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Artigo

Cai a taxa geral de fecundidade nos EUA, especialmente entre as adolescentes

 

Artigo de José Eustáquio Diniz Alves

A Taxa Geral de Fecundidade (TGF) atingiu o nível mais baixo da história dos Estados Unidos da América (EUA) em 2023 e 2024.

A TGF mede o número de nascidos vivos por 1.000 mulheres em idade fértil (15 a 49 anos) em um determinado período.

A fórmula para calculá-la é expressa pela equação abaixo, onde N = número de nascidos vivos em um determinado ano; e M = população feminina de 15 a 44- anos no mesmo período.

fórmula da taxa geral de fecundidade

O gráfico abaixo mostra que a TGF estava acima de 120 nascimentos por mil mulheres no início do século XX, caiu para menos de 80 por mil na grande depressão dos anos 1930, houve um baby boom após a Segunda Guerra, voltou a cair no final da década de 1960 e apresentou uma nova queda após a crise financeira de 2008 e 2009. Após a pandemia da covid-19 a TGF dos EUA tem ficado abaixo de 60 nascimentos por mil mulheres em idade fértil.

taxa geral de fecundidade nos EUA

O gráfico abaixo mostra as taxas específicas de fecundidade. As taxas específicas de 10-14 anos e de 45 anos e + são muito baixas e próximas de zero. As taxas do grupo 15-19 anos já foram mais altas, mas entre o primeiro quadrimestre de 2022 e o quarto trimestre de 2024 a taxa caiu de 14,3 por mil para 12,7 por mil. O grupo 30-34 anos apresenta a maior fecundidade, com 98,1 nascimentos por mil mulheres neste grupo etário no início de 2022 e de 95,4 por mil no final de 2024. Pela primeira vez na história, a taxa específica de fecundidade do grupo 40-44 anos (12,8 filhos por mil mulheres) superou a taxa das adolescentes 15-19 anos que ficou em 12,7 filhos por mil mulheres.

250428c gráfico da taxa específica de fecundidade nos eua

https://www.cdc.gov/nchs/nvss/vsrr/natality-dashboard.htm#

O gráfico abaixo mostra que o número total de nascimentos estava em torno de 3,6 milhões de bebês em meados do século passado e voltou a ficar neste patamar na última década, sendo que em alguns momentos chegou perto de 4,5 milhões e em outros momentos abaixo de 3,5 milhões de nascimentos. Mas o número de nascimentos entre as adolescentes (15-19 anos) chegou ao pico de mais de 600 mil nascimentos ocorreu na década de 1960 e caiu nas décadas seguintes e está atualmente em torno de 100 mil nascimentos (um montante 6 vezes menor).

Nascimento totais e nascimentos de mulheres de 15-19 anos, EUA: 1950-2030

gráfico dos nascimento totais e nascimentos de mulheres nos EUA

Fonte: World Population Prospects 2024 https://population.un.org/wpp/

Sem dúvida, a taxa de natalidade nos Estados Unidos tem apresentado um declínio significativo nas últimas décadas, especialmente entre adolescentes. Esse fenômeno pode ser explicado por uma combinação de fatores sociais, econômicos e de acesso a métodos contraceptivos. Os principais fatores explicativos são:

  • Acesso ampliado a contraceptivos: Programas como o Affordable Care Act e iniciativas estaduais facilitaram o acesso a métodos contraceptivos de longa duração, como DIUs e implantes.

  • Educação sexual mais eficaz: Escolas e campanhas de conscientização enfatizaram métodos de prevenção de gravidez e DSTs, levando a um maior uso de contracepção.

  • Mudança nas aspirações das jovens: O foco na educação e na carreira tem levado muitas adolescentes a adiarem a maternidade.

  • Redução da atividade sexual: Estudos indicam que os adolescentes, em geral, estão iniciando a vida sexual mais tarde do que gerações anteriores.

A queda na natalidade adolescente tem efeitos positivos, como: 1) Menor evasão escolar entre jovens mães; 2) Redução da pobreza infantil, já que gestações na adolescência estão ligadas a dificuldades socioeconômicas e 3) Impacto na força de trabalho e economia, pois a transição para a maternidade mais tardia pode significar maior qualificação profissional.

Evidentemente, a queda da fecundidade acelera o processo de envelhecimento populacional e pode levar ao decrescimento demográfico do país.

A dinâmica demográfica dos EUA vai depender das políticas adotadas pelo governo para lidar com o fluxo migratório. Se houver redução significativa da imigração, a população total dos EUA deve começar a decrescer já na próxima década.

