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Artigo

As transições demográfica e energética reduziram as emissões de carbono na China

 

Já está claro que a China está conseguindo reverter as tendências passadas das emissões de gases de efeito estufa

Artigo de José Eustáquio Diniz Alves

A China era o país mais populoso do mundo em 1950, mas tinha uma economia pequena, com uma renda per capita reduzida e, consequentemente, tinha baixa emissão de carbono. Contudo, a população cresceu muito na segunda metade do século XX e a economia apresentou as maiores taxas de crescimento da história, após as reformas econômicas e sociais de Deng Xiaoping, que tiveram início em 1979.

A população da China era de 544 milhões de habitantes em 1950, alcançou 1 bilhão em 1981, atingiu o pico populacional em 2021, com 1,426 bilhão de habitantes, começou a decrescer em 2022 e perdeu o posto de nação mais populosa do mundo em 2023, quando foi superada pela Índia. A população em idade ativa (15-59 anos) já está diminuindo desde 2012.

As emissões de dióxido de carbono da China eram de 79 milhões de toneladas em 1950, passaram para 1 bilhão de toneladas em 1973, deram um salto para 10 bilhões de toneladas em 2017 e ultrapassaram 12 bilhões de toneladas em 2024. Este valor representa mais de o dobro das emissões conjuntas dos EUA e da União Europeia.

Mas, como mostra o gráfico abaixo, a China atingiu o pico das emissões de CO2 em 2024 e, pela primeira vez em tempos de crescimento econômico, apresentou redução das emissões, em função do crescimento da oferta das energias renováveis superando a demanda por carvão.

pela primeira vez caem as emissões de carbono da china

Em entrevista para o Yale Environment 360, o analista-chefe do Centro de pesquisa em energia e ar limpo da Finlândia, Lauri Myllyvirta, disse que a transição para energia limpa, pela primeira vez, está impulsionando uma queda nas emissões de carbono e aumentando a perspectiva de que a China finalmente atinja o “pico de CO2”.

Segundo Myllyvirta, o que está muito claro é que, nos últimos dois anos, pela primeira vez, o crescimento na geração de energia limpa foi grande o suficiente para cobrir todo o crescimento da demanda por eletricidade e mais um pouco. E isso mesmo com a demanda por eletricidade crescendo acima do normal histórico. As emissões do setor elétrico vêm caindo há 15 meses. E isso por si só é um desenvolvimento extremamente significativo. A grande questão agora é se o crescimento da energia limpa continuará nessas taxas.

No passado, a China foi retardatária nas negociações internacionais sobre o clima e chegou a bloquear um esforço para eliminar gradualmente o carvão. Mas agora que emergiu como o maior produtor de energia limpa, passou a ter um forte incentivo para pressionar outros países a adotar metas climáticas mais ambiciosas.

Sem dúvida, o domínio chinês nas indústrias de energia limpa está criando as condições para uma queda no uso de combustíveis fósseis atual e nos próximos anos, de acordo com um relatório da EMBER, grupo de pesquisa focado nas perspectivas das tecnologias de energia limpa, como mostra o gráfico abaixo.

o rápido aumento da energia solar e eólica na China

Segundo a EMBER, a China é o maior investidor em energia limpa do mundo, gastando US$ 625 bilhões em 2024 – 31% do total global de US$ 2,033 trilhões. O volume de armazenamento de baterias instalado triplicou nos três anos até 2024. O investimento em redes atingiu um recorde histórico em 2024, de 608 bilhões de RMB (US$ 85 bilhões), um aumento de 25% em relação aos 486 bilhões de RMB (US$ 68 bilhões) em 2019.

Além da eletricidade, a transição energético está remodelando os setores de uso final. A eletricidade é, sem sombra de dúvidas, a maior fonte de energia em edifícios e, em 2023, ultrapassou o carvão para se tornar a maior fonte de energia para a indústria. Os combustíveis derivados do petróleo ainda dominam o transporte, mas a frota de veículos elétricos da China, em rápida expansão, está ganhando terreno progressivamente. A participação da eletricidade na demanda final de energia em toda a economia continua crescendo e atingiu 32% em 2023, ultrapassando o ritmo de muitas economias maduras.

