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Tilápia pode ser sentinela no monitoramento ambiental

Tilápia (Oreochromis niloticus) pode ser sentinela no monitoramento ambiental (Foto: Wikipédia)
Tilápia (Oreochromis niloticus) pode ser sentinela no monitoramento ambiental (Foto: Wikipédia)

Peixe de fácil adaptação, inclusive a ambientes contaminados, e já encontrado em todo o mundo, a tilápia (Oreochromis niloticus) tem potencial para integrar sistemas de biomonitoramento, que permitirão, por exemplo, conhecer a qualidade da água de um rio. É o que indica uma dissertação de mestrado recém-defendida na Escola Nacional de Saúde Pública (Ensp) da Fiocruz. A autora, a veterinária Ana Luiza Michel Cavalcante, fez experimentos com 73 tilápias expostas ao chumbo e confirmou que alguns componentes do sangue dos peixes aumentavam ou diminuíam em função da presença do metal no organismo. Esses resultados sustentam a tese de que as tilápias podem servir como espécies sentinelas, pois, quando expostas a um contaminante, o organismo delas sofre alterações que podem ser medidas.

“O chumbo é um metal largamente empregado em indústrias e, por isso, um dos contaminantes ambientais mais comuns, tóxico para os homens e para os animais”, diz Ana Luiza, que fez sua pesquisa no Laboratório de Toxicologia do Centro de Estudos da Saúde do Trabalhador e Ecologia Humana, sob orientação dos pesquisadores Rita Mattos e Moacelio Veranio. O chumbo é encontrado em produtos como cabos elétricos, baterias de automóvel, gasolina, tintas e esmaltes. Embora o uso do chumbo tenha diminuído, persiste uma contaminação residual não desprezível. O metal pode causar danos renais, gastrointestinais e neurológicos, assim como pode estar relacionado ao desenvolvimento do câncer. A exposição humana ocorre, principalmente, por via área e por ingestão.

No caso dos peixes, eles se contaminam ao ingerir o chumbo presente na água. Para simular as condições de um ecossistema poluído com esse metal, Ana Luiza aplicou injeções com acetato de chumbo na região do abdome de tilápias comerciais – adquiridas em uma cooperativa que congrega diferentes criadouros do Estado do Rio de Janeiro. Ela testou duas doses (100 miligramas e 1 miligrama por quilo de peixe), mas foi com a menor concentração que obteve os resultados mais elucidativos. As análises foram feitas com o sangue dos animais.

Nos experimentos, que duraram 12 dias cada um, Ana Luiza observou que a atividade da enzima ALA D diminuiu significativamente após a injeção de chumbo. Essa enzima é responsável pela síntese de um componente da hemoglobina, uma proteína essencial ao transporte de oxigênio no sangue. Esse efeito do chumbo era esperado, pois a literatura científica aponta a ALA D como um indicador específico de exposição a esse metal. No entanto, a veterinária também analisou indicadores não específicos, como os níveis de glicose no plasma.

Ana Luiza verificou que, após a injeção de chumbo, os níveis de glicose no plasma aumentavam e, com o passar dos dias, a tendência era que voltassem ao normal. “Esse pico nos níveis de glicose é uma resposta do organismo quando ocorre um estresse agudo, como a exposição ao chumbo”, explica a veterinária. Ela estudou, ainda, outros parâmetros, como os testes do micronúcleo (para avaliar a toxicidade do metal ao DNA), da atividade da catalase (enzima que integra o sistema de defesa anti-oxidante) e das transaminases (enzimas que servem como biomarcadores de lesão no fígado). Porém, em relação a esses outros parâmetros, Ana Luiza não encontrou diferenças significativas após a injeção de chumbo, possivelmente porque, nas condições experimentais, a exposição ao metal foi aguda (uma única injeção) e não crônica (contato com doses menores durante um tempo prolongado).

No entanto, as diferenças encontradas na atividade da ALA D e nos níveis de glicose já são suficientes para demonstrar que a tilápia poderia ser utilizada como ferramenta para o monitoramento ambiental do chumbo. “Gaiolas contendo tilápias comerciais poderiam ser instaladas em determinados pontos de um rio, para avaliar a contaminação desse ecossistema pelo chumbo”, exemplifica a orientadora Rita, ressaltando que o uso dessas gaiolas deve ser investigado em estudos futuros. “Utilizar as tilápias comerciais dentro das gaiolas poderia ser uma opção melhor do que simplesmente analisar um peixe diretamente coletado naquele rio”, completa Ana Luiza. “Devido aos hábitos migratórios, as condições do organismo desse peixe poderiam indicar a situação não daquele rio, mas de um outro, do qual ele migrou”. As pesquisadoras calculam que o uso de tilápias para o monitoramento ambiental seria de baixo custo.

Matéria de Fernanda Marques, da Agência Fiocruz de Notícias.

[EcoDebate, 29/04/2009]

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