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Artigo

Carnaval em Chamas, artigo de Norbert Suchanek

[EcoDebate] Normalmente nestes primeiros meses do ano só o Cerrado ou a Amazônia está em chamas. Mas fevereiro de 2011 é diferente. Este ano o Carnaval do Rio de Janeiro está em chamas, um grande fogo destruiu a Cidade do Samba onde as grandes escolas de samba constroem as fantasias de carnaval.

Foi no dia 7, às sete da manhã, da nosso apartamento no Bairro de Santa Teresa eu vi uma nuvem monstruosa, escurecendo o céu. No primeiro momento eu pensei que iria acontecer uma grande tempestade. Mas o meu raciocínio foi errado. A nuvem não foi criada pelas águas do mar e da floresta evaporada pelo calor do verão. A nuvem foi criada com elementos altamente tóxicos: dioxinas, óxidos de metais pesados, ácido clorídico, fuligem e outras substâncias cancerígenas, além de monóxido de carbono e dióxido de carbono.

Este nuvem foi visível de quase todos os bairros do Grande Rio de Janeiro com os seus mais de 11 milhões de habitantes e teve a sua causa nas chamas da Cidade do Samba. Por horas a enorme coluna de fumaça ameaçou a cidade maravilhosa e mudou a rota dos aviões. Os bombeiros chegaram tarde demais e mal preparados na Cidade do Samba em chamas, um complexo perto do porto do Rio que foi inaugurado exatamente há 5 anos antes, em 4 de fevereiro de 2006.

Naquele ano, as 14 escolas de samba do Grupo Especial foram transferidas para este lugar que foi construída com o dinheiro público de R$ 102.632.241, o que significa mais ou menos 40 milhões de Euros! De acordo com a Prefeitura: “A transferência das escolas foi muito comemorada pela comunidade do samba e definida pelos dirigentes das agremiações como uma passagem do `inferno´ para o `paraíso´. De fato, a Cidade do Samba marca o início de uma nova fase do Carnaval do Rio de Janeiro, onde as escolas começam a produzir seus desfiles de forma mais organizada, graças à moderna infraestrutura oferecida dentro e fora dos barracões.”

A realidade, que nós sabemos hoje, é uma outra, uma realidade escandalosa. Não funcionaram ou não existiam “chuveirinhos” e extintores de incêndio no lugar. Já em novembro de 2010, as escolas reclamaram a falta de água nos sprinklers. Mas todo mundo sabe que as fantasias de carnaval são feitas com materiais altamente inflamáveis, como sintéticos à base de petróleo. O jornal Extra, do Grupo Globo, intitulou no dia seguinte do incêndio: “Portas corta-fogo: nota zero; Detector de fumaça: nota zero; Brigada de incêndio: nota zero; Chuveirinho antichama: nota zero”

As chamas do carnaval mostram a realidade do Rio de Janeiro hoje, mostram como os responsáveis, os políticos e os técnicos ainda colocam a saúde do povo e do ambiente em risco. 19 anos depois do grande evento internacional sobre meio ambiente, a UNCED 1992, reconhecido também como Rio 92, nada mudou no Brasil. Ao contrário! Tudo piorou. O desmatamento do Cerrado, da Caatinga, da Restinga, da Mata Atlântica e da Floresta Amazônica continuam e paralelo a isso, a produção e o uso de plásticos e de outros produtos não-sustentáveis e tóxicos aumentaram.

O lixo plástico, os descartáveis, se acumulam em todas as esquinas da cidade. E o Governo Lula junto com o Governo do Rio de Janeiro inauguraram no último ano, com grande orgulho, as obras do novo complexo petroquímico, nas portas da cidade maravilhosa, em Itaboraí. Este lugar é até agora um dos lugares mais férteis da região, onde são produzidos uma grande quantidade dos alimentos, frutas e legumes para as cidades Rio de Janeiro e Niteroi.

Podemos chamar de responsável ou sustentável colocar no meio desta região fértil fábricas petroquímicas?

As chamas de Carnaval revelou também uma outra realidade: Um sistema de segurança civil mau financiada e mal preparada, num momento sensível, quando o Governo do Brasil anunciou mais usinas nucleares, mais minas de Urânio no Norte do Brasil e em frente do Rio de Janeiro a construção do primeiro Submarino Nuclear da America Latina.

Podemos acreditar que os políticos e técnicos que não conseguiram fazer um prédio seguro para a produção de fantasias de carnaval tem a capacidade de construir complexos nucleares altamente seguros? Podemos acreditar que a Defesa Civil que não conseguiu controlar algumas toneladas de sintéticos e outros plásticos tem a capacidade de controlar um acidente nuclear?

Norbert Suchanek, Correspondente e Jornalista de Ciência e Ecologia, é articulista e colaborador do EcoDebate

Postscriptum: Eu não sou contra o carnaval do Rio de Janeiro. Mas realmente: as fantasias de um Carnaval do Século 21 precisam ser feitas com materiais naturais, fibras naturais, materiais não tóxicos e materiais que não precisam de um complexo petroquímico e que são em sua maioria difícil de inflamar, como o algodão orgânico. Isso é uma utopia? Espero que as chamas do Carnaval 2011 sirva de lição aos carnavalescos do Brasil.

EcoDebate, 17/02/2011


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