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COP 15: O clima do planeta em debate

Agressões ao ambiente: o planeta depende da redução de emissões de poluentes de efeito estufa, mas acordo entre as nações está difícil de ser concretizado. Foto de Herve Thery.
Agressões ao ambiente: o planeta depende da redução de emissões de poluentes de efeito estufa, mas acordo entre as nações está difícil de ser concretizado. Foto de Herve Thery.

A poucos dias da conferência da ONU sobre mudanças climáticas, em Copenhague, professores da USP analisam as possibilidades de acordo entre os países para a redução das emissões de poluentes na atmosfera

Às vésperas do maior encontro sobre mudanças climáticas, o clima de pessimismo dominava os ânimos das nações que deverão apresentar suas metas de redução das emissões de gases de efeito estufa. A 15ª Conferência das Partes (COP-15) da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre o Clima, a ser realizada de 7 a 18 de dezembro em Copenhague, na Dinamarca, até inaugurou um novo verbo em português, “flopar”, aportuguesamento de to flop (do inglês, fracassar, malograr; fiasco, decepção).

A sensação de fracasso surgiu porque os maiores poluidores do planeta – Estados Unidos e China – não participariam do encontro. Um anúncio feito pela Casa Branca no dia 25 de novembro, no entanto, desanuviou a atmosfera. O presidente dos Estados Unidos, Barack Obama, deverá dar um “pulinho” em Copenhague no dia 9 de dezembro, aproveitando sua ida a Oslo, na Noruega, onde receberá o Prêmio Nobel da Paz, no dia 10 de dezembro.

Durante a rápida passagem no evento, Obama deverá anunciar a meta norte-americana de reduzir suas emissões de gases do efeito estufa (GEE) em 17% abaixo dos níveis de 2005. “Essa meta refere-se a uma legislação que passou na Câmara, mas para virar lei ainda precisa da aprovação do Senado. De qualquer forma, Obama deve ir lá para dizer que essa é a posição do governo. Como se diz, para aparecer bem na foto”, diz o físico José Goldemberg, professor do Instituto de Eletrotécnica e Energia (IEE) da USP e ex-reitor da USP.

As discussões sobre quanto e quem deve reduzir as emissões se baseiam num princípio apresentado nos relatórios do Painel Intergovernamental de Mudanças Climáticas (IPCC, na sigla em inglês), o das responsabilidades comuns, porém diferenciadas. Quer dizer, todos precisam começar as ações de redução das emissões e mitigação dos danos já causados pelo aquecimento global. Mas os países industrializados, poluidores mais antigos historicamente, devem pagar uma parcela maior da conta. O ideal é que se comprometessem a reduzir, até 2020, de 25% a 40% em relação aos níveis de 1990.

Por aquele princípio, os países em desenvolvimento, como Brasil, Índia e China, deveriam então propor uma redução do aumento
esperado das emissões futuras, já que estão em crescimento e essa curva acompanha necessariamente a curva das emissões, justamente em razão dos padrões vigentes de produção e consumo.

O Brasil saiu na frente ante seu grupo de “subdesenvolvidos”. Na busca de uma posição de destaque no cenário mundial, irá propor mais do que simplesmente evitar a aceleração das emissões. O País anunciou oficialmente seu compromisso de reduzir voluntariamente entre 36% e 39% de suas emissões até 2020.

As metas brasileiras se baseiam num cenário de tendências futuras. As projeções indicam que o País emitiria 2,7 bilhões de toneladas de CO2 até 2020, caso nenhuma medida fosse tomada. Com a proposta, a cifra fica em torno de 1.000 toneladas e para chegar a isso deverá conseguir reduzir em 80% o desmatamento da Amazônia e em 40% o do cerrado.

