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É possível reduzir emissões e a desigualdade social ao mesmo tempo?

 

 

250521 reduzir emissões e a desigualdade social

 

Pesquisa projeta cenários energéticos sustentáveis focados no acesso universal à moradia, transporte, alimentação e saúde com baixa emissão de carbono

Estudo internacional propõe solução para combater simultaneamente a desigualdade social e a crise climática, priorizando as necessidades humanas básicas

 

Como oferecer uma vida digna para toda a população mundial sem piorar a crise climática? Essa pergunta está no centro de um novo estudo publicado por uma equipe internacional de pesquisadores na revista científica Environmental Research Letters.

O artigo apresenta um modelo inovador chamado DESIRE (Decent LIving Energy Scenarios), que mostra ser possível garantir acesso universal a condições básicas de vida – como moradia, alimentação, educação e transporte – ao mesmo tempo em que se reduz drasticamente as emissões de gases de efeito estufa.

O modelo DESIRE propõe uma mudança de perspectiva: em vez de projetar o futuro com base no crescimento econômico, como fazem os atuais cenários globais de energia e emissões, o foco está nas necessidades humanas fundamentais.

Os autores defendem que o objetivo das políticas climáticas deve ser garantir um “padrão de vida decente” para todas as pessoas, respeitando os limites ambientais do planeta.

O que é uma vida decente?

Segundo o estudo, ter uma vida decente significa ter acesso a:

  • Moradia adequada com acesso à energia elétrica e aquecimento/refresco;
  • Alimentação nutritiva e suficiente;
  • Água potável e saneamento;
  • Serviços de saúde e educação;
  • Transporte digno e acesso à informação.

Para cada uma dessas áreas, os pesquisadores definiram limites mínimos e calcularam o que seria necessário, em termos de energia e infraestrutura, para garantir esses padrões em diferentes regiões do mundo.

Reduzir desigualdades para salvar o clima

Os resultados do modelo DESIRE mostram que garantir uma vida digna para todos é tecnicamente possível e, surpreendentemente, exige menos energia do que os padrões de consumo atuais nas nações mais ricas. Na verdade, grande parte do problema climático está concentrada nos excessos de consumo dos países desenvolvidos, não na falta de acesso dos mais pobres.

Por exemplo, o modelo revela que é possível fornecer moradias confortáveis e eficientes energeticamente para todos, utilizando muito menos energia do que a média atual nos Estados Unidos ou Europa.

O mesmo vale para transporte: um sistema de transporte público bem planejado pode oferecer mobilidade digna com uma pegada de carbono muito menor que a dependência de carros individuais.

Um alerta para os cenários tradicionais

Os autores do estudo criticam os cenários energéticos mais usados hoje por governos e empresas – como os elaborados pela Agência Internacional de Energia (IEA) – por partirem do pressuposto de que o crescimento econômico é inevitável e necessário. Isso leva a projeções que exigem um uso cada vez maior de energia, o que dificulta o cumprimento das metas climáticas do Acordo de Paris.

O DESIRE propõe uma alternativa baseada na equidade global, focando na redistribuição do acesso aos recursos e na satisfação das necessidades humanas com o mínimo de impacto ambiental possível. Isso pode significar, por exemplo, reduzir o consumo excessivo de uma minoria para que a maioria possa viver com dignidade.

O desafio político e cultural

Embora os números mostrem que o modelo é viável do ponto de vista técnico e ambiental, os autores reconhecem que colocá-lo em prática depende de vontade política e mudanças culturais profundas.

Enfrentar o desperdício, o consumismo e a desigualdade requer transformações estruturais nas economias e sociedades, especialmente nos países mais ricos.

Mas o estudo também traz uma mensagem positiva: não é necessário escolher entre justiça social e proteção ambiental. Com planejamento e compromisso, é possível caminhar em direção a um futuro mais justo, seguro e sustentável para todos.

Síntese

O modelo DESIRE surge como uma poderosa ferramenta para repensar as políticas climáticas e energéticas do mundo. Ao colocar a dignidade humana no centro do debate, ele mostra que enfrentar a pobreza e as mudanças climáticas pode – e deve – ser parte de um mesmo esforço global.

Referência:

Kikstra, J.S., Daioglou, V., Min, J., Sferra, F., Soergel, B., Kriegler, E., Lee, H., Mastrucci, A., Pachauri, S., Rao, N., Rauner, S., van Vuuren, D., Riahi, K., van Ruijven, B., Rogelj, J. (2025). Closing decent living gaps in energy and emissions scenarios: introducing DESIRE. Environmental Research Letters DOI: https://doi.org/10.1088/1748-9326/adc3ad

Referências adicionais:

Crise climática: Impacto econômico, mortalidade e desigualdade social

Ricos impulsionam crise climática: 10% mais ricos causaram dois terços do aquecimento global desde 1990

Crise climática aumenta a migração ambiental

Crise climática global pode provocar retração econômica e grande mortalidade

 

in EcoDebate, ISSN 2446-9394

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