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Licenciamento Ambiental: Para que? artigo de Jorge Luis N Soares

[EcoDebate] As secretarias estaduais de meio ambiente na região amazônica têm sido alvo de pressão e críticas em decorrência do reduzido número de licenças expedidas, seja para liberação de projetos de desenvolvimento ou para a criação e implantação de projetos de reforma agrária. A justificativa para a morosidade em expedir as licenças ambientais tem sido atribuída, em grande parte, à precariedade dos relatórios submetidos para análise.

Os projetos de grande impacto – Para a instalação de projetos de desenvolvimento regional do tipo usinas de produção de energia, estradas federais, complexos industriais e de exploração mineral, os impactos ambientais são inevitáveis. Quando o apelo econômico e/ou político é grande, a importância ambiental se resume ao estudo para liberação da obra, o que fica evidente com a substituição de técnicos e instituições, quando os estudos sinalizam para a inviabilidade do empreendimento. Daí vem a indagação: Licenciamento Ambiental, para quê, se a implantação do projeto mostra-se irreversível?

No caso da construção de hidrelétricas, na planície amazônica, onde grandes áreas são submersas, é fato o impacto negativo na diversidade ambiental e cultural, com o sacrifício de espécies animais e vegetais e com o comprometimento de culturas e tradições das populações tradicionais remanejadas. A presença do IBAMA e de voluntários no salvamento de uma jaguatirica ilhada no lago de uma hidrelétrica chega a ser bizarro. A liberação de Licença Ambiental para as obras de restauração da rodovia BR-319, que liga Manaus (AM) a Porto Velho (RO), indubitavelmente irá supervalorizar as áreas marginais com impactos ambientais previsíveis, a exemplo do verificado na Belém – Brasília e Cuiabá – Porto Velho. Por se tratar de ambiente de floresta amazônica preservada, há expectativa de intensa modificação da paisagem com a pavimentação da Manaus – Porto Velho, o que deve promover a figura geométrica do arco do desflorestamento com 3.000 km de extensão para semicírculo do desflorestamento, ampliando o segmento desflorestado em 880 km.

Seria mais coerente que os relatórios de viabilidade ambiental de grandes projetos, em vez das medidas inexeqüíveis de recuperação/conservação ambiental ou medidas compensatórias tímidas de construção de viveiros, piscinões corredores ecológico, apresentassem os impactos provenientes da implantação do projeto e os dividendos esperados, tipo: serão inundados, no caso da Usina Hidrelétrica de Tucuruí, 2.430 km2 de floresta amazônica, o que vai comprometer a biodiversidade local, extinguir algumas espécies conhecidas, descaracterizar algumas comunidades quilombolas e reservas indígenas, dentre outros; em contrapartida…, a usina tem capacidade para produzir 8.370 MW de energia, imprescindíveis para atender a demanda energética exigida para as metas de crescimento econômico do país, e gerará tantos empregos diretos e indiretos. No caso da citada BR, é inevitável a pressão econômica sobre os recursos naturais, com grande exploração madeireira e mineral, e extensas áreas abertas para a monocultura e pastagem, tudo de difícil controle e fiscalização; em contrapartida…, como afirma o deputado do Amazonas Átila Lins “O Estado do Amazonas deixará de depender do comércio fluvial, que é muito mais caro e complexo e fica prejudicado nos períodos de seca, dadas as dificuldades de navegação”. Dessa forma, a relação custo/benefício, descartadas as variáveis ambientais e culturais, mostra-se favorável à implantação dos projetos, ponto. Logo, Licenciamento Ambiental: Para Quê?

Os Projetos de pequeno e médio impacto – É comum empresários da indústria madeireira e pecuaristas reclamarem da morosidade na concessão de licenças, para o manejo florestal e/ou para o desmatamento da floresta nativa. Para muitos, a solicitação, per si, é garantia de liberação. Esquecem-se, no entanto, que, em alguns casos, os projetos não permitem liberação por razões técnicas, ou as condicionantes inviabilizam economicamente a sua implantação, além das situações em que os relatórios carecem de informações adicionais e devem ser devolvidos aos signatários para ajustes. A constituição de grupos de trabalho, para análise e liberação das licenças, assegura agilizar o licenciamento de projetos polêmicos. O fato é que, quando muitos técnicos e entidades são responsabilizados, não se tem a quem responsabilizar. Logo, Licenciamento Ambiental: Para Quê?

Os Projetos de Reforma Agrária – A resolução CONAMA 387, de 27 de dezembro de 2006, que estabelece os procedimentos para o Licenciamento Ambiental de Projetos de Assentamentos de Reforma Agrária determina, no Art. 13, que o órgão ambiental competente deverá conferir prioridade na análise e concessão da Licença Ambiental dos Projetos de Assentamentos de Reforma Agrária, tendo em vista a sua urgência e relevância social. A exigência de Licença Prévia (LP), para a criação de projetos de assentamento, e a demanda crescente de assentamentos rurais sugerem um grande número de solicitações aos órgãos estaduais de meio ambiente. Neste caso, os relatórios submetidos às secretarias estaduais de meio ambiente pelo INCRA, quando precários, devem ser devolvidos para ajustes, o que isenta o órgão licenciador de responsabilidade por omissão, isto é, quando ele não se manifesta, ou por ação intempestiva, quando, célere, licencia sem análise apropriada.

As áreas destinadas ao assentamento de trabalhadores rurais, antes da anuência do órgão ambiental licenciador, são vistoriadas por técnicos do INCRA, quando, em primeira instância, os parâmetros ambientais, sociais e econômicos devem ratificar a criação de projeto para o assentamento humano. A infraestrutura de apoio às famílias assentadas e às atividades produtivas deve seguir as determinações contidas na legislação ambiental vigente, no que concerne às intervenções no meio físico e nas áreas de interesse ambiental, Áreas de Preservação Permanente (APP) e Reserva Legal (RL). Um Projeto de Assentamento (PA) de 1.000 ha na região amazônica, por exigência legal, deve destinar 80% de sua área agricultável para Reserva Legal, o que corresponde no caso, a 800 ha preservados com mata nativa, ou reflorestados quando o PA incidir em ambiente de monocultura ou pastagens. Esta reflexão se fundamenta em apenas um item das exigências legais para a implantação de PA na região, o que faz dos projetos de assentamento rurais, na essência, um eficaz instrumento de proteção da floresta. A inexistência de projeto de assentamento sustentável não se dá por falta de Licenciamento Ambiental, mas sim, por dificuldades em seguir os ditames da legislação ambiental. O Licenciamento Ambiental de Projetos de Assentamento Rurais deveria ser substituído por instrumentos de fiscalização dos procedimentos de criação, implantação e desenvolvimento dos referidos projetos. Logo, Licenciamento Ambiental: Para Quê?

O Licenciamento Ambiental apresenta-se, em muitos casos, como instrumento de ratificação de ações que impactam o meio ambiente. Uma fiscalização rigorosa no que é preconizado nas leis ambientais seria suficiente para garantir a sustentabilidade de muitos investimentos. Alguns empreendimentos não coadunam com a preservação ambiental, mesmo assim é exigido o Licenciamento Ambiental para serem implantados, o que favorece a instalação de projetos insustentáveis bem elaborados.

Jorge Luis N Soares
Engenheiro Agrônomo
Perito Federal Agrário do INCRA
Doutor em Engenharia Agrícola pela UNICAMP

EcoDebate, 19/09/2009

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