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Compensações financeiras por uso de recursos naturais podem paralisar COP-10 no Japão

COP-10

Assim como ocorreu na 15ª Conferência das Partes sobre Mudanças Climáticas, em dezembro passado, na Dinamarca, a questão econômica tornou-se o centro das discussões na 10ª Conferência das Partes sobre Diversidade Biológica (COP-10), que ocorre em Nagoia, no Japão, até o dia 29. O estabelecimento de novas metas de preservação das espécies pode não seguir adiante devido a um impasse que coloca em confronto os países em desenvolvimento — e donos de grandes reservas naturais — e as nações ricas. O primeiro grupo, tendo o Brasil como líder, defende a adoção de compensações financeiras, pagas pelos países industrializados, devido ao uso da biodiversidade.

O governo brasileiro afirmou, na segunda-feira, que não poderia apoiar nenhum acordo no qual essa questão não fosse contemplada. Ontem, foi a vez de a União Europeia se posicionar radicalmente contra a proposta. Segundo organizações que acompanham as negociações, esse impasse barrou o avanço dos debates.Reportagem de Max Milliano Melo, no Correio Braziliense.

O grupo de países liderados pelo Brasil exige que o chamado acesso e compartilhamento de benefícios pelo uso da biodiversidade, conhecidos pela sigla ABS, se torne um compromisso expresso no acordo que sairá de Nagoia. Nos dois primeiros dias de encontro, Canadá, Austrália e Nova Zelândia lideravam o grupo contrário à proposta. Depois dos discursos de abertura do evento, no entanto, os três países adotaram posturas mais flexíveis.

A mudança poderia possibilitar um acordo até a semana que vem, quando começam as discussões de alto nível, com a presença de ministros. No entanto, agora é a União Europeia que vem defendendo uma posição contrária à do Brasil. “Estamos tentando entender as razões por trás dos impasses”, afirmou Cláudio Maretti, superintendente de conservação do WWF-Brasil. “Será que agora que não existem outros opositores, o interesse econômico dos europeus está se sobrepondo ao interesse de uma boa resolução nessa COP? Será que existe alguma estratégia de negociação por trás do debate que ainda não estamos sabendo? São os questionamentos de todos por aqui”, completou.

A representante do Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (Pnuma) Cristina Montenegro lembra, no entanto, que um entrave nas negociações não significa elas não possam ser retomadas. “São negociações que envolvem muitos pontos de vista e interesses. Esse tipo de entrave é comum”, disse ao Correio. “Até sexta-feira, tanto pode ser que se consiga atingir um consenso, como as negociações podem permanecer travadas. É preciso esperar.”

Para ela, a complexidade dos temas tratados em Nagoia podem impedir que maiores avanços sejam feitos. “Existe um consenso de que essa será uma COP difícil. Nós estamos vindo de uma Conferência do Clima sem muitos avanços (COP-15). Além disso, nenhum país conseguiu atingir as metas de preservação propostas na COP-6 da Biodiversidade. Então, da mesma forma que os assuntos são complicados, o sentimento de dívida com a questão ambiental pode ajudar na conscientização dos negociadores”, analisou.

Lucros e prejuízos
Uma das tentativas de flexibilizar a posição dos países foi a divulgação de um relatório do Programa das Nações Unidas para a Biodiversidade, intitulado Economia dos Ecossistemas de Biodiversidade (TEEB, na sigla em inglês). O documento mostra que preservar o meio ambiente pode ser economicamente rentável. “Temos documentado não só a importância multitrilionária do mundo natural para a economia global, mas também as formas de mudanças de políticas e mecanismos de mercado inteligentes que podem incorporar novas ideias em um mundo atormentado por uma série crescente de desafios”, disse Pavan Sukhdev, banqueiro que comanda a Iniciativa Economia Verde da ONU.

