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Após boom e crash, energia solar encontra espaço na Espanha

Eusebio Sáez Mozos, fazendeiro em El Villar, na região de Puertollano, Espanha, vendeu um pedaço de sua propriedade para instalação de central solar. Foto: Lourdes Segade/The New York Times
Eusebio Sáez Mozos, fazendeiro em El Villar, na região de Puertollano, Espanha, vendeu um pedaço de sua propriedade para instalação de central solar. Foto: Lourdes Segade/The New York Times

Há dois anos, esta rude cidade mineradora passou por uma breve corrida do ouro do século 21. Há muito famosa pelo carvão, Puertollano descobriu outra fonte de energia que ignorava: o sol escaldante implacável.

Com incentivos generosos do governo espanhol para estimular o setor nacional de energia solar, a cidade buscou agressivamente substituir sua economia carvoeira em declínio por empresas de energia solar, com o slogan de campanha: “O Sol Nos Move”.

Logo, Puertollano, lar do Museu da Indústria Mineradora, se tornou um centro de energia alternativa, com duas enormes usinas de energia solar, fábricas produzindo painéis solares e wafers de silício e institutos de pesquisa de energia limpa. Metade da energia solar instalada globalmente em 2008 foi instalada na Espanha. Reportagem de Elisabeth Rosenthal, The New York Times.

Fazendeiros venderam terras para usinas solares. Butiques abriram. E pessoas de todo mundo, vendo oportunidades de negócios, se mudaram para a cidade, que sofria com 20% de desemprego e êxodo populacional.

Mas enquanto usinas solares mal projetadas, de baixa qualidade, brotavam como mato nas planaltos espanhóis, as autoridades espanholas perceberam que teriam que subsidiar muitas delas indefinidamente, e que o setor que criaram poderia nunca produzir energia verde eficiente por conta própria.

Em setembro, o governo mudou abruptamente de curso, cortando pagamentos e estabelecendo um limite para a construção solar. Era o fim do breve boom de Puertollano. Fábricas e lojas fecharam, milhares de trabalhadores perderam seus empregos, empresas estrangeiras e bancos abandonaram os contratos que já tinham negociado.

“Nós perdemos a oportunidade de estar na vanguarda dos renováveis –nós não estávamos apenas gerando eletricidade, mas também uma economia forte”, disse Joaquín Carlos Hermoso Murillo, o prefeito de Puertollano desde 2004. “Por que estão limitando a energia solar, quando o sol é ilimitado?”

O crash doloroso de Puertollano aponta para os cálculos delicados das políticas necessárias para estimular as indústrias solares nascentes e a criação de empregos verdes, podendo servir como uma história de alerta para os Estados Unidos, onde um exercício semelhante está em andamento.

Por ora, a geração de eletricidade pelos raios do sol precisam ser subsidiadas, porque exige a compra de novos equipamentos e o investimento em tecnologias em evolução. Mas os custos estão caindo rapidamente. E os reguladores ainda estão aprendendo como estruturar os pagamentos de estímulo para que produzam uma indústria verde estável que caminhe pelas próprias pernas, em vez de apenas energia cara e um sucesso econômico fugaz como na Espanha.

“A indústria como um todo aprendeu muito com o que aconteceu na Espanha”, disse Cassidy DeLine, que analisa o mercado solar europeu para a Emerging Energy Research, uma firma como sede em Cambridge, Massachusetts. Ela notou que outros países de lá para cá estabeleceram subsídios menores e emitiram padrões mais rígidos para as usinas solares.

Mas apesar da dor que os incentivos da Espanha acabaram causando, de muitas formas eles cumpriram sua promessa, disse DeLine.

“Apesar dos incentivos poderem causar bolhas e estouros, sem eles a indústria não decola”, ela disse. “Os Estados Unidos estão realmente atrasados em relação à Europa nisto, e se esperarmos até que a energia solar seja competitiva em custo por conta própria, nós poderemos perder o barco e a oportunidade de moldar o mercado.”

As empresas solares espanholas mais robustas sobreviveram à recessão, se reestruturaram e estão ressurgindo como empresas globais.

Por exemplo, quando o governo mudou de curso, a Siliken Renewable Energy, originalmente uma fabricante de painéis solares, fechou suas fábricas por cinco meses e reduziu seu quadro de funcionários de 1.200 para 600. Mas após mudar seu foco para mercados externos como a Itália, França e os Estados Unidos, diversificando para serviços de apoio solares, a empresa passou a dar lucro.

“Nós somos uma empresa na qual os bancos confiam, então pudemos realizar a mudança”, disse Antonio Navarro, um porta-voz da empresa. “Mas muitas empresas pequenas desapareceram.”

