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Serra Vermelha: O tesouro natural ameaçada pela ganância

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A criação do Parque Nacional da Serra Vermelha é fundamental para a biodiversidade da região. Foto: Miriam Prochnow, no sítio da Apremavi – Associação de Preservação do Meio Ambiente e da Vida.

Imagine uma floresta exuberante, morada do maior número de espécie de aves do bioma Caatinga (mais de 200), abrigo de 150 espécies de mamíferos e de uma infinidade de outros animais. Agora, passe a imaginar milhares de espécies de um ecótono (área de transição) formado pelo Cerrado, Caatinga e Mata Atlântica, que dão cobertura a toda essa bicharada. Agregue a sua imaginação, um mar de água que alimenta todos e que está distribuída numa infinidade de pequenos córregos, lagoas, rios e riachos responsáveis por abastecerem populações de mais de três municípios. Imaginou? Pois saiba, então, que enquanto você lê este texto, esta floresta conhecida por Serra Vermelha, no Sul do Piauí, com aproximadamente 460 mil hectares e protegida pela Lei 11.428/2006 da Mata Atlântica, está sendo saqueada por carvoeiros, mineradores, grileiros de terra e grandes produtores agrícolas. Matéria de Tânia Martins, de Teresina-PI.

O governo do Piauí vem facilitando a destruição da área, concedendo licenças ambientais para projetos como o Energia Verde, da empresa JB Carbon, que pretendia transformar em carvão 114 mil hectares de floresta. De tão danoso o projeto, o Ministério do Meio Ambiente e a Justiça Federal paralisaram a produção em 2006. Embora contida a matança, desde então empresa e o governo estadual, através da Secretaria Estadual de Meio Ambiente-SEMAR, tenta impedir a criação de uma unidade de conservação na área, proposta do MMA atendendo a moção do Conama e de reivindicações da Rede de Ongs da Mata Atlântica-RMA. A última conquista das ONGs foi à criação de um Grupo de Trabalho-GT, constituído por membros do governo do Piauí, MMA, ICMbio e RMA. Embora a Secretaria Estadual de Meio Ambiente do Piauí tenha tentado manipular o processo, realizando uma audiência pública no município de Bom Jesus, reunindo apenas o grupo de empresários do agronegócio que lutam para explorar os recursos da Serra Vermelha, deixando explícito que estão dispostos a dificultar a conservação dos biomas, os membros do GT do Governo Federal e RMA, também deixaram claro que diante da biodiversidade encontrada, não há nenhum motivo legal para evitar a proteção da área.

Falta de apoio
O Secretário de Meio Ambiente do Estado, Dalton Macambira, em nenhum momento se manifestou favorável a proteção do lugar e apresentou uma série de restrições para evitar a conservação , entre elas, deixar o projeto Energia Verde e de outras ocupações irregulares dentro da Serra Vermelha. Até mesmo lugares de extrema beleza cênica, formada por cânions, morros, serras e uma vegetação deslumbrante não foi poupada pelo projeto do secretário, grande defensor do agronegócio .

Após a vistoria da área os representantes do ICMBio/MMA constataram irregularidades de toda ordem, uma delas, uma briga judicial da empresa JB Carbon com a Associação Serrana da Serra Vermelha I e II que se dizem donas de mais de 20 mil hectares das terras da JB, aliás, este não foi o único caso encontrado de áreas sobrepostas na região, o mesmo acontece com o Condomínio Novo Horizonte, de 11.800 hectares, Cajunorte de 40 mil hectares e outras. Sobreposição de áreas é um fato comum na história da grilagem de terras no Sul do Estado.

