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Artigo

COP 14: O mundo não agüenta essa pantomima, artigo de Kevin Watkins

Encarregados de produzir um plano para cortar emissões de carbono, os governos produziram muito pouco além de bravatas

[Folha de S.Paulo] AS NEGOCIAÇÕES cruciais sobre mudança climática em Poznan, Polônia, caminharam para lugar nenhum. Encarregados de produzir um plano para cortar emissões de carbono, os governos produziram muito pouco além de bravatas, com ministros reciclando promessas vagas de ação futura. Sem dúvida, eles se deitam à noite recitando uma variação da oração de Santo Agostinho: “Ó Senhor, torna-me casto -mas não ainda, e certamente não em Poznan”.

Infelizmente, este é um momento do tipo “agora ou nunca”. A Conferência de Poznan marcou a metade da trajetória de negociação de uma nova convenção climática das Nações Unidas. Esperava-se que prepararia o terreno para um grande pacto global para enfrentar o maior desafio que a humanidade já viu.

Falando claramente, o desafio em Poznan era estabelecer as coordenadas para evitar uma colisão entre os sistemas de energia que alimentam nossas economias e a biosfera da Terra. Metas ambiciosas devem estar no cerne de qualquer acordo para enfrentar o desafio. Mas também necessitamos de uma nova arquitetura institucional de cooperação entre países ricos e pobres.

Se a tendência no aumento da temperatura continuar, conduzirá a reversões no desenvolvimento humano sem precedentes ainda em nosso tempo de vida, seguidas rapidamente de uma catástrofe ecológica para as gerações futuras. As economias podem se recuperar de uma crise financeira. Mas não há antídoto ou tecla de replay para o aquecimento global.

Em Poznan, os países ricos deveriam ter estabelecido uma intenção séria. Era preciso sinalizar um compromisso obrigatório de reduzir sua pegada de carbono pelo menos em 80% (relativo aos níveis de 1990). Acima de tudo, era e é preciso aproximar as metas de mudança climática e as políticas energéticas.

Os países ricos têm os recursos financeiros e a capacidade tecnológica para fazer uma transição rápida para baixo carbono. Com um aumento do preço da emissão de carbono, por meio de impostos, cotas e normas regulatórias mais duras, podem transmitir um sinal claro para os investidores e estimular a inovação.

As parcerias público-privadas em pesquisa têm um papel-chave no desenvolvimento e na comercialização de novas tecnologias. A captura e o armazenamento de carbono são uma prioridade porque têm o potencial de reduzir as emissões das usinas de energia movidas a carvão, a forma predominante de geração elétrica, a zero. Contudo, nem os EUA nem a UE foram além de investimentos de pequena escala em projetos piloto.

Os países ricos também precisam construir as bases para um novo pacto global com os países em desenvolvimento. Não se trata apenas do fato de esses países abrigarem as populações mais vulneráveis à mudança climática, incluindo 1,6 bilhão de pessoas vivendo com menos de US$ 1 por dia. Eles também respondem por grande parte do aumento projetado de emissões de CO2 até 2030: o crescimento econômico movido a carvão na China e na Índia será responsável por bem mais que a metade do aumento. E o desmatamento em países em desenvolvimento é responsável por cerca de um quinto das emissões.

Em Poznan, os governos tinham a oportunidade de estabelecer três dos pilares para um acordo global. Primeiro, precisamos de um plano de ação para adaptação. Como indicado por Oxfam, para milhões das pessoas mais pobres do mundo, a mudança climática perigosa não é uma ameaça futura: está acontecendo agora.

O Relatório de Desenvolvimento Humano das Nações Unidas estima o custo de combater essa ameaça em US$ 86 bilhões de ajuda adicional, quase um nono do que foi oferecido pelo governo nos EUA para o resgate dos bancos americanos.

Em segundo lugar, os países ricos têm que parar de falar e começar a agir com relação ao desmatamento, um dos caminhos mais custo-efetivos para cortar emissões de gás de efeito estufa.

Em terceiro lugar, o mundo precisa de um Plano Marshall para financiamento de baixo carbono e transferência de tecnologia. Um elemento desse plano deverá ser a expansão de oportunidades de comercialização de emissões para países em desenvolvimento. Mas os países ricos também têm que implementar mecanismos multilaterais mais amplos para sistemas de descarbonização da energia.

O mundo não agüenta o tipo de exibição desorganizada que foi encenada em Poznan. Nos últimos meses, os governos dos países ricos moveram montanhas financeiras para proteger a integridade de seus sistemas bancários. Qual é o preço da integridade ecológica do planeta, do bem-estar das gerações futuras e do compromisso com os pobres do mundo?

KEVIN WATKINS é pesquisador sênior do Programa de Governança Econômica Global da Universidade de Oxford (Inglaterra).

* Artigo originalmente publicado na Folha de S.Paulo, 16/12/2008

[EcoDebate, 17/12/2008]

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