O período foi particularmente difícil porque coincidiu com a crise econômica global, ele disse.

Para encorajar o desenvolvimento da energia solar e reduzir a dependência de combustíveis fósseis, a Europa geralmente empregou as chamadas tarifas “feed-in”, por meio das quais os governos pagam um valor mais alto pela eletricidade produzida a partir de fontes renováveis. Os reguladores nos Estados Unidos defendem incentivos menos diretos, como exigir que as prefeituras comprem um certo percentual de sua eletricidade de empresas que produzam energia renovável, apesar de algumas poucas cidades e Estados, mais notadamente Vermont, estarem experimentando o conceito feed-in.

Quando foi anunciado no verão de 2007, o pagamento adicional da Espanha pela energia solar era o mais generoso existente –58 centavos de dólar por quilowatt-hora– com poucas exigências.

Olhando para trás, foi um valor alto demais. “Todo mundo, de todas as partes do mundo, começou a se instalar na Espanha o mais rápido que podia, e todo biólogo que podia começou a trabalhar em energia solar”, disse Pedro Banda, diretor geral do Instituto para Sistemas de Concentração Fotovoltaica, um dos institutos de pesquisa de Puertollano.

Até mesmo usinas ineficientes, mal projetadas, davam lucro e a especulação nas licenças para construções solares era comum.

A meta a longo prazo da Espanha era produzir 400 megawatts de eletricidade a partir de painéis solares até 2010, mas ela atingiu esse marco no final de 2007.

Em 2008, o país conectou 2,5 gigawatts de energia solar à sua rede nacional, mais que quintuplicando a capacidade prevista e deixando o país atrás apenas da Alemanha, a líder mundial. Mas muitas das usinas abertas às pressas ofereciam pouca esperança de serem competitivas em custo à energia elétrica convencional, por serem mal projetadas ou localizadas em locais de incidência solar inadequada, por exemplo.

Os projetos para usinas de energia solar variam. O tipo mais comum utiliza painéis fotovoltaicos para gerar eletricidade. Outras, chamadas de usinas termossolares, utilizam espelhos para concentrar a energia solar em um líquido que, quando aquecido, movimenta uma turbina a vapor.

Em sua pressa de criar uma indústria solar, a Espanha cometeu alguns erros de cálculo: as usinas solares podem ser instaladas tão rápida e facilmente que a corrida no setor foi mais rápida do que a prevista. E os ricos subsídios inflacionaram os custos de instalação solar espanhóis em um momento em que estavam em queda em todos os outros lugares –em parte por causa da maior concorrência dos fabricantes de painéis chineses, mas também por causa do maior volume produzido resultar em economias de escala.

Na Espanha, a tarifa, corrigida trimestralmente, é de cerca de 39 centavos de dólar por quilowatt-hora para eletricidade de usinas de energia solar, e ligeiramente maior para os painéis nos telhados.

A tarifa da Alemanha, 53 centavos de dólar por quilowatt-hora, deverá cair pelo menos 15% em meados deste ano, e há propostas no Parlamento para o fim dos subsídios a usinas solares em terras agrícolas.

Os pagamentos adicionais necessários para tornar a energia solar financeiramente viável variam, dependendo da incidência solar local e do custo da energia convencional. Os especialistas preveem que, possivelmente no próximo ano, a Itália será o primeiro lugar onde a eletricidade de origem solar não precisará de subsídios para competir com a eletricidade gerada por combustíveis fósseis. A Itália conta com sol abundante e tarifas de energia elevadas, dado que importa grande parte de seus combustíveis fósseis.

Mesmo com os incentivos reduzidos e com a recessão econômica local, a indústria solar promoveu uma recuperação para Puertollano e, potencialmente, um novo futuro econômico. Os institutos de pesquisa de lá estão desenvolvendo tecnologia de vanguarda. O desemprego, apesar de estar por volta de 10%, não retornou ao número de 20%. A cidade é lar de várias empresas solares: uma nova usina termossolar de 50 megawatts, de propriedade da gigante de energia espanhola Iberdrola, está criando centenas de empregos.

Apesar das minas de carvão ainda pontilharem a paisagem e uma usina petroquímica ainda continuar sendo a maior empregadora de Puertollano, a nova usina solar fica bem ao lado, com mais de 100 mil espelhos parabólicos enfileirados em mais de 160 hectares de antigas terras agrícolas. Limpa e branca como uma ala hospitalar, ele transforma silenciosamente a luz do sol em eletricidade na Espanha.

Tradução: George El Khouri Andolfato

Reportagem [Solar Industry Learns Lessons in Spanish Sun] do New York Times, no UOL Notícias.

EcoDebate, 12/03/2010

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