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Aquecimento global vai gerar instabilidade no mundo, dizem EUA

A mudança do clima no mundo terá “amplas implicações para os interesses de segurança nacional dos Estados Unidos” nos próximos 20 anos, afetando a estabilidade de alguns países em desenvolvimento e contribuindo potencialmente para um conflito civil. Esta é uma das conclusões da primeira análise das agências americanas de inteligência sobre o impacto do aquecimento global na questão de segurança trazida a público. Por Siobhan Gorman, The Wall Street Journal, no Valor Econômico, 26/06/2008.

As conclusões do relatório devem jogar combustível no debate político, enquanto discussões sobre mudanças climáticas e energia esquentam a campanha presidencial americana. No ano passado, a autorização do congresso americano para esse relatório de inteligência gerou duro confronto partidário. Membros do Partido Republicano argumentavam que os dados de inteligência não deveriam ser usados num relatório que se baseava em informações públicas.

A disputa partidária sobre o tema existe pelo menos desde o governo de Bill Clinton, do Partido Democrata, quando o então vice-presidente Al Gore levou a Agência Central de Inteligência (CIA), em 1997, a estudar as implicações da degradação ambiental na segurança do país. A iniciativa foi abandonada anos depois por pressão de congressistas republicanos.

De acordo com o que Thomas Fingar, chefe de análise da direção de inteligência nacional, disse ontem ao Congresso americano, uma das conclusões do estudo é que o impacto maior na segurança dos EUA será indireto e resultante “dos efeitos climáticos em outros países e do impacto que possam ter nos interesses americanos”.

Os autores do relatório dizem que os problemas causados por mudanças climáticas, como escassez de água, calor excessivo ou queda exagerada de temperatura, além do aumento de doenças, serão, provavelmente, os de maior impacto, com potencial de deflagrar conflitos por recursos limitados e gerar migrações à medida que o clima se torna mais adverso.

Os analistas concluíram que as mudanças climáticas, por si só, têm pouca chance de levar nações ao colapso. Para eles, o que é provável é que as mudanças climáticas tornem mais agudos problemas já existentes, provocados por pobreza, tensões sociais e instituições políticas fracas. A degradação ambiental poderia contribuir para causar guerras civis ou, em menor escala, conflitos entre países.

As mudanças climáticas têm o potencial de afetar a estabilidade interna “em vários Estados importantes” e o comércio internacional, bem como a economia mundial, segundo Fingar. Para os EUA, os analistas prevêem tempestades mais severas, crescente demanda por energia e uma pressão cada vez maior sobre a infra-estrutura. Os esforços do governo e dos empresários para atenuar esses problemas podem afetar mais os interesses da segurança nacional do que o impacto direto das mudanças climáticas, dizem os analistas.

Segundo eles, provavelmente o impacto das questões ambientais no crescimento econômico global até 2030 será mínimo. Países do Oriente Médio, África subsaariana e das regiões central e sudeste da Ásia podem, contudo, sentir efeitos econômicos desproporcionais porque terão maior dificuldade de lidar com a mudança climática. Nos EUA, haverá custos econômicos de mais desastres naturais, que podem ser compensados por um aumento na produtividade agrícola. Os EUA também terão de se preparar para a maior pressão migratória dos países afetados.

A África subsaariana será a região mais vulnerável, pois enfrenta tensões múltiplas nas frentes ambiental, econômica e política. Lá, a mudança climática deve atingir duramente a produtividade rural, reduzindo-a em até 50% até 2020.

No Oriente Médio, onde os impactos são mais difíceis de prever devido à escassez de dados, o relatório prevê que a disponibilidade de água nos rios Tigre e Eufrates pode ser reduzida à medida que a temperatura suba em um grau Celsius. Na Ásia, a mudança ambiental pode pôr até 50 milhões de pessoas a mais sob risco de fome até 2020. O Ártico deve continuar a se aquecer, dizem analistas, acrescentando que historicamente essas regiões se aqueceram ao dobro do ritmo de todo o globo.

Como agências de inteligência não costumam lidar com questões ambientais, diz Fingar, o relatório usou um método de coleta e análise de dados “fundamentalmente diferente”, apoiado em informações de cientistas de dentro e fora do governo. Uma descoberta importante, diz, é que o nível de entendimento científico sobre mudança climática não é tão específico quanto a informação normalmente necessária para uma análise detalhada de inteligência, especialmente quanto aos impactos regionais da mudança climática.