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Prefeitos evitam cobrança de taxa ambiental por motivações políticas

Para evitar desgaste com empresários, gestores municipais preferem deixar responsabilidade nas mãos do Estado – A perspectiva de grandes obras impulsionadas pela expansão da economia e pelo Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) do governo federal está levando alguns Estados a se movimentar para dar agilidade à cobrança de taxas ambientais e à aplicação dos recursos. Um dos caminhos para isso é transferir aos municípios a responsabilidade pelo licenciamento de projetos que causam impacto no meio ambiente, ao menos os de menor porte. Por Adriana Fernandes e Luciana Nunes Leal, O Estado de S.Paulo, 09/03/2008.

A tarefa, no entanto, não é simples. Há mais de três anos o governo do Espírito Santo lançou um programa para municipalização do licenciamento, o que permitirá aos municípios receber a taxa de compensação ambiental, de no mínimo 0,5% do valor dos empreendimentos. Dos 78 municípios capixabas, só 6 (7,7% do total) assumiram a tarefa. Até o fim deste ano, somente mais 8 deverão aderir.

Para as prefeituras que alegaram falta de estrutura, equipamento e pessoal, o governo ofereceu computador e curso de capacitação. Mas isso não foi suficiente em muitos casos, e a resistência em assumir o licenciamento revelou uma preocupação mais política do que administrativa. “Muitos acham que é um desgaste político assumir a licença ambiental. E muitas vezes os prefeitos têm razão mesmo, o empreendedor faz pressão, reclama, depois não ajuda na campanha”, explica a secretária estadual de Meio Ambiente, Maria da Glória Brito Abaurre.

Resultado: “O governo do Estado acaba licenciando desde um novo porto até um lava-jato ou uma oficina mecânica. Muitas vezes tenho que mandar um funcionário graduado a uma cidade distante para autorizar um posto de gasolina”, conta.

Um dos municípios que ainda não assumiram o licenciamento ambiental, embora tenha recebido os incentivos estaduais, é São Mateus. O secretário de Meio Ambiente do município, Antenor Malverdi Filho, diz que há estudos para assumir em breve a responsabilidade. “A gente não tinha corpo técnico nem conhecimento. Se apenas seis municípios assumiram até agora, é porque não é fácil”, diz. Antenor reconhece o peso da questão política na decisão de a prefeitura assumir as licenças, a cobrança de taxas e a fiscalização dos empreendimentos. “Infelizmente, tem a questão política. Aqui, estamos muito próximos do empreendedor, tem que ter paciência e jogo de cintura. Ele pressiona o prefeito, que cobra do secretário. Com a municipalização, fica mais fácil o secretário de Meio Ambiente perder o cargo.”

No Rio, o governo estadual fechou convênio com o Fundo Brasileiro para a Biodiversidade (Funbio), no valor de R$ 1 milhão, para reestruturar o Fundo Estadual de Conservação Ambiental e Desenvolvimento Urbano (Fecam) e para criar um fundo específico de compensação ambiental, que receberá os recursos da cobrança.

“A simples regulamentação traz uma enorme segurança jurídica, já que a compensação tem impacto no custo do investimento. Ao se explicitar valor e uso, há uma sinalização favorável ao investidor”, diz o secretário de Fazenda do Rio, Joaquim Levy.

Levantamento da Federação das Indústrias do Rio de Janeiro (Firjan) aponta que, até 2010, o Estado terá R$ 107 bilhões em investimentos. Como grande parte refere-se a obras de infra-estrutura, indústria de transformação e turismo, no mínimo R$ 500 milhões em compensação financeira vão reforçar o novo fundo. No Estado, dos 92 municípios, 21 (23%) assumiram o licenciamento.

FRAGILIDADE

Segundo o coordenador da unidade de Instrumentos Econômicos do Funbio, Manoel Serrão, os recursos cobrados com base na Lei 9.985 chegam “pingados”. Para piorar, o que entra no caixa não é destinado exclusivamente à demarcação e à preservação de unidades de conservação.

O superintendente de conservação da organização não-governamental WWF, Cláudio Maretti, reforça as críticas. Para ele, a taxa de compensação ambiental deve ser cobrada exclusivamente em dinheiro e os recursos não podem ser usados para outros fins, como pagamento de salários e manutenção dos órgãos ambientais.

“Para o desenvolvimento sustentável do País, a unidade de conservação tem que ser tratada como se fosse uma escola, um hospital”, diz Moretti.

A situação ideal – recursos destinados exclusivamente à preservação – esbarra na realidade financeira de Estados e municípios. Em Goiás, 30% da receita do fundo ambiental é usada na manutenção da Secretaria de Meio Ambiente. Em Belo Horizonte, os recursos servem à implementação de projetos, mas também ao pagamento de salários e outras despesas. “É um defeito que o nosso fundo tem. Seria melhor que tivesse autonomia, mas depende de tramitação na Câmara Municipal e não é simples”, diz a titular da Secretaria Adjunta de Meio Ambiente, Flávia Moura Parreira do Amaral.

TROCAS

O pagamento da taxa de compensação ambiental por meio de bens e serviços, em vez de dinheiro, é prática comum nos municípios. Em Goiânia, o presidente da Agência Municipal de Meio Ambiente (Amma), Clarismino Luiz Pereira Júnior, também presidente da Associação Nacional de Órgãos Municipais de Meio Ambiente (Anamma), conta que a agência já recebeu veículos e equipamentos como pagamento pela licença para empreendimentos de grande impacto ambiental. “Tenho vans de educação ambiental, o ônibus Ecomóvel, tratores para plantio de mudas. São opções para receber a compensação.”

Sem contar os bens e serviços, Goiânia arrecada entre R$ 250 mil e R$ 300 mil mensais para o fundo ambiental. “Cada centavo recolhido para o fundo é rigorosamente aplicado em questões ambientais”, diz Clarismino.