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Artigo

O impacto diferenciado da população sobre o meio ambiente, artigo de José Eustáquio Diniz Alves

[EcoDebate] O mundo está chegando a 7 bilhões de habitantes, em 2011, e o consumo humano tem um impacto cada vez maior sobre o meio ambiente e a biodiversidade. Mas este impacto não é o mesmo para cada ser humano, nem em cada momento do tempo, nem ao longo da história.

As populações dos países ricos impactam de maneira desproporcional os recursos naturais. Considerando o tamanho do Produto Interno Bruto pela metodologia do poder de paridade de compra (PIB ppp), como proxy do impacto ambiental, podemos constatar que, no ano 2000, a população dos Estados Unidos de 282 milhões de habitantes, representava 4,6% da população mundial, mas consumia 24% da produção econômica internacional, enquanto a população da Índia de 1,054 bilhão de habitantes, no mesmo ano, representava 17,2% da população do Planeta e consumia 3,6% do PIB mundial.

No ano 2000, a população dos países que fazem parte do G-7 (EUA, Japão, Alemanha, Reino Unido, França, Itália e Canadá) era de 695 milhões, representando 11,4% da população mundial, e consumiam 50% do PIB mundial. Portanto, o resto do mundo, com 88,6% da população mundial, consumia os outros 50% dos bens e serviços do mundo.

Olhando estes dados, a conclusão óbvia é de que para diminuir o impacto ambiental no mundo é preciso, antes de tudo, reduzir o consumo das parcelas ricas da população mundial. Esta é uma verdade inconstestável. Um americano médio, no ano 2000, consumia 25 vezes mais do que um indiano médio.

Daí algumas pessoas concluírem (corretamente) que o crescimento da população da Índia tinha um impacto menor do que o crescimento do consumo dos EUA, naquele momento. Porém, alguns estudiosos concluem (erroneamente) que o crescimento populacional dos países pobres tem pouco ou nenhum impacto sobre o meio ambiente e o aquecimento global. Pior, deixam de considerar as relações entre população e meio ambiente em suas análises e nas sugestões de políticas públicas.

Este erro se torna mais grave quando se observa que a dinâmica demográfica e econômica mundial se alterou recentemente. Na segunda metade do século XX, os países que apresentaram maior dinamismo econômico foram as economias avançadas (de menor crescimento populacional), mas no século XXI as economia emergentes (e mais populosas) passaram a liderar o crescimento econômico e do consumo. Por exemplo, a participação dos países do G-7 no PIB mundial, em 2010 já tinha caído para 40% e o Fundo Monetário Internacional (FMI) prevê que em 2014 os demais países do G-20 terão uma maior participação no PIB mundial. Isto é, o G-7 será minoria econômica no G-20.

Se a economia mundial crescer, em média, em torno de 3,5% ao ano nas próximas décadas, o PIB mundial, em preços constantes, vai passar de 70 trilhões de dólares em 2009 para 280 trilhões de dólares em 2050. A renda per capita média anual passaria de cerca de 10 mil dólares para cerca de 30 mil dólares em 2050. O impacto ambiental deste aumento do poder de consumo será extremamente elevado se nada for feito para mudar os padrões culturais e o padrão tecnológico dos habitantes terrestres. E um detalhe que não pode ser desconsiderado é que o maior crescimento econômico vai acontecer nas economias emergentes e mais populosas.

Estudo da Price waterhouseCoopers (PwC, 2011) mostra que em 2050 a China (com 1,4 bilhão de habitantes) será a maior economia do Planeta com um PIB (ppp) de US$ 60 trilhões. O impacto ambiental da China já é maior do que o impacto ambiental dos Estados Unidos. A Índia (com 1,6 bilhão de habitantes) será a segunda economia com PIB de US$ 43 trilhões e os EUA (com 400 milhões de habitantes) será a terceira economia com PIB de US$ 38 trilhões. Portanto, na metade do século XXI, cada americano médio deverá estar consumindo 3,6 vezes o que o indiano médio estará consumindo (ao invés da relação de 25 vezes que existia no ano 2000).

Utilizando os dados e as projeções do estudo da PwC, pode-se constar que os países do G-7 (EUA, Japão, Alemanha, Reino Unido, França, Itália e Canadá), entre 2009 e 2050, terão a população aumentada de 745 milhões para 818 milhões, mas terão o PIB aumentado de US$ 29 trilhões para US$ 69 trilhões (quase o PIB mundial de 2009). Já os sete maiores países emergentes, o E-7 (China, Índia, Rússia, Brasil, México, Turquia e Indonésia), terão uma população aumentada de 3,3 bilhões, em 2009, para 3,9 bilhões de habitantes em 2050, mas terão o PIB aumentado de US$ 21 trilhões para US$ 138 trilhões, no mesmo período. Ou seja, o E-7 terá um consumo de bens e serviços duas vezes maior, em 2050, do que todo o PIB mundial em 2009. Já os demais países do mundo (sem contar os 14 países do G-7 e do E-7) apresentarão o maior crescimento demográfico, passando de uma população de 2,8 bilhões, em 2009, para 4,5 bilhões em 2050 e um PIB que passará de US$ 20 trilhões para US$ 72 trilhões.

Os dados da Organização Global Footprint Network mostram que as atividades econômicas dos seres humanos já estão consumindo, atualmente, cerca 50% mais do que a capacidade regenerativa do Planeta. Como ficarão estas contas em 2050, quando a economia mundial for, segundo as previsões, quatro vezes maior? Como os países do E-7 vão lidar com seus 3,9 bilhões de habitantes e um PIB estimado de US$ 138 trilhões?

Em 2012, a cidade do Rio de Janeiro sedirá a Conferência das Nações Unidas sobre Desenvolvimento Sustentável, denominada Rio + 20. Será uma grande oportunidade para se discutir o atual padrão de desenvolvimento, sem deixar de considerar as questões populacionais. O consumo conspícuo, a poluição e a degradação ambiental devem ser o foco principal de preocupação da Rio + 20. O mundo precisa caminhar para o decrescimento da economia de alto carbono e o crescimento da sociedade do conhecimento e de baixo carbono.

No entanto, sem criminalizar a população, as questões demográficas também merecem maior atenção por parte das autoridades governamentais, ONGs e do meio acadêmico. A Rio + 20 precisa incorporar e atualizar as conquistas teóricas e práticas do Plano de Ação da Conferência Internacional de População e Desenvolvimento (CIPD), que ocorreu na cidade do Cairo em 1994. Ou seja, a relação entre população, desenvolvimento e meio ambiente deve ser tratada de forma integral e holística buscando o bem-estar dos seres humanos, sem desrespeitar os direitos da biodiversidade e do planeta Terra.

José Eustáquio Diniz Alves, articulista do EcoDebate, é Doutor em demografia e professor titular do mestrado em Estudos Populacionais e Pesquisas Sociais da Escola Nacional de Ciências Estatísticas – ENCE/IBGE. As opiniões deste artigo são do autor e não refletem necessariamente aquelas da instituição. E-mail: jed_alves{at}yahoo.com.br

EcoDebate, 14/06/2011

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