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Realidade e perspectivas de futuro dos sistemas agroflorestais mobilizam debates

Zinalva Freitas é agricultora e divide uma área com 42 famílias no município de São Domingos do Capim (PA), onde cerca de duzentas espécies são cultivadas em sistema agroflorestal. Há trinta anos, tem sido assim. Na manhã de quinta-feira (25 ), sua principal dúvida – misto de indignação – era uma só: o que ainda é preciso provar para que os SAFs sejam reconhecidos como um modelo que realmente dá certo?

Assim como ela, dezenas de outras pessoas – entre estudantes, pesquisadores e gente da terra – se reuniram em torno dos debates que deram o tom da primeira conferência do dia, parte da programação do VII Congresso Brasileiro de Sistemas Agroflorestais, que terminou sexta-feira (26), no município goiano de Luziânia.

O tema que motivou e atraiu os participantes foram os Avanços do conhecimento e políticas públicas em SAFs, um dos principais momentos propostos para refletir sobre o que já foi feito e o que se pode esperar para que o sistema se fortaleça no Brasil. Presentes ao encontro para contribuir com a discussão estiveram o consultor autônomo Jorg Zimmermann e o diretor-executivo da Assessoria e Serviços a Projetos em Agricultura Alternativa (AS-PTA/RJ), Paulo Petersen.

Durante mais de duas horas, muitos pontos se revelaram como preocupações e anseios comuns, como a dificuldade de obter a titularidade definitiva da terra e a incerteza sobre o tempo que ainda será possível se manter nas áreas onde, em geral, já existem SAFs consolidados.

Como no caso de Jesuína Alves, de Rio Branco (AC), que há oito anos trabalha com sistemas agroflorestais, em parceria com quatro outros pequenos agricultores. “Que garantia eu tenho de que nosso esforço vai valer a pena, se não sabemos se vamos ficar?”, questionou ela.

“A posse da terra é condição essencial”, concordou Paulo Petersen. “Chegamos a um ponto em que não é mais possível ficar fazendo pequenos ajustes nas políticas públicas – é preciso cobrar definições”. Petersen chamou a atenção para o fato de que hoje a percepção de SAFs ainda é muito fragmentada e recente, realidade que acaba dificultando a conquista de novos espaços. “Este congresso é uma prova disso. Espero que daqui saiam projetos de disseminação de todo esse conhecimento. Temos a ‘mania’ de não manifestar nossas experiências”, afirmou.

O representante da AS-PTA criticou ainda as instituições públicas que, segundo ele, estão sempre defasadas em termos de conhecimento diversificado e por isso não conseguem se ajustar, ficando presas a modelos únicos, aplicados em qualquer lugar. “A essência do conhecimento na agricultura é muito concectada com a natureza e os agricultores são atores geradores desse conhecimento”, destacou. “O desafio desse diálogo de saberes é fazer com que crédito, ensino e pesquisa reconheçam esse conhecimento”.

Vitalidade

Para o consultor Jorg Zimmermann, o debate revelou questões concretas e vivenciadas de forma comum, independentemente das diferentes procedências dos participantes. Entre os temas mais recorrentes, foram citados o despreparo do sistema bancário para financiamento de projetos, a assistência técnica ainda focada nos sistemas tradicionais, a ausência de políticas de remuneração de serviços ambientais e de sistematização do conhecimento em projetos demonstrativos de SAFs que possam se tornar referência.

Para os representantes estrangeiros também envolvidos com a implantação de agroflorestas, o que ainda falta em alguns países da América Latina é o reconhecimento dos SAFs como patrimônio cultural, assim como a valorização do conhecimento indígena e campesino, na opinião deles, “desprezados em detrimento da tecnologia agrícola”.

“A vitalidade desse momento de discussão reforça a urgência de providências. Estamos na contramão do pensamento hegemônico e por isso criar políticas públicas, com esse nível de desconhecimento da sociobiodiversidade, é um desafio muito grande”, concluiu ele.

Testo de Kátia Marsicano, da Embrapa Informação Tecnológica, publicado pelo EcoDebate, 27/06/2009

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