo de restauração florestal em mais de 200 propriedades rurais e a técnica de plantio mecanizado de florestas, desenvolvida na região, está sendo disseminada entre acadêmicos, técnicos e proprietários rurais de várias regiões do país.

Também foi no âmbito da campanha que o ISA apoiou a iniciativa do município de Querência de promover a regularização de suas propriedades. Querência, 14º produtor de soja do Brasil, entrou na lista dos maiores desmatadores da Amazônia em 2007 devido a aumento na taxa de desmatamento no município registrado nos cinco primeiros anos da década de 2000. Nos últimos três anos, porém, os proprietários rurais deram exemplo de articulação e conscientização e, além de derrubarem as taxas de desmatamento, iniciaram a restauração de diversas áreas de preservação permanente (APPs) e inseriram 80% de suas terras cadastráveis no Cadastro Ambiental Rural (CAR). Os produtores de Querência já avisaram que, independentemente das mudanças na lei, o programa vai continuar a recuperar as APPs.

O engajamento dos produtores rurais e a construção de parcerias cada vez mais comuns com ONGs contrastam com as tentativas de criminalização dessas organizações pela Confederação Nacional da Agricultura e pelos representantes ruralistas no Congresso que atentam contra a legislação florestal do Brasil. Os esforços dos produtores rurais do Xingu demonstram que não há incompatibilidade entre o cumprimento do atual Código Florestal e a produção agrícola responsável e sustentável.

Adriana Ramos é Secretária executiva adjunta do Instituto Socioambiental (ISA)

Artigo originalmente publicado no Correio Braziliense.

EcoDebate, 03/06/2011

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3 thoughts on “O Código (Florestal) dos ruralistas, artigo de Adriana Ramos

  • Osvaldo Ferreira Valente

    A articulista escreve a seguinte frase: “praticamente desobriga os proprietários rurais de manter florestas em suas propriedades”. Gostaria de que ela apontasse, mais explicitamente, onde isto está escrito na proposta do novo Código. Estas afirmações são disseminadas com uma boa dose de má-fé. Uma frase aqui, outra ali, e as inverdades propaladas. Quais os interesses? Não é assim que vamos construir um bom arcabouço jurídico e tecnológico para resolver nossos problemas ambientais. Mostrei, em artigo aqui no EcoDebate, em 31/05/2001, que o Brasil tem 59,8% de seu território coberto por florestas naturais, que mesmo a propalada destruída Mata Atlântica ainda tem 29, 8% e que o novo Código está mantendo isso. Usei dados oficiais, do Serviço Florestal Brasileiro, do MMA. A propagação de fatos inverídicos está causando a desmoralização dos movimentos ambientalistas brasileiros

  • TELMA CERQUEIRA

    Não sei se o Osvaldo faz parte dos ruralistas ou não, mas ele vem falar de uma pesquisa que fez em 2001, o que deve ter mudado neses 11 anos nas florestas brasileiras, será que não desmataram mais nada.
    O Osvaldo acha muito 29,8% de Mata Atlantica sendo que antes do desmatamento ela tinha uma area de 100%.

  • Bom se um pouco antes de ser aprovado o novo código florestal pelos deputados já aumentou drásticamente o desmatamento na Amazônia então imagina nesses dez ultimos anos. Isso que só foi falado do Bioma Amazônico!!!
    Terá que ser feito algo a pequeno a médio e a longo prazo, para achar soluções, por que senão nossos filhos, netos e bisnetos irão sofrer as consequências.

    Um abraço a todos

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