Goldemberg lembra que o Brasil trabalha sua proposta governamental através da aprovação de leis no Senado, como a que cria o Fundo Nacional de Mudanças Climáticas e a Política Nacional de Mudanças Climáticas. “As manifestações do governo são encorajadoras e apontam na direção correta. Mas acontecem sob fortes críticas, inclusive a minha, porque não se especificou os mecanismos que serão usados para atingir as metas. O Itamaraty, por exemplo, sempre menciona o influxo de recursos estrangeiros para investir em ações positivas, mas, e se eles não vierem?”, questiona Goldemberg.

Dilema do capitalismo – Reduzir emissões significa mudar a matriz energética e aí começa um dilema que o planeta precisa enfrentar. Buscar fontes alternativas de energia para evitar as emissões de gases poluentes implica alocar mais trabalho e capital, o que reduziria os lucros do sistema produtivo.

“A saída é alterar a estrutura de consumo mundial e os paradigmas de distribuição dos recursos. No momento, não há forças políticas que conjuminem essas necessidades”, afirma o professor Ildo Sauer, do Instituto de Eletrotécnica e Energia (IEE) da USP.

Sauer afirma que “flopenhagen” não chega a ser uma surpresa. “O mundo concreto contradiz todos os princípios. Veja, por exemplo, a resposta de Estados Unidos e Brasil à recente crise mundial. O que fizeram foi intensificar a produção e o consumo do automóvel, que é o maior símbolo do que mais contradiz Copenhagen. A recente crise mundial mostrou que não fomos capazes de romper com a lógica do sistema produtivo”, diz o professor.

O fato de muitas medidas anunciadas na COP-15 correrem o risco de cair no vazio não é uma vontade expressa, mas “uma lei intrínseca dentro de cada um de nós”.

Ao contrário, o professor Pedro Leite da Silva Dias, do Instituto de Astronomia, Geofísica e Ciências Atmosféricas (IAG) da USP, está mais otimista com o evento e o “posicionamento mais proativo por parte dos americanos”. Isso porque a pressão ambientalista nos Estados Unidos vem crescendo e chega ao Congresso. “Muitos Estados americanos já adotaram medidas de forma voluntária, assim como aqui no Brasil, como ocorre no Estado de São Paulo. Na China também existe esse esforço. Buscam, por exemplo, técnicas de armazenamento de carbono. Assim, vejo sinais que indicam claramente a percepção do problema e a noção de que o custo da inação é muito maior que o da adaptação e mitigação”, afirma Dias.

Por outro lado, Sauer e Goldemberg ressaltam que houve uma piora na matriz energética mundial, apesar da necessidade urgente de reduzir o aquecimento do planeta causado pelo aumento dos GEE. O Brasil, por exemplo, cuja matriz energética conta atualmente com 87% de hidroeletricidade, deverá ter esse porcentual reduzido para 75% em 2017. Isso acontece exatamente pelo aumento projetado de 12% para fontes poluentes como o carvão mineral importado e o óleo diesel.

“O governo está sujando a matriz energética brasileira e isso ocorre devido à sua inépcia em desenvolver o potencial hidráulico disponível, através de estudos de impactos. Acabou contratando capacidade de geração energética baseada em óleo diesel e carvão mineral importado, além de gás natural. As consequências serão o aumento das emissões e custos mais elevados para a sociedade”, afirma Sauer. O professor calcula que o governo “contratou uma Itaipu de poluição, ou algo em torno de 14 mil megawatts de energia das térmicas”.

Para Sauer, as metas anunciadas pelo governo brasileiro não são impossíveis. “São factíveis desde que use drasticamente certas políticas sociais. Para reduzir a pressão por terra e por madeira, deve fazer a reforma agrária, o zoneamento agroecológico e criar atividades de manejo sustentável. Com isso, estancar a demanda por desmatamento. Além disso, o setor energético precisa de mais planejamento, mais ciência e mais gestão”, diz.

Reportagem de Sylvia Miguel, do Jornal da USP, publicada pelo EcoDebate, 01/12/2009

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