O decrescimento populacional nos EUA pode trazer desafios, mas também apresenta algumas vantagens em diferentes áreas. Entre os principais benefícios estão:

1. Menor Pressão sobre Recursos Naturais

Com menos pessoas, há menor consumo de água, energia e alimentos, reduzindo a exploração de recursos naturais e ajudando na preservação ambiental. Isso pode ser positivo para combater mudanças climáticas e reduzir a poluição.

2. Redução da Superlotação Urbana

Cidades como Nova York, Los Angeles e Miami sofrem com trânsito intenso, altos custos de moradia e pressão sobre serviços públicos. Uma população menor pode aliviar esses problemas, tornando as cidades mais habitáveis.

3. Menor Desigualdade e Melhor Qualidade de Vida

Com menos pessoas competindo por empregos, moradia e serviços sociais, pode haver uma redução da desigualdade econômica e um aumento na qualidade de vida da população, especialmente em áreas com alta densidade populacional.

4. Possível Aumento dos Salários

Se a força de trabalho diminuir, empresas podem precisar oferecer salários mais altos e melhores benefícios para atrair trabalhadores, o que poderia ajudar a reduzir a precarização do trabalho em setores com salários historicamente baixos.

5. Maior Foco na Inovação e Automação

Com menos trabalhadores disponíveis, empresas tendem a investir mais em tecnologia, automação e inteligência artificial para manter a produtividade. Isso pode impulsionar avanços tecnológicos e tornar setores mais eficientes.

6. Sustentabilidade de Longo Prazo

Países com crescimento populacional descontrolado muitas vezes enfrentam desafios ambientais e urbanos. Um crescimento mais lento ou negativo pode ajudar os EUA a planejar melhor suas infraestruturas e políticas públicas para um futuro mais sustentável.

O grande desafio será tirar proveito das oportunidades geradas pela queda das taxas de fecundidade, a transformação da estrutura etária e o peso maior das gerações prateadas. O 3º bônus demográfico é a maneira de garantir o aumento do bem-estar social, respeitando o bem-estar ambiental.

Mas os setores conservadores e a extrema-direita nos EUA, apesar de serem contra a imigração, têm como pauta aumentar o nível da fecundidade no país. Assessores de Donald Trump estudam ideias para aumentar a taxa de natalidade, desde bônus por bebê até planejamento de fertilidade. A Casa Branca tem ouvido um coro de vozes nas últimas semanas para persuadir os americanos a se casar e ter mais filhos, um sinal precoce de que o governo Trump adotará uma nova agenda cultural impulsionada por muitos de seus aliados da direita para reverter o declínio das taxas de natalidade e promover valores familiares conservadores.

Uma proposta compartilhada com assessores reservaria 30% das bolsas de estudo do programa Fulbright, a prestigiosa bolsa internacional apoiada pelo governo, para candidatos casados ​​ou com filhos. Outra daria um “bônus de bebê” em dinheiro de US$ 5.000 a cada mãe americana após o parto.

Resta saber se estas posições pronatalistas encontrarão respaldo na população, que tem optado por famílias menores e até pela fecundidade zero (childless or childfree). Reverter as opções reprodutivas para fazer a “America great again” será uma tarefa muito difícil, especialmente em um quadro de recessão com inflação (estagflação) provocada pelo tarifaço tresloucado do governo Trump.

José Eustáquio Diniz Alves
Doutor em demografia, link do CV Lattes:
http://lattes.cnpq.br/2003298427606382

Referências:

ALVES, JED. A população dos Estados Unidos deve começar a decrescer em 2081, Ecodebate, 24/11/2023

https://www.ecodebate.com.br/2023/11/24/a-populacao-dos-estados-unidos-deve-comecar-a-decrescer-em-2081/

ALVES, JED. Os EUA tiveram a menor taxa de crescimento demográfico de todos os tempos, Ecodebate, 16/02/2022 https://www.ecodebate.com.br/2022/02/16/os-eua-tiveram-a-menor-taxa-de-crescimento-demografico-de-todos-os-tempos/

ALVES, JED. População dos Estados Unidos de 1950 a 2100, Ecodebate, 17/08/2022

https://www.ecodebate.com.br/2022/08/17/populacao-dos-estados-unidos-de-1950-a-2100/

ALVES, JED. O crescimento da população dos EUA cada vez mais dependente da imigração, Ecodebate, 22/07/2024 https://www.ecodebate.com.br/2024/07/22/o-crescimento-da-populacao-dos-eua-cada-vez-mais-dependente-da-imigracao/

 

 

in EcoDebate, ISSN 2446-9394

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