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Mar de mudança com novas possibilidades de energia, artigo de Philip Hunter

[Prospect] O desastre ambiental causado pelo derramamento de petróleo no Golfo do México enfatizou nossa necessidade urgente por fontes de energia alternativas. Mas as opções existentes – como o vento, as ondas e a energia solar – têm suas desvantagens, enquanto a fusão nuclear continua abortada apesar de sua promessa antiga de energia quase ilimitada. Durante algum tempo houve esperança de transformar a biomassa de plantações de milho e beterraba representasse uma grande redução do consumo de combustíveis fósseis, mas é provável que esta continue sendo uma solução marginal, uma vez que essas plantações exigiriam muita terra além das usadas para produzir alimentos. Agora as microalgas – organismos unicelulares que vivem no mar ou em água doce – emergem como a mais nova e promissora alternativa para a biomassa.


Há cerca de 500 mil espécies de microalgas nos oceanos, rios e lagos. Como são organismos unicelulares, eles são altamente eficientes em converter luz em energia – processo conhecido como fotossíntese – diferente de plantas mais complexas que constituídas de milhões de células. Durante a fotossíntese, a microalga também produz hidrogênio para se proteger do excesso de energia da luz, e é esse elemento que interessa aos pesquisadores norte-americanos, porque o hidrogênio pode ser usado como combustível e também para gerar eletricidade. Os experimentos já mostraram que células de microalga podem ser modificadas para gerar quantidades bem maiores de hidrogênio do que fazem naturalmente e que podem até mesmo gerar eletricidade diretamente. As células também produzem naturalmente óleos orgânicos, ou lipídeos, que podem ser transformados em biodiesel que lembra muito o diesel usado no aquecimento e na combustão dos motores.

Há também a possibilidade a longo prazo de ir além disso – modificar as microalgas para produzir biocombustíveis (incluindo o biodiesel) diretamente, sem ter o passo intermediário de gerá-lo a partir dos óleos orgânicos. Isso pode eventualmente ser atingido modificando o processo da fotossíntese para produzir hidrocarbonetos como a gasolina e o diesel, combinando água e dióxido de carbono e retirando o oxigênio através da redução. Isso transformaria as microalgas numa fonte potencialmente eficaz de biocombustíveis e talvez até em geradores diretos de eletricidade. Refinar esses processos é um trabalho em andamento, mas que alguns especialistas, como os do Laboratório Nacional de Energia Renovável dos EUA, a maior agência federal dedicada à pesquisa em energia sustentável, recusaram-se a comentar porque estão atualmente pedindo a patente. De fato, Craig Venter, que recentemente afirmou ter criado “vida artificial”, enfatizou a produção de biocombustíveis a partir de algas como uma importante aplicação futura de seu trabalho. Ele acredita que as técnicas que estão surgindo para transplantar genomas inteiros entre diferentes espécies de bactérias poderiam facilitar o desenvolvimento de tipos de algas que produzem hidrogênio numa quantidade bem maior do que as espécies existentes.

Os pesquisadores estabeleceram que as algas podem teoricamente usar 10% da energia solar que absorvem e transformar em biocombustíveis, em comparação com digamos, os apenas 0,05% do etanol de milho. Relembrando os anúncios falsos associados à energia nuclear depois da 2ª Guerra e, mais recentemente, com os próprios biocombustíveis, há boas razões para duvidar de qualquer promessa de energia ilimitada. Há bons motivos para suspeitar de quaisquer afirmações de desenvolver uma fonte totalmente sustentável de energia, dado que a maior parte das fazendas de algas certamente seriam no oceano, onde nosso ação ambiental tem sido fraca. Seria necessária muita engenharia para coletar o combustível para a terra em grande escala.

Mas também há motivos para ser otimista. Foi demonstrado que as algas podem ser coletadas em tanques “bio-reatores de alga” que cobririam uma superfície bem menor do que as plantações para biocombustíveis – o que reservaria as terras férteis para a produção de alimentos. Mike Seibert, pesquisador associado da NREL, estima que para substituir toda a gasolina usada nos EUA por etanol de milho exigiria uma plantação de milho de 1.600 quilômetros de extensão e outros 1.600 de largura”. Com as algas, a mesma quantidade de energia pode ser produzida numa área de “cerca de 177 quilômetros por 177 quilômetros” – 1% do espaço. E diferentemente das plantações em terra, os recursos naturais cruciais para o processo, como fósforo, nitrogênio e ferro, existem na água, então eles estariam permanentemente disponíveis. Isso significa que as algas poderiam até mesmo limpar a poluição ao mesmo tempo, retirando metais pesados da água. O impacto ambiental, então, poderia na verdade ser positivo.

Mas há problemas, e eles se resumem em três frentes: coletar a luz do sol, convertê-la em uma forma de combustível ou energia apropriada e depois coletar essa energia. A pesquisa até agora se concentrou nos dois primeiros problemas. Um dos principais problemas da coleta está perto de ser resolvido por uma equipe da Universidade da Califórnia, Berkeley. As algas produzem clorofila, que deixa a água verde. Ao cultivar algas amarelas em vez de verdes, a quantidade de luz solar absorvida por cada célula é reduzida para um nível em que a conversão de energia é muito mais eficiente. Ao mesmo tempo, mais luz atravessa e penetra a água, para outras células mais abaixo, então mais energia luminosa pode ser transformada em biocombustíveis.

Enquanto isso, uma equipe da Universidade de Stanford vez outra descoberta potencial importante mostrando que as algas podem ser conectadas a nano-eletrodos feitos de ouro para gerar uma corrente elétrica. Captar a energia elétrica de bilhões dessas células pode parecer algo distante, mas pelo menos foi comprovado que é possível. A possibilidade mais imediata, entretanto, é a de gerar biocombustíveis em vez de eletricidade.

Nesse estágio inicial, é impossível prever quando isso funcionará mas, diferentemente da fusão nuclear, o processo não significa tudo ou nada: há uma chance de começar com pouco e produzir pequenas quantidades de energia e combustível em projetos piloto. E alguns já estão sendo implementados. O NREL, por exemplo, pediu recentemente a patente de técnicas de bioengenharia para microalgas. Os projetos de biocombustíveis de algas também estão começando a ganhar impulso na Europa, e devem ser mais estimulados graças a um relatório de 3 milhões de euros financiado pela UE sobre tecnologias de biocombustíveis de algas que deve ser concluído em outubro de 2010. Em março, o Carbon Trust da Inglaterra, uma organização encarregada de acelerar a transição para uma economia de baixo carbono, anunciou o financiamento de um desafio de duas fazes que envolverá várias universidades para desenvolver a produção de biocombustíveis de algas em lagos de água salgada, com a meta de atingir a produção de biocombustíveis em escala comercial em 2020. A primeira fase, com financiamento de até 8 milhões de libras, envolve a pesquisa de base que deve ser concluída em 2012. A segunda fase de 10 milhões de libras será testar a produção de biocombustíveis em pequenos projetos-piloto entre 2013 e 2016; os processos de produção em grande escala virão logo depois.

Se qualquer um desses projetos funcionar, o futuro poderá de fato ser verde. Ou talvez amarelo.

(Philip Hunter escreve sobre ciência.)

Tradução: Eloise De Vylder

Artigo na revista Prospect, no UOL Notícias.

EcoDebate, 21/07/2010

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