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Artigo

O TAV (Trem Bala) e a tecnologia nacional, artigo de Álvaro Rodrigues dos Santos

Percurso do Trem de Alta Velocidade Rio-São Paulo (Wikipédia)
Percurso do Trem de Alta Velocidade Rio-São Paulo (Wikipédia)

[EcoDebate] Aproxima-se o momento da abertura dos procedimentos de licitação pública para projeto e obras do TAV – Trem de Alta Velocidade, que ligará os aeroportos de Rio (Santos Dumont e Antônio Carlos Jobim) aos de São Paulo (Cumbica e Viracopos), também atendendo algumas poucas paradas intermediárias.

Do ponto de vista tecnológico, em seus mais variados aspectos, será uma obra fantástica, tanto pela performance programada (velocidades de até 350 Km/h, condições de segurança absoluta, comodidade competitiva ao avião) como pelas diversificadas e problemáticas características geológicas e geotécnicas presentes ao longo de seu traçado.

Do ponto de vista financeiro, com valor estimado em mais de 30 bilhões de reais, é um dos empreendimentos hoje mais atraentes no âmbito internacional, pelo que vários grupos estrangeiros (asiáticos, europeus e americanos) estão se preparando para participar acirradamente da disputa licitatória que ora se inicia.

O projeto TAV está sendo coordenado pela Casa Civil o governo federal, com participação do BNDES e da ANTT, e declarações oficiais dão conta de que cuidados especiais serão tomados para que se garanta a absorção pelo país das tecnologias que serão aplicadas na implantação do empreendimento, o que sugeriu inclusive a criação de uma empresa, a EPF – Empresas de Pesquisas Ferroviárias, especificamente voltada a administrar essa absorção tecnológica.

Do ponto de vista dos interesses brasileiros não acredito que no aspecto tecnológico as coisas estejam dessa forma bem encaminhadas. Sem dúvida, haverá o que absorver, mas fato real é que em áreas importantes das engenharias implicadas no projeto há já tecnologia nacional plenamente desenvolvida para atender a implantação dessa obra em território brasileiro.

Especialmente no que se refere às obras de infraestrutura, quem melhor que os brasileiros domina a tecnologia de empreendimentos viários nas complexas condições geológicas e geotécnicas da Baia da Guanabara, da Baixada Fluminense, da Serra do Mar, da Bacia Sedimentar do Vale do Paraíba, da Bacia Sedimentar de São Paulo, do Mar de Morros dos trechos de planalto? Obras sofisticadíssimas do ponto de vista tecnológico foram implantadas nessas regiões pela engenharia nacional: Metrô Rio, Rodovia dos Imigrantes, Rodovias Airton Senna e Carvalho Pinto, Metrô São Paulo, Rodovia dos Bandeirantes, Rodoanel São Paulo, e várias outras obras que contaram com a aplicação de vasto know-how brasileiro acumulado, assim como, elas próprias, permitiram avançar ainda mais a excelência desse know-how.

Ou seja, não se trata de apenas benemeritamente proporcionar procedimentos de absorção tecnológica, trata-se de garantir a aplicação efetiva de tecnologia nacional já dominada. E essa aplicação só será possível via real participação em projeto e obra da empresa nacional e das instituições nacionais de pesquisa tecnológica.

Sem ingenuidades, sabe-se que os órgãos internacionais de financiamento impõem uma série de condições técnicas e institucionais para a efetivação de seus empréstimos, o que tem significado em termos práticos, em muitos casos, a porta de entrada da empresa estrangeira nos negócios tratados. Cabe ao governo brasileiro administrar essas circunstâncias para que resulte um acordo em que a tecnologia nacional seja um elemento estrutural em todas as fases do empreendimento. . Torcemos todos para que essa seja a visão e a atitude do governo brasileiro.

Até porque, e esse é um viés empresarial estratégico do projeto, esse será apenas o primeiro trecho de um TAV no país e na América Latina. Os TAVs já ocuparam um definitivo lugar de destaque na logística de transporte de passageiros em todo o mundo, fato especialmente sugerido pelas condições de pré-esgotamento da capacidade do transporte aéreo; ou seja, o TAV não é modismo, é uma realidade logística e empresarial inexorável. Trabalhemos todos para que os interesses maiores da sociedade brasileira se façam tecnologicamente representar de forma incisiva e majoritária nesse novo cenário da engenharia latino-americana.

Geól. Álvaro Rodrigues dos Santos (santosalvaro@uol.com.br)
· Geólogo formado pela USP – Universidade de São Paulo em 1968
· Ex-Diretor de Planejamento e Gestão do IPT e Ex-Diretor da Divisão de Geologia
· Autor dos livros “Geologia de Engenharia: Conceitos, Método e Prática”, “A Grande Barreira da Serra do Mar”, “Cubatão” e “Diálogos Geológicos”
· Consultor em Geologia de Engenharia, Geotecnia e Meio Ambiente

EcoDebate, 10/08/2009

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