De acordo com o estudo, apresentado em Nagoia, é preciso que os tomadores de decisão levem em conta o quanto será gasto no futuro devido a problemas ambientais como a extinção de espécies e o aquecimento global (veja quadro). “Isso pode redefinir os atuais padrões econômicos e iniciar uma nova era na qual o valor dos serviços da natureza passa a ser visível e se torna uma parte crítica da tomada de decisões na política e nas empresas”, disse Sukhdev.

A coordenadora regional do Centro de Monitoramento da Conservação Mundial do Pnuma, Helena Pavese concorda que o relatório pode ajudar na retomada do avanço nas discussões. Para ela, a visão econômica pode facilitar o entendimento entre as partes. “Em um contexto pós-crise econômica, números concretos podem ajudar a sensibilizar as nações sobre a importância da preservação”, disse.

ONDE SE GANHA
Preservar pode ser lucrativo. Veja alguns casos em que a preservação de espécies se tornou lucrativa

Austrália
Valor: Entre R$ 34 milhões e R$ 114 milhões
Ação: Reflorestamento
Como: Autoridades da capital do país plantaram cerca
de 40 mil árvores, o que ajudou a regular o microclima,
reduzir a poluição e aumentar a qualidade do ar, além de reduzir o gasto de energia com o uso de ar-condicionado.
O benefício veio na diminuição do uso de eletricidade e
na economia com saúde

Estados Unidos
Valor: R$ 10 bilhões
Ação: Purificação natural da água
Como: O governo de Nova York optou por processos naturais de purificação da água, em vez de utilizar métodos artificiais de filtração, gerando grande economia

Suíça
Valor: R$ 362 milhões
Ação: Proteção dos enxames de abelhas
Como: Uma única colmeia garante uma renda anual
de R$ 1,8 mil por meio da polinização de frutos e bagas,
muito mais do que os R$ 365 anuais que gera em produtos diretos da apicultura, como mel e cera

Índia
Valor: R$ 50 milhões
Ação: Recuperação das florestas
Como: Com a recuperação de 70 hectares das florestas
da região Hiware Bazaar, aumentou a produção de água
e forragem, o que melhorou a produtividade agrícola
da região e enriqueceu a população local

ONDE SE PERDE
Por outro lado, deixar de preservar pode trazer prejuízos econômicos severos. Como os ecossistemas são interligados, os prejuízos serão sentidos
por todas as nações

Todo o mundo
Valor: R$ 85 bilhões
Ação: Excesso de exploração pesqueira
Como: A ação de frotas de pesca industrial altamente subsidiadas e a regulamentação deficiente têm levado à exploração excessiva dos estoques de peixes comercialmente mais valiosos, reduzindo o rendimento global da pesca marítima

Todo o mundo
Valor: R$ 360 bilhões
Ação: Diminuição das populações de insetos
Como: Insetos polinizadores produzem naturalmente muitos bilhões de reais. Para se ter uma ideia do valor dos insetos, a polinização — que ajuda na ampliação de campos e lavouras, por exemplo — representou 9,5% da produção agrícola mundial em 2005

Todo o mundo
Valor: Entre R$ 50 bilhões e R$ 290 bilhões
Ação: Perda das florestas de corais
Como: Embora cubram apenas 1,2% das costas, os recifes de corais são o lar de cerca de 3 milhões de espécies, incluindo um quarto de todos os peixes marinhos. A vida de cerca de 30 milhões de pessoas que vivem nas costas e em ilhas depende dos recifes, para a produção de comida, renda e subsistência

Em todo o mundo
Valor: R$ 6,3 trilhões
Ação: Destruição da cobertura vegetal do planeta
Como: Estima-se que, com a perda das espécies vegetais, o aquecimento global se agrave. A redução dessas perdas diminuiria os gastos anuais atenuando os efeitos das mudanças climáticas. Essa conta não inclui os benefícios indiretos, como a melhoria da qualidade de vida da população

EcoDebate, 22/10/2010



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