Para o coordenador do GT, Marcelo Cavalline, a missão técnica do grupo foi de conhecer o conjunto de áreas de chapadas decidual da Serra Vermelha e Serra Semitumba, com vista à proteção dos recursos que drenam a bacia hidrográfica do Rio Parnaíba. Ele lembrou que o ministro Carlos Minc autorizou a realização de novos estudos que indiquem um modelo de conservação, sem afetar o desenvolvimento sustentável dos que vivem na região, assim, segundo ele, nenhuma família de trabalhador rural que vive nos baixões será prejudicada. Emerson Oliveira, do Departamento de Áreas Protegidas do MMA, afirmou que o governo federal está disposto a fazer alguns ajustes na demarcação da área a fim de evitar impactos socioambientais. Ainda segundo o técnico, em toda a área vistoriada só foi encontrado três famílias que sobrevivem a duras penas em um lugar inóspito. “Seria uma questão humanitária retirar essas famílias que, se quer, têm acesso a água”, ponderou.

Importância biológica

Já Allan Crema, do ICMBio, fez um relato da importância biológica do ponto de vista dos recursos hídricos, vegetacional, arqueológico e paisagístico. Ele lembrou que a caatinga, assim como o cerrado são hoje ecossistemas ameaçados pela expansão agrícola. Também não esqueceu de registrar o processo de desertificação que ameaça o Sul do Piauí e lembrou que a região é protegida pela a Lei da Mata Atlântica que agrega oito formações florestais entre elas os ecossistemas associados e enclaves florestais do Nordeste com predominância de florestas desidual e semidesídual. Para os técnicos, é importante preservar e conservar uma área de aproximadamente 400 mil hectares, incluindo a Área de Proteção Ambiental do Estado-APA do Rangel, a unidade proposta. Emerson Oliveira justificou que tratar-se de uma área pantaneira, refúgio dos animais no período seco, já a SEMAR não aceita alegando que pretende implantar ali um projeto de pagamento por serviços ambientais. Solicitado o referido projeto, a SEMAR argumentou que ainda não o fez. Na verdade, o que existe de concreto é a concessão de uma licença para desmatamento na fazenda denominada Santa Teresinha, onde afloram nascentes que na seca matam a sede de antas, onças, macacos e outros animais.

Diversidade da fauna

Tesouro Biológico

A Universidade de São Paulo-USP, através do seu Departamento de Zoologia, realizou em 2006 uma pesquisa no Parque Nacional Serra das Confusões, no limite com a Serra Vermelha. Segundo o coordenador da pesquisa, professor doutor Hussam Zaer, as amostras também servem para a área da Serra Vermelha. Os estudos realizados por 14 pesquisadores sobre a diversidade da fauna concluiu que a região abriga a fauna de um ecótono, incluindo até mesmo elementos das dunas do rio São Francisco e da fauna amazônica. Em termo de biodiversidade o estudo aponta tratar-se de “caráter único”. Foram registradas 221 espécies de aves, 58 de mamíferos, 43 de répteis, 16 de anfíbios, perfazendo um total de 338 espécies de vertebrados. Em relação às espécies da ave fauna, o estudo aponta que é nessa região onde se encontra o maior número de aves do Nordeste, inclusive abrigo de inúmeras espécies que estão na lista de animais em extinção ou mesmo extintos. De acordo com o ornitólogo responsável pela pesquisa, Marcos Pérsio, existe a possibilidade de existir na Serra Vermelha a ararinha azul, símbolo de animal extinto no Brasil.

Outra característica da Serra Vermelha é sua beleza cênica. Situada sobre um planalto que foi erodido a milhares de anos, a região é repleta de cânions e cuestas além de chapadas e uma floresta exuberante, constituída de Cerrado, Caatinga e Mata Atlântica, tudo isso forma uma paisagem extraordinária. Se não bastasse, existem na região inúmeros sítios arqueológicos semelhantes as do Parque Nacional Serra da Capivara, no município de São Raimundo Nonato. Embora o poder econômico e político tentem a posse de tão rico tesouro, a sociedade sabe que o melhor e salvar a floresta e para isso vem se manifestando através de mensagens enviadas ao ministro Carlos Minc e cobranças ao Conama.

* Matéria de Tânia Martins, enviada pelo Fórum Carajás

[EcoDebate, 14/05/2009]

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