Ainda segundo a EMBER, a China embarcou nessa transição por diversos motivos. Entrevistas com especialistas conduzidas para este relatório revelam que, na China, há uma percepção de que o antigo paradigma de desenvolvimento centrado em combustíveis fósseis já esgotou suas possibilidades e não é adequado às realidades do século XXI. O objetivo do governo de estabelecer uma “civilização ecológica”, que simultaneamente cumpra metas econômicas, sociais e ambientais, é a resposta, consagrada à Constituição desde 2018.

A transição para a energia limpa está restringindo a dependência da China de combustíveis fósseis importados, reduzindo os custos de energia, estimulando o crescimento e o emprego e criando mercados de exportação.

Em 2024, o investimento e a produção em energia limpa contribuíram com 13,6 trilhões de RMB (US$ 1,9 trilhão) para a economia nacional – uma soma equivalente a cerca de um décimo do PIB da China ou do PIB total da Austrália – e o setor está crescendo três vezes mais rápido do que a economia chinesa como um todo.

A intensidade da adesão das empresas se reflete em pesquisa, desenvolvimento e inovação: as empresas chinesas agora respondem por cerca de 75% dos pedidos de patentes globais em tecnologia de energia limpa, ante apenas 5% em 2000. Esses investimentos no futuro da energia limpa estão gerando reduções drásticas de custos em todo o mundo em tecnologias-chave, como turbinas eólicas, painéis solares, baterias de armazenamento e veículos elétricos.

Os benefícios são, cada vez, mais sentidos nos mercados emergentes, muitos dos quais estão ultrapassando os países da OCDE em participação na geração eólica e solar e em eletrificação. Em toda a África, as importações de painéis solares da China aumentaram 60% nos últimos 12 meses e 20 países africanos importaram uma quantidade recorde nesse período.

De fato, as tecnologias limpas são uma parte fundamental da visão de uma China modernizada. Mas há divergências sobre o ritmo da mudança da matriz energética e como gerenciar a eventual redução e eliminação gradual das indústrias fósseis, usinas siderúrgicas a carvão e assim por diante. Mas não há nada parecido com a polarização nos EUA, onde existe essa ideia regressiva de trazer de volta tecnologia velha, ultrapassada e suja.

Evidentemente, a China precisa frear a construção de usinas a carvão e começar a fechar as usinas a carvão mais antigas. Essa é a escolha que os formuladores de políticas da China terão que fazer nos próximos dois anos, para cumprir as metas até 2030.

Entre os principais compromissos da China em relação às Contribuições Nacionalmente Determinadas (NDC), do Acordo de Paris, estão: 1) Atingir o pico das emissões de CO₂ antes de 2030 e 2) Alcançar a neutralidade de carbono antes de 2060. O primeiro compromisso pode ser alcançado antecipadamente. O segundo compromisso vai exigir muito mais esforço.

De qualquer forma, já está claro que a China está conseguindo reverter as tendências passadas das emissões de gases de efeito estufa. Neste esforço, a transição demográfica e a transição energética são dois vetores essenciais para que a China reduza suas emissões de carbono e diminua o enorme déficit ambiental. O exemplo da China pode iluminar a experiência de outros países.

José Eustáquio Diniz Alves
Doutor em demografia, link do CV Lattes:
http://lattes.cnpq.br/2003298427606382

Referências:

ALVES, JED. Colapso demográfico da China ou oportunidade para a prosperidade social e ambiental?, Ecodebate, 25/01/2023

https://www.ecodebate.com.br/2023/01/25/colapso-demografico-da-china-ou-oportunidade-para-a-prosperidade-social-e-ambiental/

Jeremy DEATON. In the Transition to Renewable Energy, China Is at a Crossroads, 360 Yale, 19/08/2025

https://e360.yale.edu/features/lauri-myllyvirta-interview

YANG, Muyi et al. China Energy Transition Review 2025, EMBER, 9 Sep 2025

https://ember-energy.org/app/uploads/2025/09/China-Energy-Transition-Review-2025.pdf

 

Citação
EcoDebate, . (2025). As transições demográfica e energética reduziram as emissões de carbono na China. EcoDebate. https://www.ecodebate.com.br/2025/09/17/as-transicoes-demografica-e-energetica-reduziram-as-emissoes-de-carbono-na-china/ (Acessado em setembro 17, 2025 at 02:24)

 
in EcoDebate, ISSN 2446-9394
 

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